quarta-feira, 26 de outubro de 2011

O que é o tal do mandado de segurança que ouvimos com tanta frequência?

Saiu na Folha de quarta (5/10/11):
Prefeitura vai fechar o Center Norte hoje
O Shopping Center Norte, que já constou no "Guiness Book" como o maior do Brasil, será interditado hoje, por tempo indeterminado. No início da noite de ontem, a Justiça cassou a liminar que impedia o fechamento do local, construído em área contaminada devido à presença de gás metano. O argumento da prefeitura é de que há risco de explosão (…)
A prefeitura decidiu interditar o centro de compras por precaução, contra a opinião de técnicos da Cetesb (agência ambiental do Estado).
Em uma reunião, a Cetesb foi cobrada a apresentar garantias de que não haveria nenhuma explosão no shopping center. Nenhum técnico quis assumir o risco. A partir disso, a prefeitura decidiu interditar o local.
O Center Norte, onde trabalham cerca de 6.000 pessoas, foi construído sobre um antigo lixão. A matéria orgânica do subsolo produz gás metano, inflamável.
Inaugurado em 1984, o shopping diz que faz medições diárias do nível de gás no local, mas as medidas adotadas para evitar explosões não foram suficientes, na avaliação da Cetesb.
Na semana passada, o shopping fechou acordo com o Ministério Público se comprometendo a instalar nove drenos dos gases em um prazo de 20 dias.
Após o acordo, o juiz Emílio Migliano Neto, da 7ª Vara da Fazenda Pública, concedeu liminar proibindo a prefeitura de interditar o local.
O juiz argumentou que no acordo não consta a necessidade de interdição - a Cetesb é contra o fechamento por considerar que o risco de explosão é apenas ‘potencial’, e não imediato. Ontem, às 17h15, o mesmo juiz extinguiu a ação e cassou a liminar. Migliano Neto considerou que o mandado de segurança, instrumento jurídico utilizado pelos advogados do shopping, não é adequado para esse tipo de pedido

No último parágrafo o magistrado diz que o mandado de segurança não é o instrumento adequado para impedir o fechamento do shopping. Mas o que é o tal do mandado de segurança que ouvimos com tanta frequência?

Ele é um tipo de ação muito especial e simples que serve para proteger direitos quando eles são líquidos e certos. E essas são as duas coisas essenciais que faltaram no pedido feito pelo shopping da matéria acima. Mas o que significa um direito líquido e certo?

Direito certo é aquele que está bem definido. Por exemplo, se você tem uma conta no banco, seu direito de sacar o dinheiro que está lá é certo porque não há nenhuma dúvida de que o direito é seu.

Em outras palavras, o direito certo é aquele sobre o qual não cabe dúvida: temos certeza de que ele existe e a quem ele pertence.

Direito líquido é aquele que independe de qualquer outro evento ou ação. Por exemplo, se você passou em um concurso vestibular, formou-se no segundo grau e está com a documentação em dia, você tem o direito de se matricular. Não existe nenhum outro requisito que ainda precisa ser preenchido.

Em outras palavras, o direito líquido é aquele que pode ser exercício imediatamente.

No caso do shopping acima, o mandado de segurança é inadequado porque o direito do shopping permanecer aberto não é nem certo (porque, segundo a prefeitura, ele pode explodir) nem líquido (ele só permanecer aberto se os donos provarem que não há risco de explosão). Ora, se ainda há dúvidas se ele pode ou não permanecer aberto porque há dados científicos nos dois sentidos, não podemos dizer que não há dúvida a respeito da existência do direito do shopping de permanecer aberto. E sem certeza, não há mandado de segurança.

Existe um segundo termo técnico usado na matéria que pode causar confusão: a liminar. A liminar não é a mesma coisa que um mandado de segurança. Enquanto o mandado de segurança é um tipo de ação, a liminar é um tipo de pedido que pode existir dentro de qualquer ação, inclusive do mandado de segurança, como no caso da matéria acima.

Pense na seguinte analogia: o mandado de segurança é um tipo de veículo (por exemplo, um Fusca). A liminar é uma peça não essencial mas às vezes muito importante do veículo (por exemplo, um alarme). Todo Fusca pode ter um alarme (mas não precisa ter um para funcionar), mas o alarme pode estar em qualquer outro tipo de veículo.

E para que serve o pedido de liminar? Ele é um pedido feito para que o juiz dê uma ordem que impeça que algum dano irreparável aconteça antes de julgar o resto do caso. Mais uma analogia: pense que você e seu irmão estejam brigando por causa de um sorvete. Sua mãe irá decidir de quem é o sorvete, mas se ela não mandar guardar o sorveate no congelador até que ela decida que é o dono, ele irá derreter. A liminar é essa ordem para que o sorvete seja protegido até que sua mãe (a juíza) possa decidir quem de fato é o dono. Ela serve para proteger o direito de uma das partes quando ela parece ter direito ao que está pedindo (chamado em direito de ‘fumus boni iuris’) e convence o magistrado de que se ele não proteger aquele direito imediatamente, esse direito irá sofrer danos irreparáveis (o que os juristas chamam de ‘periculum in mora’).

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