sábado, 17 de setembro de 2011

Licença paternidade: 120 dias para o pai adotante único - parte I

As relações familiares estão se modificando dentro de nossa sociedade. Uma das espécies de entidade familiar que vem crescendo bastante na sociedade moderna é a família monoparental. Regulamentada no artigo 226, § 4º da Constituição Federal, tal núcleo é formado por apenas um dos pais e seus descendentes.

Algumas dúvidas surgem acerca de direitos que foram concebidos tendo apenas como modelo a família criada por um homem ao lado da mulher e os seus filhos. Licença paternidade é um exemplo disso. Sem qualquer diferenciação em relação à realidade vivida pelo pai, tal direito foi relegado ao esquecimento por parte do Estado. Tal tratamento deve acabar. Caso clássico de desrespeito acontece quando um homem solteiro adota uma criança.

A Constituição Federal garante o direito à licença maternidade e licença paternidade em seu artigo 7º, XVIII e XIX, mas a Carta Magna não estabelece o período de gozo da licença deferida ao pai. Apenas no artigo 10 dos Atos das Disposições Constitucionais Transitórias fica – provisoriamente - estabelecido o prazo de 05 (cinco) dias da aludida licença.
Art. 10. Até que seja promulgada a lei complementar a que se refere o art. 7º, I, da Constituição:
(...)
§ 1º - Até que a lei venha a disciplinar o disposto no art. 7º, XIX, da Constituição, o prazo da licença-paternidade a que se refere o inciso é de cinco dias.
Essa é a única normatização acerca do prazo da Licença Paternidade, no entanto, não se relaciona com o caso em tela, pois aqui não estamos a tratar da licença paternidade comum, mas sim de Licença Paternidade destinado a pai solteiro. Para chegarmos ao deslinde da questão e à confirmação de que se trata de modalidade distinta de Licença Paternidade será necessária uma averiguação acerca da natureza jurídica de tal benefício.

A Licença Paternidade é um direito que sempre fora colocado em patamar secundário de importância. Dentro da cultura machista que domina nossa sociedade, o papel de educar os filhos sempre coube à mulher. O papel destinado ao homem dentro de uma sociedade fundada num modelo patriarcal sempre fora o de mantenedor da casa. Essa manutenção estaria ligada apenas aos aspectos financeiros. O homem poderia ficar alheio às exigências do cotidiano de afetividade e educação dos filhos. Tais tarefas pertenciam apenas à mulher.
(..)

Embora tenha sido um direito conquistado pelas mulheres, a Licença maternidade não é um direito destinado apenas às mulheres. O lapso temporal indicado enquanto afastamento das atividades profissionais é também um direito da criança. Aliás, está plenamente correto afirmar que a licença maternidade tem como escopo principal a proteção da criança. Ao contrário do que se imagina, o período de licença maternidade não é apenas destinado à recuperação da mãe.

Tal definição tem origem na doutrina da proteção integral definida pela Constituição Federal em seu artigo 227:
Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.
O que se deve deixar bem frisado é que se trata de um DEVER do Estado proporcionar todas as garantias fundamentais ao desenvolvimento humanitário da criança, à formação plena de um ser humano hígido. Esse aparato principiológico de direitos encontra amparo imperativo no capítulo dos Direitos Sociais insertos na Constituição Federal.
Assim reza o art. 6º, CF/88:
Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, assistência aos desamparados, na forma desta Constituição.
E nessa toada, levando-se em consideração o consagrado princípio da isonomia (art. 5º, caput, CF), não se deve jamais restringir a proteção somente à "maternidade".

Constituindo-se, hodiernamente, na concepção mais progressista e humanística da matéria, tanto maternidade quanto paternidade na adoção, inserindo-se também a família monoparental. Todas essas hipóteses enquadram-se no instituto da entidade familiar, o núcleo social e afetivo onde se exerce o poder familiar.

E é exatamente na não distinção dos iguais, no tratamento paritário dos desiguais que se debruça tal pleito administrativo e sua razão meritória jurídica. O princípio da isonomia ínsito no art. 5º, caput, e inciso I, da Constituição Federal, no patamar de cláusula pétrea e direito fundamental, assim delimitado:
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
I – homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição;
O direito em destaque é mais uma das hipóteses de consolidação da norma constitucional. O período destinado à mulher trabalhadora é o momento de interação física e psicológica da mãe com o seu filho. É instante destinado ao acompanhamento da saúde da criança, do seu desenvolvimento e de sua personalidade iniciante. É durante esse convívio mais próximo e integral que uma mãe saberá os hábitos do infante, a exemplo do que gosta de comer, a hora que dorme, como reage a determinados remédios ou até mesmo se possui algum tipo de alergia. Os primeiros contatos serão definidores para toda uma vida em família.
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SOUSA, Antonio Rodrigo Machado de. Licença paternidade: 120 dias para o pai adotante único. Jus Navigandi, Teresina, ano 16, n. 2975, 24 ago. 2011. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/19841>. Acesso em: 17 set. 2011.

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