quarta-feira, 19 de outubro de 2011

Das formas de intervenção dos avós no processo alimentar: litisconsórcio

DA POSSIBILIDADE DE OS AVÓS FIGURAREM COMO LITISCONSORTES PASSIVOS FACULTATIVOS DESDE O PRINCÍPIO DA AÇÃO DE ALIMENTOS.

Considerando-se que o chamamento ao processo é a melhor forma de se integrar os progenitores na ação de alimentos, eis que já esgotadas todas as tentativas de se obter dos pais os recursos para a efetivação da pensão alimentícia, surge o seguinte questionamento: E se desde o princípio houver conhecimento da precariedade de condições dos principais obrigados? Deve-se, mesmo assim, proceder com o ajuizamento da ação e insistir na instrução somente em desfavor dos genitores, sabendo-se que, ao final, a pretensão restará infrutífera? Ou será que diante de tais vestígios poder-se-ia desde logo propor a ação também em face dos avós?

Uma das maiores controvérsias em relação à obrigação avoenga reside justamente na possibilidade, ou não, de propositura da ação de alimentos em face dos pais simultaneamente com os avós, como litisconsortes passivos facultativos.

É cediço que a ação alimentar deve ser dirigida primeiramente contra o responsável direto, para, somente nos casos de ausência, impossibilidade ou insuficiência de recursos dele, os avós serem chamados a integrar a lide. Para se chegar à conclusão da indisponibilidade do principal obrigado é necessário que se esgote as tentativas de cobranças deste. Somente quando evidenciada a ausência de recursos é que o juiz deve aceitar o chamamento dos avós para integrarem o pólo passivo da demanda alimentar. Entretanto, se houver conhecimento da insuficiência de recursos dos genitores desde o princípio, não deve haver óbices à propositura da ação em face dos avós, concomitantemente ao pai.

Com essa interpretação, estar-se-ia garantindo dois princípios bastante atuais para o direito: a efetivação prática do direito material e a economia processual, compreendida como a maior produção de efeitos concretos possíveis com o menor dispêndio de tempo.

Acerca desse assunto, inequivocadamente certo, Renan Lotufo, ilustre civilista da Faculdade de Direito da PUCSP, atenta que:
A tônica, pois, no direito contemporâneo é a de não se fixar em conceitos formais, mas se buscar a efetividade da justiça, deixando o exame da legitimidade passiva, em matéria de alimentos, para momento posterior ao de abertura do processo, uma vez que dependente de provas a serem produzidas na fase instrutória, como têm que ser relativas à necessidade do alimentando e à possibilidade dos alimentantes. [26]
Aliás, nesse mesmo sentido, convém atentarmos para lição da Insigne Maria Berenice Dias [27], que adverte:
É necessário, primeiro, buscar a obrigação alimentar do parente mais próximo. Nada impede, no entanto, intentar ação concomitante contra o pai e o avô. Constitui-se um litisconsórcio passivo facultativo sucessivo. Ainda que não disponha o autor de prova da impossibilidade do pai, o uso da mesma demanda atende ao princípio da economia processual. Na instrução é que, comprovada a ausência de condições do genitor, evidenciada a impossibilidade de ele adimplir a obrigação, será reconhecida a responsabilidade dos avós. A cumulação da ação contra pais e avós tem a vantagem de assegurar a obrigação desde a data da citação.
Ao se aceitar os progenitores como litisconsortes na ação de alimentos, não se quer, com isso, atropelar a subsidiariedade de sua responsabilidade. Pretende-se, apenas, agilizar o procedimento, nos casos em que se tem por indiciosa a impossibilidade financeira dos pais em suportar o encargo.

Com isso, evita-se que o alimentando fique desprovido de recursos para sua manutenção durante o lapso temporal em que ficou constatada a impossibilidade dos pais em pagar os alimentos e a nova instrução processual, agora com os avós sendo chamados ao processo para adimplir a obrigação.

Ou seja, mesmo que os progenitores participem da ação alimentar desde o princípio como litisconsortes passivos, eles serão responsabilizados se, e somente se, ficar constatada a impossibilidade dos pais, seja essa impossibilidade total ou parcial, passando-se, então, de forma subsidiária e complementar a responsabilidade para os avós.

Não há, com efeito, prejuízo algum para o processo, haja vista que a medida seria precipuamente uma questão de cautela.

A integração destes co-devedores na relação processual, assim, seria exercida apenas quando estivesse presente, na hipótese concreta, a utilidade desta participação no plano material. Ou seja, haverá de se averiguar as possibilidades do réu a quem a ação deveria ser originariamente proposta.

A respeito do litisconsórcio passivo facultativo dos avós, o STJ entendeu que:
Tratando-se de obrigação, como a hipótese contempla, avoenga, não se cuida de litisconsórcio necessário, como pretendem os recorrentes e sim de litisconsórcio passivo facultativo, bastando haja a opção por um dos avós que logre suportar o encargo nos limites de suas possibilidades." (REsp 658139 (2004/0063876-0 - 13/03/2006)
Dessa forma, além de não ir de encontro à subsidiariedade, conforme exposto, a medida se justifica até mesmo em face do caráter complementar da responsabilidade avoenga, haja vista que a quantificação dos alimentos deve ser orientada primeiramente com base nas necessidades de quem recebe, e não nas possibilidades de quem paga, e a aceitação dos avós no pólo passivo da demanda representa maior provisionamento para o alimentando.

Nesse mesmo sentido, decidiu o Tribunal de Justiça do Rio Grande de Sul:
Apelação. Ação de alimentos contra o pai e o avô paterno. Ilegitimidade passiva. Inocorrência. Denunciação da lide. Descabimento. Pensionamento em valor adequado. Não há falar em ilegitimidade passiva quando a demanda é direcionada contra o pai e o avô paterno simultaneamente. A falta do ascendente mais próximo, referida no art. 1.696 do novo Código Civil, não diz respeito apenas à morte ou desaparecimento deste, mas diz também com a eventual ausência de condições materiais suficientes para arcar com o sustento da prole, matéria a ser provada no decorrer da instrução probatória. Quando a demanda é direcionada contra apenas um dos avós, é possível chamar os demais ao processo (NCC, art. 1.698). Entretanto, não há falar em direito de regresso de um dos avós em face dos demais. Por esta razão, é totalmente descabida a denunciação da lide. A necessidade de complementação por parte do avô restou configurada, pois o genitor não consegue suprir totalmente as necessidades do filho. Caso em que o valor do pensionamento fixado em desfavor do genitor e do avô paterno na sentença recorrida é adequado e não merece reparo. Rejeitaram as preliminares. No mérito, negaram provimento (TJ/RS, 8ª Câmara Cível, AC nº 70006390629, rel. Rui Portanova, j. 14.08.03).
O importante é, portanto, ponderar qual é a melhor maneira de o processo servir o direito material. Chamando-se ao processo ou intervindo-se na qualidade de litisconsorte passivo facultativo, o mais interessante, sobretudo em ação de alimentos, é que o alimentando possa ter satisfeitas as suas necessidades da maneira mais completa possível.

SCHEER, Genaro Costi. A relativização da responsabilidade alimentar avoenga. Jus Navigandi, Teresina, ano 16, n. 3030, 18 out. 2011. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/20244>.

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