terça-feira, 1 de novembro de 2011

A desconsideração da personalidade jurídica no STJ

A desconsideração da personalidade jurídica pode se tornar uma faca de dois gumes. A opinião é da professora da Universidade de Brasília (UnB), Ana Frazão, que acredita que, se por um lado ela aumenta a proteção de consumidores, por outro há o risco de desestimular grandes investimentos. Importada da Inglaterra pelo Brasil, ainda na década de 1960, a desconsideração da personalidade jurídica surgiu para resguardar bens pessoais de empresários e sócios em caso da falência da empresa.

Quase meia década depois, a desconsideração da personalidade jurídica está presente no Código de Defesa do Consumidor e no novo Código Civil, nas Leis de Infrações à Ordem Econômica e do Meio Ambiente. O STJ é pioneiro na consolidação da jurisprudência sobre o tema. Apesar das boas intenções que cercam a técnica, em muitos casos ela é empregada com o objetivo de lesar credores.

Em um caso que tramitou pela corte, relatado pelo ministro Luis Felipe Salomão, a desconsideração foi negada. Os autores da ação pediam a arrecadação dos bens da massa falida de uma empresa e também dos bens dos sócios da empresa controladora. Ao negar o pedido, o ministro Salomão considerou que não houve indícios de fraude, abuso de direito ou confusão patrimonial, requisitos essenciais para superar a personalidade jurídica, segundo o artigo 50 do CC, que segue a chamada “teoria maior”.

Hoje, existem duas teorias para aplicação da desconsideração, conta Ana de Oliveira Frazão. Enquanto uma se baseia no antigo Código Civil e tem exigências maiores, a outra determina que o dano a ser reparado pode ter sido apenas culposo e se aplica, por exemplo, quando há desvio de finalidade da empresa.

“A teoria menor é muito drástica, pois implica a completa negação da personalidade jurídica. Todavia, entendo que pequenos credores, como consumidores, e credores involuntários, como os afetados por danos ambientais, merecem tutela diferenciada”, opina.

O ministro Herman Benjamin aplicou a teoria menor em um caso no qual houve construção irregular no Parque Estadual de Jacupiranga (SP). A 2ª Turma do Superior Tribunal de Justiça considerou haver responsabilidade solidária do Estado pela falha em fiscalizar. O ministro relator ponderou que seria legal ação de regresso que usasse a desconsideração caso o responsável pela edificação não apresentasse patrimônio suficiente para reparar o dano ao parque.

Uma das teses consolidadas é a de que a execução contra sócio de empresa que teve sua personalidade jurídica desconsiderada não pode ser limitada à sua cota social. Em caso analisado pela 3ª Turma, um professor sofreu queimaduras de segundo grau nos braços e pernas após explosão em parque aquático.

A empresa foi condenada a pagar indenização de R$ 20 mil, mas a vítima não recebeu. A personalidade da empresa foi desconsiderada e a execução foi redirecionada a um dos sócios. De acordo com o relator, ministro Massami Uyeda, após a desconsideração, não há restrição legal para o montante da execução.

Existe também a desconsideração inversa, destinada aos casos nos quais pessoas físicas também tentam usar pessoas jurídicas para escapar de suas obrigações. A ministra Nancy Andrighi relatou recurso no qual um devedor se valeu de empresa de sua propriedade para evitar execução. Para ela, seria evidente a confusão patrimonial e aplicável a “desconsideração inversa”. A ministra ressalvou que esse tipo de medida é excepcional, exigindo que se atendam os requisitos do artigo 50 do CC.

Segundo Nancy Andrighi, no geral, os tribunais têm aplicado bem essa técnica. Ela alertou que criminosos buscam constantemente novos artifícios para burlar a legislação. “O que de início pode parecer exagero ou abuso de tribunais na interpretação da lei, logo se mostra uma inovação necessária”, declarou. Com informações da Assessoria de Comunicação do STJ.

REsp 693.235
REsp 1.071.741
REsp 1.169.175

Revista Consultor Jurídico

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