sexta-feira, 7 de outubro de 2011

Efetividade jurídica: existência, validade e eficácia

Iniciemos por uma breve definição do que seria a efetividade jurídica. Tomando por base o constitucionalista carioca Luís Roberto Barroso que, na conhecida obra Interpretação e Aplicação da Constituição, traz breve comentário sobre as três categorias de avaliação do ato jurídico: existência, validade e eficácia.

Para o ponto tratado, interessa-nos em especial a categoria "eficácia". Eficácia seria, para o autor em tela, a aptidão interna da norma para a geração de efeitos externos a ela [01], o que implica dizer que não há contradições internas à própria norma (o que comprometeria sua existência) ou dessa com o sistema normativo (o que comprometeria sua validade), não havendo nada, ao nível do ordenamento jurídico, que impeça a produção dos seus efeitos.

Destaca vigorosamente o nobre catedrático da UERJ a independência que têm as três categorias clássicas de avaliação do ato jurídico, em especial a eficácia, frente a real geração de efeitos do comando normativo no mundo fático. Para englobar essa preocupação no âmbito da teoria jurídica, necessário se faz romper a tríade clássica com a abertura de uma quarta categoria de avaliação do ato jurídico: a eficácia social ou efetividade jurídica, sendo que esta se reporta à relação de causalidade entre alterações no mundo fático e o conteúdo do comando normativo.

O professor Tércio Sampaio Ferraz Jr, luminar expoente da semiologia jurídica nacional, detém-se também sobre o tema, esmiuçando-o de forma a tornar mais claras as nossas reflexões. De acordo com o bastião paulista, a efetividade jurídica pode ser observada sob dois ângulos: lingüístico e pragmático.

Em termos lingüísticos, teríamos tanto a efetividade sintática, com o foco na aptidão interna da norma em produzir resultado (ênfase no aspecto-relato da norma), aproximando-se da concepção clássica de eficácia jurídica, quanto a efetividade semântica, que considera o mundo exterior à norma (ênfase no aspecto-cometimento da norma), porém este seria aprioristicamente prescritível, não se concebendo a possibilidade da norma ser desobedecida. Assim, enquanto inicialmente teríamos uma realização ideal (a-real = não reconhece a realidade reconhecível), no segundo teríamos uma idealização do real (in-real = reconhece uma realidade irreconhecível).

Em termos pragmáticos, por sua vez, teríamos a efetividade plena, uma vez que há adequação entre o aspecto-relato da norma (texto jurídico, equivalente à coerência normativa intra-sistêmica, como chamamos, ou eficácia jurídica, no dizer de Barroso) e o aspecto-cometimento da norma (contextualidade social, equivalente à coerência jus-sociológica inter-sistêmica, na nossa nomenclatura, e eficácia social, tratada por Barroso) [02].

Diante destas primeiras considerações, fica claro que não é suficiente ao Direito bastar-se em sua própria coerência intra-sistêmica, deslacunosa e não-contraditória. Reconhecer essa insuficiência é fundamental até sob o ponto de vista da credibilidade do sistema jurídico. A crise de credibilidade do sistema jurídico é produto da intercalação entre o mundo normativo e o mundo fático.

Os termos dessa intercalação influenciam no déficit de adesão a esse sistema, que, a partir de um determinado ponto, pode extrapolar a curva reprimível pela simples ampliação de sancionalidade normativa. Assim, o aspecto-relato da norma precisa estar coadunado com o aspecto-cometimento da norma, ou seja, precisa demonstrar certa ressonância social a envolver os arranjos normativos perfeitos, dando-lhe a devida legitimidade de modo a que a produção dos seus efeitos no mundo fático advenha de uma compatibilização jus-sociológica e não da mera ameaça de sanção, o que esvazia o sentido do ordenamento jurídico, tornando-o mediocremente contra-entrópico ao invés de pró-dinâmico.

DANTAS, Fagner Cordeiro. A Constituição cidadã alcança o trabalho pós-humano? A efetividade jurídica da proteção constitucional contra a automação abusiva. Jus Navigandi, Teresina, ano 16, n. 3015, 3 out. 2011. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/20115>. Acesso em: 7 out. 2011.

TJ gaúcho confirma interdição parcial de filho

A interdição parcial é medida cabível para pessoa portadora de transtorno de ordem psíquica e dependência química, com características de prodigalidade (pessoa que dilapida o patrimônio pessoal e familiar), que a incapacitem para os atos da vida civil. Com base nesse entendimento, os integrantes da 7ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul confirmaram sentença de primeira instância. A decisão é do dia 24 de agosto.

O filho recorreu ao Tribunal de Justiça contra a sentença que decretou sua interdição parcial, limitada aos atos de administração e de alienação do patrimônio. O juiz que concedeu a sentença nomeou sua mãe como curadora – ela foi a autora do pedido de interdição.

Em suas razões recursais, o filho afirmou ser plenamente capaz para os atos da vida civil. Alegou progressos nos seus problemas de saúde. Atribuiu a origem dos transtornos de que é portador à educação negligente recebida na infância. Ressaltou que, com o tratamento a que vem se submetendo, há possibilidades seguras de reintegração social.

No entendimento do relator da apelação, desembargador André Luiz Planella Villarinho, a prova nos autos é conclusiva no sentido de que ele é portador de transtorno mental e de comportamento decorrente do uso de canabonoides e de cocaína (e sua forma de crack); transtorno orgânico de personalidade; transtorno fóbico-ansioso não especificado; transtorno de personalidade emocionalmente instável, tipo borderline; transtorno de personalidade antissocial; transtorno de personalidade paranoide; e transtorno afetivo bipolar.

Embora haja nos autos atestado médico dando conta de que, naquele momento, o apelante apresentava plenas condições para reger-se, assim como a seus bens, de forma adequada, a prova pericial produzida, assim como os estudos sociais presentes nos autos, prevalece no sentido de atestar sua incapacidade parcial, diz o voto do relator.

‘‘Vale ressaltar que, seis meses antes, o mesmo médico psiquiatra atestou que o apelante era incapaz total e definitivamente para o trabalho’’, acrescentou. ‘‘Tal documento vem ao encontro da avaliação psiquiátrica, que concluiu pela incapacidade relativa e temporária para os atos da vida civil, sugerindo que o requerido submeta-se a um plano terapêutico prolongado, com exigência de que se abstenha de forma absoluta do uso de drogas, sob orientação de seu curador, pelo período de três anos’’.

O voto foi seguido, por unanimidade, pelos demais integrantes do colegiado, desembargador Sérgio Fernando de Vasconcellos Chaves e juiz convocado Roberto Carvalho Fraga. Com informações da Assessoria de Imprensa do TJ-RS.

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Revista Consultor Jurídico

CPI: As investigações e inquéritos não podem cercear a atividade do advogado

As investigações e inquéritos não podem cercear a atividade do advogado e exercer poder absoluto sobre os casos. Parece óbvio, ou até batido, mas o decano do Supremo Tribunal Federal, ministro Celso de Mello, teve de reafirmar o entendimento mais uma vez, nesta quarta-feira (4/5). Em liminar em Mandado de Segurança, o ministro garantiu ao Escritório Central de Arrecadação e Distribuição (Ecad) o direito ao contraditório e a garantia de peticionar.

O órgão é o responsável pela arrecadação de direitos autorais em músicas em fonogramas. Desde junho deste ano, é alvo de Comissão Parlamentar de Inquérito, que apura acusações de irregularidades na distribuição dos direitos autorais, abuso da ordem econômica e formação de cartel. Além disso, a CPI discute o modelo atual da arrecadação coletiva de direitos — que tem o Ecad como entidade centralizadora — e a necessidade de reformulação da Lei 9.910/1998, a Lei do Direito Autoral.

Mas os advogados do Ecad, Fernando Fragoso e Rodrigo Falk Fragoso, têm sido preteridos das discussões da CPI. "Aparentemente, as portas do Senado se fecharam para a defesa do Ecad, não havendo alternativa outra a não ser a de socorrer-se do Supremo Tribunal Federal", diz a defesa.

As portas e o porteiro
Antes da reunião do dia 16 de agosto, Fernando questionou a falta de quórum da sessão, pois apenas dois, dos 11 senadores designados, estavam presentes. A questão de ordem foi afastada pelo presidente da Comissão, senador Randolph Rodrigues (PSol-AP).

Dada continuidade à reunião, Fragoso pediu a palavra mais uma vez e requereu que a mesa examinasse e deliberasse uma de suas petições. Ele questionava o depoimento do músico e vice-governador de São Bernardo (SP), Frank Aguiar, também presidente a Acimbra — um escritório de arrecadação expulso do Ecad por suspeita de transferência forjada de 30 titulares de direitos autorais.

O senador Rodrigues, mais uma vez, negou o pedido. Disse que somente os membros da CPI é que podiam sustentar oralmente; os demais devem se defender apenas por escrito. Também afirmou que, "excepcionalmente", permitiria a um advogado formular suas questões oralmente. O presidente da CPI recebeu a petição, mas não deu curso ao incidente processual, como manda o Código de Processo Penal, artigo 214. E Fragoso ficou proibido de falar durante a reunião.

No dia 16 de setembro, Marcos do Val, gerente de relações institucionais do Ecad, fez outra petição. Alegou atividade suspeita do assessor parlamentar Alexandre Negreiros, o que o impediria de auxiliar nos trabalhos da CPI. A Comissão, entretanto, se recusou a receber a petição.

Em 20 de setembro, nova petição. Agora para ter acesso a documentos confidenciais coletados pela CPI, o que também foi negado. Segundo a defesa do Ecad, as atitudes do presidente da Comissão e dos demais membros são "de corar frade de pedra". Os episódios foram denunciados à Ouvidoria do Senado, mas em vão. Restou recorrer ao Supremo.

Limites ao poder absoluto
Na decisão liminar, o ministro Celso de Mello frisou que se tratava de uma reafirmação de outras decisões e da jurisprudência do Supremo. O entendimento de que a CPI deve se sujeitar às regras constitucionais e responder, tanto quanto qualquer outra investigação, ao Judiciário já está fixado desde os anos 1990.

Segundo a decisão do decano do STF, "o poder não se exerce de forma ilimitada", pois "não há lugar para o poder absoluto". Por isso, a CPI deve responder às determinações da Constituição Federal, que garantem o direito à ampla defesa e ao advogado o acesso a todas a investigação, inclusive as que estão sob sigilo.

A unilateralidade da CPI, segundo Celso de Mello, não garante a ela poderes absolutos. Sendo assim, não é permitido que sejam negados direitos ou suprimidas liberdades. "As Comissões Parlamentares de Inquérito, à semelhança do que ocorre com qualquer outro órgão do Estado ou com qualquer dos demais poderes da República, submetem-se, no exercício de suas prerrogativas institucionais, às limitações impostas pela autoridade suprema da Constituição."

Por fim, sustenta que a função de investigar não pode ser "uma sucessão de abusos nem reduzir-se a atos que importem em violação de direitos". Optou por conceder a liminar em Mandado de Segurança ao Ecad. O mérito do caso ainda não está na pauta do Supremo.
MS 30.906
Pedro Canário . Fonte: Consultor Jurídico.