domingo, 13 de novembro de 2011

Do âmbito de incidência do Código de Defesa do Consumidor

O Direito do Consumidor está adstrito à atividade econômica.

Nesse sentido, como atividade econômica, na acepção de Eros Roberto Grau [04]: "compreende tudo aquilo que possa ser objeto de especulação lucrativa".

Por sua vez, a atividade econômica está ligada ao mercado. E quanto ao conceito de mercado, em sua existência concreta, Rizatto Nunes [05] explica que:
O mercador é uma ficção econômica, mas também é uma realidade concreta. Como dissemos, ele pertence à sociedade. Não é da propriedade, posse ou uso de ninguém em particular e também não é exclusividade de nenhum grupo específico. A existência do mercado é confirmada por sua exploração diuturna concreta e histórica. Mas essa exploração não pode ser tal que possa prejudicar o próprio mercado ou a sociedade.
Portanto, como "bem de uso comum do povo", a exploração do mercado é livre.

Esse é o sentido apontado pela Constituição Federal, a qual assegura a todos o livre exercício da atividade econômica.

No entanto, isso não se dá de forma incondicionada. É necessário asseverar, a partir do texto constitucional, que existem ditames a serem seguidos.

Portanto, o artigo 170 da Constituição Federal lista nove princípios gerais, assentando a atividade econômica em bases éticas e impingindo ao Empresário, responsabilidade social.

Entre os referidos princípios, encontra-se o da defesa do consumidor.

Nesse sentido, abordando essa conformação conceitual entre a atividade econômica e a proteção e defesa do consumidor, Antonio Jeová Santos [06] explica que:
Atílio Alterini parte do princípio de que é estatutário o regime jurídico de defesa do consumidor e adverte que, em se tratando de estatuto, há uma via de mão dupla, posto que podem ser diluídos os efeitos da incorporação ao direito comum de princípios mercantis. Assim, por exemplo, a exigência de auto-regulação dos comerciantes é contida pela expansão das regulamentações do contrato para cuidar dos interesses do consumidor; a máxima liberdade de formas tem como contrapartida certo renascimento do formalismo tendente à devida informação dos particulares; a celeridade do comércio é limitada pela existência de contratos nos quais a lei põe o consentimento em marcha lenta como uma proteção contra as tentações.
E não é só, no mesmo texto constitucional, em seu artigo 5º, XXXII, a Constituição Federal, dentre os deveres impostos ao Estado Nacional, estabelece o de promover, na forma da lei, a defesa do consumidor.

Portanto, por disposição do texto constitucional, veio a lume o Código de Defesa do Consumidor, o qual mais que uma lei, em uma acepção que se fia a uma sistematização de normas correlatas ao objeto de proteção, buscou uma feição principiológica, com um viés epistemológico e instrumental.

Nesse sentido, evidenciando tal faceta do diploma consumerista, José Geraldo Brito Filomeno [07] pondera que: "A novel "Ciência Consumerista", muito mais do que um conjunto de normas e princípios que regem a tutela dos consumidores de modo geral, direciona-se à implementação efetiva de instrumentos que os coloquem em prática".

E prossegue, concluindo que [08]:
Por isso mesmo é que o Código de Defesa do Consumidor, como se verá em passos seguintes, muito mais do que um corpo de normas, é um elenco de princípios epistemológicos e instrumental adequado àquela defesa. E, em última análise, cuida-se de um verdadeiro exercício de cidadania, ou seja, a qualidade de todo ser humano, como destinatário final do bem comum de qualquer Estado, que o habilita a ver reconhecida toda a gana de seus direitos individuais e sociais, mediante tutelas adequadas colocadas à sua disposição pelos organismos institucionalizados, bem como a prerrogativa de organizar-se para obter esses resultados ou acesso àqueles meios de proteção e defesa.
Assim, com a vigência do Código do Consumidor, passou-se a questionar o seu âmbito de incidência, considerando a sua concomitante existência com o Código Civil e do Código Comercial.

Ocorre que o âmbito de incidência do Código de Defesa do Consumidor está adstrito à proteção do consumidor, pressupondo uma relação jurídica desigual, ante a concepção da idéia de vulnerabilidade do consumidor, princípio estampado no artigo 4º, I, do diploma consumerista.

Ou seja, a aplicação do Código de Defesa do Consumidor busca essencialmente a proteção do consumidor das ações predatórias do mercado de consumo, preceituando, para tanto, uma série de determinações protetivas, que normatizam a atividade econômica, impondo deveres, em grande medida, ao fornecedor.

Portanto, fora desse paradigma contextual, a aplicação do Código de Defesa do Consumidor em uma relação jurídica de natureza cível ou mercantil mostra-se destituída de propósito, e representa, em última análise, a normatização do injusto.


SIMÕES, Alexandre Gazetta. Apontamentos sobre a caracterização da relação de consumo. Jus Navigandi, Teresina, ano 16, n. 3055, 12 nov. 2011. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/20425>

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