terça-feira, 30 de outubro de 2012

Agravo de Instrumento

Sabe-se que o recurso de agravo de instrumento está regulamentado no artigo 522 e seguintes do Código de Processo Civil, o qual dispõe:
Art. 522. Das decisões interlocutórias caberá agravo, no prazo de 10 (dez) dias, na forma retida, salvo quando se tratar de decisão suscetível de causar à parte lesão grave e de difícil reparação, bem como nos casos de inadmissão da apelação e nos relativos aos efeitos em que a apelação é recebida, quando será admitida a sua interposição por instrumento. (Redação dada pela Lei nº 11.187, de 2005)[2]
O mestre e doutrinador José Miguel Garcia Medina assim conceitua:
O agravo é o recurso cabível contra decisões interlocutórias, salvo em hipóteses em que decisões com natureza jurídica de sentença (nos termos dos arts. 162, §1º, 267 e 269 do CPC) são agraváveis e outros casos, também excepcionais, em que despachos sejam capazes de gerar prejuízo.[3]
Conforme se extrai do conceito e do artigo acima transcritos, tal recurso, via de regra, é cabível contra decisões interlocutórias suscetíveis de causar à parte lesão grave ou de difícil reparação,assim como nos casos em que o juízo a quo não admite a interposição de apelação, ou ainda quando o recurso for relativo aos efeitos em que a apelação é recebida.

Salienta-se que o Agravo de Instrumentotem como objetivo incitar Tribunal Competente a analisar a decisão proferida pelo Juiz a quo e suspender os efeitos da decisão proferida em primeira instância.

GABARRA, Marina Junqueira. O cabimento do agravo de instrumento em sede dos juizados especiais cíveis. Jus Navigandi, Teresina, ano 17, n. 3407, 29 out. 2012 . Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/22894>.

O procedimento dos Juizados Especiais Cíveis

Da Carta Magna de 1988, em seu art. 98, previu a criação de Juizados Especiais, conforme se extrai:
Art. 98: A União, no Distrito Federal e nos Territórios, e os Estados criarão:
 I – juizados especiais, promovidos por juízes togados ou togados e leigos, competentes para a conciliação, o julgamento e a execução de causas cíveis menor complexidade e infrações penais de menor potencial ofensivo, mediante os procedimentos oral e sumaríssimo, permitidos, nas hipóteses previstas em lei, a transação e o julgamento de recursos por turmas de juízes de primeiro grau[1].
 Com o intuito de regulamentar o disposto no artigo 98 da Constituição Federal de 1988, foi promulgadaa Lei 9.099 de 1995, a qual, além de regular o procedimento sumaríssimo, também ampliou o acesso àJustiça, tendo em vista que a principal missão da Lei dos JuizadosEspeciais é permitir que se leve ao Poder Judiciário pretensão que normalmente não seria deduzida em juízo devido a seu pequeno valor ou então a sua simplicidade.

Tendo em vista as causas de pequeno valor e de pequena complexidade, o procedimento dos Juizados Especiais Cíveis está pautado nos princípios da oralidade, da simplicidade, da informalidade, da celeridade e da economia processual, motivo pelo qual, há a concentração de alguns atos processuais e a eliminação outros, visando, sempre que possível, a conciliação entre os litigantes.

Por ser um procedimento especial, regulado por uma Lei própria, algumas normas previstas no Código de Processo Civil não se aplicam no procedimento do Juizado Especial Cível.

GABARRA, Marina Junqueira. O cabimento do agravo de instrumento em sede dos juizados especiais cíveis. Jus Navigandi, Teresina, ano 17, n. 3407, 29 out. 2012 . Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/22894>.

segunda-feira, 29 de outubro de 2012

Regime de bens e divisão da herança: dúvidas jurídicas no fim do casamento


Regime de bens e divisão da herança: dúvidas jurídicas no fim do casamento

A escolha do regime de bens pelo casal determina o compartilhamento ou não do patrimônio de ambos durante a vigência do matrimônio e define se haverá direito à meação após a dissolução do vínculo conjugal. Além disso, em caso de morte, influencia na divisão da herança, um tema envolto em grandes divergências.

Quer entender o assunto?
Leia http://www.stj.gov.br/portal_stj/publicacao/engine.wsp?tmp.area=398&tmp.texto=107528

Fonte: Face do STJ

quinta-feira, 25 de outubro de 2012

Impenhorabilidade de imóvel alugado

Leia a súmula 486 do Superior Tribunal de Justiça na íntegra: http://bit.ly/QmJKR5
Fonte: Face do CNJ

A união poliafetiva


Há pouco tempo, a imprensa noticiou a lavratura de escritura formalizando a união de três pessoas, por uma tabeliã, em cartório do interior de São Paulo. O fundamento utilizado para justificar o ato foi a inexistência de lei proibindo tal espécie de relacionamento.
A questão é tormentosa e já fomentou acaloradas discussões.
Eventuais ajustes patrimoniais celebrados entre três ou mais pessoas que queiram viver juntas, principalmente para gerar efeitos sobre os bens adquiridos na vigência do período compreendido pela avença, não parecem ferir a lei e, nesse contexto, devem ser tidos como válidos. Como se contrato fosse.
Afinal, nós, cidadãos, somos livres para contratar e fazer escolhas. Todas as pessoas capazes são comandantes de suas próprias conveniências. Os princípios constitucionais da liberdade, da igualdade e da dignidade da pessoa humana representam importantes alicerces autorizadores de comportamentos e preferências as mais variadas.
Porém, o ordenamento jurídico não pode ser visto como um sistema divorciado da realidade social que o cerca. O Direito, como ciência social, deve ser sensível às modificações que a sociedade experimenta.
Por isso, não se nega que o sistema jurídico deva mesmo estar em sintonia com o que acontece na realidade.
As uniões entre homossexuais, por exemplo, há tempos era uma realidade social, ainda que recôndita em muitas situações. O Poder Legislativo demorou injustificadamente para tutelar situações jurídicas como essa.
Não foi diferente com a união estável entre heterossexuais. Muitas injustiças tiveram de ser digeridas e bastante tempo foi necessário para o amadurecimento em torno do assunto, num país em que há apenas 35 anos, o casamento era indissolúvel (exceto pela morte).
Os valores mudam, os fatos são distintos conforme o tempo passa e o sistema jurídico costuma estar sempre um passo atrás. Se a união entre três ou mais pessoas será ou não um fato social relevante a recomendar tutela jurídica específica, o tempo dirá. No entanto, não parece que assim seja agora.
Ainda que, em tese, o princípio da liberdade possa fundamentar pretensões dessa natureza, a união estável concebida pela CF/88 pressupõe duas pessoas. E um dos comandos constitucionais é o de facilitar a conversão da união estável em casamento.
É verdade que o casamento não é imprescindível para a caracterização de família. Outras formas de família são concebidas, como a monoparental e a própria união estável. Mas se um dos objetivos do instituto é o de facilitar a sua conversão em casamento e a bigamia é vedada pelo ordenamento jurídico, parece-nos não ser possível equiparar a união poliafetiva à união estável.
Nosso arcabouço jurídico atual, especialmente no que se refere à união estável, é incompatível com a união poliafetiva. A união estável, além de constituir forma de família, traz importantes consequências jurídicas tanto durante a sua vigência (deveres recíprocos entre os companheiros) quanto após a sua extinção, pela desunião ou pela morte.
Apenas para exemplificar, um companheiro pode ter direito sucessório em face da morte do outro. No caso da união poliafetiva, como seriam divididos os bens do autor da herança? Em partes iguais entre os companheiros sobreviventes? Na união poliafetiva, o vínculo entre os envolvidos é idêntico entre eles ou pode haver diferença? A resposta a questões como essas, no caso de admissão jurídica de efeitos idênticos aos da união estável, dependeria da dinâmica da relação, da evolução e do amadurecimento em torno do tema. Sempre com base nos fatos.
Todo o cerne da questão envolve fatos. Diante disso, cabe a pergunta: atualmente, há fatos sociais relevantes que justificam tal empreitada? A resposta é negativa. Não há. Casos particulares e excepcionais devem ser assim tratados. O contrato e o testamento podem resolver grande parte dos problemas e preocupações que decorram da chamada união poliafetiva. E o Poder Judiciário representa instância final que terá em conta fatos e valores para, de acordo com o ordenamento jurídico, fazer Justiça. Não foi assim que aconteceu com a união estável?
Por tudo isso, não convém colocar o carro na frente dos bois.

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 * Adriano Ferriani é professor de Direito Civil e chefe do departamento de Direito Civil, Direito Processual Civil e Direito do Trabalho da PUC/SP. 
Fonte: http://www.migalhas.com.br/Civilizalhas/94,MI166305,61044-A+uniao+poliafetiva

Filha de doméstica criada por patrões tem direito à herança da mãe afetiva

A 4ª câmara de Direito Civil do TJ/SC reconheceu a existência de paternidade e maternidade socioafetiva no caso de uma mulher que, filha de empregada doméstica, a partir dos quatro anos de idade foi criada pelos empregadores, após a morte da mãe biológica. Naquela ocasião, eles obtiveram a guarda provisória da menina. 
 
Para o desembargador Jorge Luiz da Costa Beber, os autos revelam que à autora foi dedicado o mesmo afeto e oportunidades concedidos aos filhos biológicos do casal. Ambos figuraram, ainda, como pais nos convites para o baile de debutantes e casamento da demandante, que era inequivocamente tratada como membro do núcleo familiar. 


Com a morte da mãe afetiva, excluída a autora da respectiva sucessão, iniciou-se o litígio, que culminou com a declaração da paternidade e maternidade socioafetiva para todos os fins hereditários, já na comarca de origem.

Uma relação afetiva íntima e duradoura, remarcada pela ostensiva demonstração pública da relação paterno-materno-filial, merece a respectiva proteção legal, resguardando-se direitos que não podem ser afrontados por conta da cupidez oriunda de disputa hereditária”, salientou o desembargador Costa Beber. A decisão foi unânime.

Fonte: http://www.migalhas.com.br/Quentes/17,MI166317,21048-Filha+de+domestica+criada+por+patroes+tem+direito+a+heranca+da+mae

terça-feira, 23 de outubro de 2012

Cliente branca processa McDonald´s por discriminação

Uma mulher branca processou uma empregada negra do McDonald´s alegando racismo. “Os réus negaram uso pleno e igual gozo de um lugar público com base em sua cor, sexo e raça.", diz reportagem foi publicada no site Huffington Post.

Esse caso não é isolado. Segundo um estudo divulgado por pesquisadores da Tufts University and Harvard Business School, no ano passado, as pessoas brancas acreditam que são os principais alvos de discriminação racial nos Estados Unidos.

A ação foi interposta porque a funcionária não entregou uma quantia extra de biscoitos a cliente, que teria reclamado da quantidade do produto que lhe foi dada. O caso aconteceu em Missouri no dia 30 de novembro de 2011.

Segundo a denúncia, quando a cliente reclamou da quantidade de biscoitos, a funcionária teria dito: “A garota branca tem um problemas com seus biscoitos”. A empregada e o gerente teriam afirmado que a cliente poderia receber o dinheiro de volta, mas não poderia receber outra porção do produto.

A denúncia afirma que a funcionária do McDonald´s, “ameaçou (a cliente) de danos corporais”. De forma geral, diz a cliente, as atitudes dos réus foram “escandalosas”, pois tratavam-se de  motivos maldosos ou indiferentes em relação aos direitos dos outros.
Revista Consultor Jurídico, 21 de outubro de 2012
http://www.conjur.com.br/2012-out-21/cliente-branca-processa-mcdonalds-discriminacao-racial

Condomínio deve autorizar menor a frequentar a academia de prédio

O juiz da 9ª Vara Cível de Brasília determinou que um condomínio autorize uma menor a frequentar a academia do local e a utilizar os aparelhos ergométricos, especialmente a esteira, acompanhada de profissional legalmente habilitado. A menor havia sido proibida após um desentendimento de sua mãe com uma moradora. Segundo o juiz, não é razoável que uma criança de 11 anos seja impedida de utilizar a academia do prédio pelo motivo de desentendimento entre a mãe dela e outra moradora do local. As informações são do site JustiçaemFoco.

Após mais de seis meses de regular utilização do local com a ciência do síndico, a menor, que mora no condomínio, foi proibida de frequentar a academia. Ela alegou sempre ter ido a academia acompanhada de personal trainner e somente para utilizar os aparelhos de atividades ergométricas. A autora foi impedida de utilizar a esteira da academia. O fato aconteceu após um desentendimento entre a mãe da garota e uma moradora do condomínio. A mãe foi chamada pelo síndico do condomínio e advertida de que sua filha não poderia mais utilizar as instalações da academia, pois as normas de funcionamento não amparavam a presença de menores de 12 anos de idade.

Segundo defesa do réu, a Norma de Funcionamento da Academia do Condomínio proíbe a permanência de crianças no local. Afirmou também que uma assembleia deliberou sobre o assunto e manteve a proibição.

Segundo sentença do juiz, “não se revela razoável que uma criança de 11 anos, com prescrição médica e acompanhada de profissional habilitado, seja impedida de frequentar a academia do prédio onde mora, na qual pretende utilizar única e exclusivamente a esteira em atendimento à prescrição médica, apenas pelo fato de sua mãe ter tido um desentendimento com outra moradora do condomínio”.
Revista Consultor Jurídico, 22 de outubro de 2012
http://www.conjur.com.br/2012-out-22/condominio-autorizar-menor-frequentar-academia-predio

"Se CPC ficar como está, melhor não sair" (Ada Pellegrini Grinover)



No Brasil, a excessiva judicialização dos conflitos vem da omissão do Legislativo. “Os deputados e senadores estão mais interessados em Comissão Parlamentar de Inquérito”, na avaliação da processualista Ada Pellegrini Grinover. Em entrevista à revista Consultor Jurídico, a professora da Faculdade de Direito da USP nascida na Itália não só relembrou a infância como comparou o Judiciário brasileiro ao de países europeus. Segundo ela, a Administração Pública na França, por exemplo, mesmo sem ter a palavra final, resolve as questões de sua competência, satisfatoriamente. No Brasil, “a Administração se omite, o Legislativo não decide e tudo vai parar no Judiciário”.

O cidadão é obrigado a procurar a Justiça, segundo Ada, pela omissão legislativa e pelos vários projetos de lei que esperam vez no Congresso Nacional — isso deixa "temas polêmicos no Brasil", como união homoafetiva e os limites do controle de políticas públicas, nas mãos de juízes, desembargadores e ministros.

Autora do livro Teoria Geral do Processo, referência nos cursos de Direito, Ada criticou o projeto do novo Código de Processo Civil que, para ela, se resume ao aperfeiçoamento do Código de 1973. Poucas questões estão classificadas por ela no grupo de melhorias, a maioria, como a Ação Declaratória Incidental, a Reconvenção, e os Embargos Infringentes, são questões que “ainda não estão boas”. Para ela, se o Código permanecer do jeito que está, “é melhor que não saia”.

Durante a entrevista, foi possível conhecer um pouco da vida da processualista: as fotos de família estão em porta-retratos espalhados pelos móveis e os livros, alinhados na prateleira, ocupam uma grande parede da sala de sua casa. Uma estátua japonesa separa o cômodo em dois ambientes. Na mesa de centro, duas garruchas, um revólver e adagas — lembranças que trouxe da Itália.
.....
Leia a íntegra em: http://www.conjur.com.br/2012-out-21/entrevista-ada-pellegrini-grinover-processualista 

sexta-feira, 19 de outubro de 2012

Pensão alimentícia é dedutível do Imposto de Renda

Ao rejeitar Embargos de Declaração interpostos pela Fazenda Nacional, a Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais (TNU) manteve, na prática, acórdão favorável à dedução do Imposto de Renda dos valores pagos a título de pensão alimentícia, mesmo sem decisão judicial. A sessão de julgamento aconteceu nesta quarta-feira (17/10).

O relator da matéria, juiz federal Adel Américo Dias de Oliveira, registrou em seu voto: “Na linha do posicionamento trilhado pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região, entendo que, embora a previsão legal seja a de que podem ser deduzidos da base de cálculo do Imposto de Renda os valores pagos a título de alimentos ou pensões, ‘em cumprimento de acordo ou decisão judicial, inclusive a prestação de alimentos provisionais’, a interpretação deve ser homogênea e sistêmica, conjugada ao Sistema Tributário Nacional, o que implica concluir que a pensão alimentícia é dedutível da base de cálculo do Imposto de Renda, seja ela decorrente de decisão judicial ou não, mas desde que devidamente comprovada”.

Após decisão da Turma Recursal da Seção Judiciária do Rio Grande do Norte favorável ao contribuinte, a União recorreu à TNU, mediante incidente de uniformização de jurisprudência. Alegou, entre outros fundamentos, que o acórdão recorrido diverge da jurisprudência do STJ, ressaltando que o acordo de pensão alimentícia, não homologado judicialmente, não serve para dedução do imposto de renda. Com informações da Assessoria de Imprensa do Conselho da Justiça Federal.
Revista Consultor Jurídico, 18 de outubro de 2012
http://www.conjur.com.br/2012-out-18/pensao-alimenticia-dedutivel-ir-mesmo-decisao-judicial

domingo, 14 de outubro de 2012

O impacto ambiental da propaganda eleitoral



Embora visíveis todas maneiras pelas quais se faz propaganda eleitoral, passa despercebida para maioria da população a rotina diária, em todo o país, de carros, caminhões e outros veículos que descarregam toneladas de propaganda eleitoral apreendida ou recolhida por não obedecer aos padrões e às formas estabelecidas pela legislação eleitoral. Salas, pátios e galpões da Justiça Eleitoral não são mais suficientes para acomodar todo este material, cuja destruição, ao final do processo eleitoral, apresenta-se como previsível.

O processo social brasileiro de escolha democrática de seus representantes tem avanços incontestáveis, sobretudo no quesito “limpeza”, seja pela aprovação de um projeto de lei de iniciativa popular, conhecido como Ficha-Limpa, seja pelas campanhas institucionais da Justiça Eleitoral para a escolha de candidatos pelo “voto limpo”. Entretanto, pouco ou nada se tem feito em relação ao impacto ambiental da propaganda eleitoral.

Se, por um lado, as normas eleitorais garantem a propaganda eleitoral como o instrumento de mensagem política proposta pelos que se apresentam como candidatos a alguma função pública representativa, por outro, a própria Constituição Federal da República (art. 225) garante aos cidadãos meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à qualidade de vida, sendo dever do Poder Público e da coletividade a sua preservação.

No que diz respeito à propaganda eleitoral, e de acordo com a publicação da 2ª parcial de prestação de contas de campanha ao TSE (www.tse.jus.br), já se gastaram mais de R$ 1 bilhão e a previsão é que se chegue a mais do dobro deste valor no final do período da propaganda eleitoral.

Leia a íntegra em: http://www.conjur.com.br/2012-out-12/feito-relacao-impacto-ambiental-propaganda-eleitoral

sábado, 13 de outubro de 2012

As hipóteses legais restritivas da adoção conjunta no Estatuto da Criança e do Adolescente e a proposta de uma interpretação teleologicamente orientada ao interesse superior da criança

No que concerne aos efeitos sobre os vínculos familiares, a doutrina aponta uma classificação dicotômica da adoção. De um lado, há a adoção singular, entendida como a realizada a pedido de apenas uma pessoa, homem ou mulher, e que vem sendo chancelada jurisprudencialmente, não obstante inexistir previsão textual no ECA. De outro, a adoção conjunta, que conta com previsão expressa nos parágrafos do art. 42 do Estatuto. Reproduzo-os:
§ 2o  Para adoção conjunta, é indispensável que os adotantes sejam casados civilmente ou mantenham união estável, comprovada a estabilidade da família.
§ 4º  Os divorciados, os judicialmente separados e os ex-companheiros podem adotar conjuntamente, contanto que acordem sobre a guarda e o regime de visitas e desde que o estágio de convivência tenha sido iniciado na constância do período de convivência e que seja comprovada a existência de vínculos de afinidade e afetividade com aquele não detentor da guarda, que justifiquem a excepcionalidade da concessão.
Diante do texto de lei, a questão que se coloca é a de saber se essas hipóteses previstas no Estatuto foram fixadas em numerus clausus ou, ao revés, poder-se-ia admitir a sua ampliação para o fim de autorizar a adoção conjunta em situações não expressamente reguladas no texto legal.
Essa dúvida foi recentemente objeto de discussão no STJ. No caso submetido ao exame daquele Tribunal Superior, a União interpôs recurso especial com vistas a anular a adoção conjunta de uma criança feita por uma mulher com seu irmão. A peculiaridade do caso reside, todavia, na circunstância de o irmão da adotante ter falecido no decurso do procedimento judicial.
Aí se cuida de invocar o § 6º do art. 42 do Estatuto (com a redação dada pela Lei 12.010/09). Colaciono:
§ 6º  A adoção poderá ser deferida ao adotante que, após inequívoca manifestação de vontade, vier a falecer no curso do procedimento, antes de prolatada a sentença.
Nesse dispositivo, encontramos a autorização legal para a figura que a doutrina convencionou denominar de adoção póstuma, post mortem ou nuncupativa. Sua leitura permite inferir tratar-se de modalidade especial de adoção, havida em decorrência do falecimento de um dos adotantes no curso do procedimento. Como o óbito deu-se antes da prolação da sentença que decide acerca da formação do vínculo filial adotivo, o legislador cuidou de autorizar o deferimento da medida de colocação em família substituta, contanto que comprovada a manifestação de vontade inequivocamente direcionada a esse propósito pelo adotante falecido. É, por isso mesmo, a única hipótese que admite que a sentença - que reconhece ao adotado a filiação postulada - possa operar retroativamente, projetando (ex tunc) os efeitos da coisa julgada então formada para a data em que o adotante veio a falecer.  
No caso concreto, a União impugnou de ilegal a adoção póstuma deferida, em razão de que teria havido desrespeito à regra do § 2º do art. 42 do ECA, no sentido de que “Para adoção conjunta, é indispensável que os adotantes sejam casados civilmente ou mantenham união estável, comprovada a estabilidade da família.” Ora, como os adotantes eram irmãos, desatendida estaria a norma aludida, porquanto não teriam satisfeitos os requisitos de casamento, tampouco de união estável. Sequer virtualmente seria possível pensar em casamento entre os adotantes, dado haver impedimento civil a obstar que irmãos contraiam o enlace matrimonial (CC, art. 1.521, IV).
Submetido o recurso especial a julgamento, a Terceira Turma do STJ entendeu que as hipóteses de adoção conjunta, previstas no artigo 42 do Estatuto da Criança e do Adolescente, não são as únicas que atendem ao objetivo essencial da lei, que é a inserção do adotado em família estável. Seguindo o voto da relatora, Min. Nancy Andrighy, a Turma entendeu que o pedido de adoção, no caso concreto, confundir-se-ia com o reconhecimento de filiação socioafetiva preexistente. Sim, pois o adotante falecido já de há muito construíra vínculo de afeto com o adotado, aliás, desde que esse possuía 4 anos de idade. Com isso, o entendimento turmário inclinou-se no sentido de perquirir a inequívoca intenção de adotar pelo falecido. Uma vez caracterizada essa intenção, a Turma entendeu que as restrições legais do § 2º do art. 42 do ECA não se poderiam sobrepor ao melhor interesse do adotando – que, no caso sub examinen, dava-se exatamente com o reconhecimento judicial da adoção. Eis as palavras da relatora do caso em apreço:
A exigência legal restritiva, quando em manifesto descompasso com o fim perseguido pelo próprio texto de lei, é teleologicamente órfã, fato que ofende o senso comum e reclama atuação do intérprete para flexibilizá-la e adequá-la às transformações sociais que dão vulto ao anacronismo do texto de lei.   
O mais interessante é notar que, com essa decisão, o STJ superou a discussão em derredor da adoção conjunta, consistente na sua limitação legal às hipóteses expressamente consignadas nos parágrafos do art. 42 do ECA. Isso porque, se o julgador reconhecer em concreto que a inserção do adotando em família substituta atende o interesse superior da criança e do adolescente (doutrina da proteção integral), a exemplo da formação pretérita de núcleo familiar estável lastreado em relação comprovadamente sólida de afeto, seria de todo desarrazoado ater-se a um legalismo estrito, para impedir o deferimento da adoção. Semelhante entendimento, que pugna por uma exegese legalista empedernida, iria de encontro ao próprio Estatuto da Criança e do Adolescente, o qual determina, de maneira expressa, que na interpretação dessa lei levar-se-ão em conta os fins sociais a que ela se dirige, as exigências do bem comum, os direitos e deveres individuais e coletivos, e a condição peculiar da criança e do adolescente como pessoas em desenvolvimento (art. 6º).  


A decisão da Terceira Turma do STJ constitui-se em precedente dos mais importantes quanto ao estudo do instituto da adoção no Direito da Criança e do Adolescente brasileiro. Nos seus termos, percebemos a tendência da Corte em superar exegeses estritamente legalistas, em homenagem à principiologia que encerra o Estatuto, voltada à realização dos direitos fundamentais de cunho infantojuvenis.
Mais do que isso, a decisão do STJ demonstra que o Estatuto da Criança e do Adolescente deve ser interpretado à luz da doutrina da proteção integral e prioritária. Impende, assim, analisar a aplicação das regras da Lei 8.069/90 teleologicamente orientadas a assegurar a eficácia dos direitos fundamentais conferidos às crianças e aos adolescentes. Diante desse orientação teleológica, descabe argumentar-se que requisitos legais estariam a ser violados, quando se puder observar que circunstâncias aparentemente não previstas em lei atendem ao interesse superior do infante.
A conclusão, portanto, é a de que o Estatuto da Criança e do Adolescente reclama uma interpretação aberta, assecuratória dos direitos fundamentais infantojuvenis em ordem a dar-lhes máxima expressão eficacial. Só uma interpretação teleológica dessa natureza tem o condão de concretizar as normas que integram a arquitetura internacional de direitos humanos protetiva da infância e da juventude, nos termos das quais é imperioso reconhecer também às crianças e aos adolescentes a condição de credores da dignidade da pessoa humana, isto é, de autênticos sujeitos de direito.

TEODORO, Rafael. Interpretação teleológica e superação das hipóteses legais restritivas da adoção conjunta no Estatuto da Criança e do Adolescente. Análise da decisão do STJ no precedente da adoção póstuma entre irmãos. Jus Navigandi, Teresina, ano 17, n. 3390, 12 out. 2012 .

Princípio da proteção integral

Dentre os princípios orientadores do Direito da Criança e do Adolescente, o da proteção integral é merecedor de destaque. É com base nele que a doutrina sublinha, dentro da sistemática protetiva dos infantes, o aspecto consistente no reconhecimento de que são autênticos sujeitos de direito. Com isso, afasta-se a ideia de que crianças e adolescentes seriam meros objetos da proteção jurídico-legal.
A distinção entre sujeito e objeto é relevante para o Direito da Criança e do Adolescente. Por exemplo, foi com base na noção de criança-objeto que se deu a elaboração da Declaração dos Direitos da Criança de Genebra de 1924 – marco regulatório pioneiro do tema dentro da historiografia do Direito Internacional dos Direitos Humanos, uma vez que enunciou o dever de proteção integral da infância.
Com a promulgação da Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH), de 1948, a proteção da dignidade da pessoa humana tornou-se o centro nevrálgico da sociedade internacional, que paulatinamente passou a reconhecer à tutela dos direitos humanos o qualificativo de normas imperativas de direito internacional (ius cogens).
Logicamente, os direitos infantojuvenis também foram afetados pela nova conformação do Direito Internacional após a promulgação da Declaração de 1948. Primeiro porque a infância foi inserida no bojo da DUDH (“Artigo XXV, 2. A maternidade e a infância têm direito a cuidados e assistência especiais. Todas as crianças nascidas dentro ou fora do matrimônio, gozarão da mesma proteção social.”). Segundo porque a generalidade dos termos em que fora redigida a DUDH impunha a consequência de que documentos internacionais posteriores viessem a complementá-la, delineando as garantias dos direitos enunciados, tanto mais eficientes quanto capazes de apreender as especificidades dos distintos grupos merecedores de proteção jurídica em nível mundial.
Foi esse o contexto que engendrou a promulgação de novo documento internacional relativo à proteção da infância: a Declaração dos Direitos da Criança, adotada pela Assembleia das Nações Unidas em 20 de novembro de 1959. Essa nova declaração modifica o paradigma anterior, esposado pela Declaração de Genebra de 1924, ao enunciar um conjunto de princípios protetivos da infância orientados doutrinariamente pelo reconhecimento de que as crianças não mais eram meros objetos, mas verdadeiros credores (e, portanto, sujeitos) desses direitos. Exemplificativamente, eis o que determina o Princípio 1 da Declaração em comento:
Princípio 1
A criança gozará todos os direitos enunciados nesta Declaração. Todas as crianças, absolutamente sem qualquer exceção, serão credoras destes direitos, sem distinção ou discriminação por motivo de  raça, cor, sexo, língua, religião, opinião política ou de outra natureza, origem nacional ou social, riqueza, nascimento ou qualquer outra condição, quer sua ou de sua família.
Do ponto de vista da fixação de garantias que pudessem dotar de coercibilidade as normas assecuratórias dos direitos da infância, o tratado mais importante foi promulgado pela ONU apenas em 1989. Trata-se da Convenção sobre os Direitos da Criança, adotada, no Brasil, por meio do decreto 99.710/90. Nesse tratado voltado à proteção dos direitos humanos infantojuvenis, houve a consolidação da tendência que atribui às crianças a condição de sujeitos de direito merecedores de proteção jurídica integral e prioritária por parte dos Estados integrantes da sociedade internacional. Vejamos um rápido exemplo: 
Artigo 6
1. Os Estados Partes reconhecem que toda criança tem o direito inerente à vida.
2. Os Estados Partes assegurarão ao máximo a sobrevivência e o desenvolvimento da criança.
Por meio da redação acima, a convenção deixa claro que toda criança tem direito à vida. Essa expressão “tem direito” permite ao exegeta compreender o seguinte: as crianças são credoras, perante os Estados, do seu direito à vida. Logo, todo ser humano com menos de dezoito anos de idade (conceito de criança extraído da leitura do art. 1º do tratado) é sujeitodo direito à vida.Esse breve introito do Direito Internacional dos Direitos Humanos serve para demonstrar o cenário histórico em que se encontra o cipoal normativo direcionado à proteção da infância e juventude no Brasil. Tanto a Constituição de 1988 quanto a legislação infraconstitucional – especialmente a Lei 8.069/90 (Estatuto da Criança e do Adolescente) – hão de incorporar o reconhecimento aos infantes da condição de titulares (credores) de direitos. 


TEODORO, Rafael. Interpretação teleológica e superação das hipóteses legais restritivas da adoção conjunta no Estatuto da Criança e do Adolescente. Análise da decisão do STJ no precedente da adoção póstuma entre irmãos. Jus Navigandi, Teresina, ano 17, n. 3390, 12 out. 2012 .

Amor dos pais: direito das crianças e adolescentes

1 Introdução

O presente ensaio problematiza decisão paradigmática do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que defere pretensão de indenização por danos morais pelo abandono afetivo dos pais, mas, assenta no voto vitorioso do relator a inexistência de direito subjetivo das crianças e adolescentes de serem amados por seus pais. Seu objetivo central é apresentar argumentos em prol da superação das posições doutrinárias e jurisprudenciais, que negam o direito de crianças e adolescentes serem amados por seus pais. O trabalho pautou-se no método indutivo, com revisão documental centrada na jurisprudência do STJ, legislação nacional e diplomas internacionais de direitos humanos.

2 Direito ao Amor: da Negação ao Necessário Reconhecimento

Em 24 de abril de 2012, apreciando o Recurso Especial n. 1159242/SP, a terceira turma do Superior Tribunal de Justiça proferiu decisão inédita no âmbito deste tribunal, com grande repercussão no seio jurídico. Reconhecia-se que os filhos abandonados afetivamente pelos pais podem sofrer danos morais e que este ato, ilícito, enseja o dever de indenizar. O tribunal não pode ordenar o retorno do tempo para que o dano não ocorresse, mas, buscou pela valorização in pecunia, compensar a lesão. A decisão, também, tem função pedagógica, ao dissuadir outros pais a não se furtarem dos deveres inerentes à paternidade.
Porém, ao lavrar seu voto, o exmo. Ministro que relatou a decisão adentrou em debate que se estende há anos na doutrina e jurisprudência, e é objeto deste estudo: crianças e adolescentes têm o direito de serem amados por seus pais?

Amor, que na mitologia grega, era representado por Eros, deus do amor e do desejo, está presente em estrofes de poetas, nos versos das canções e serenatas de apaixonados; é segredo divido em diários; representado pela união dos pontos de curvas convexas que formam o coração; foi tema para Platão; objeto para psicanálise; combustível para Che Guevara e tantos revolucionários; e mandamento pregado por Jesus, que ensinou aos futuros cristãos a amar a Deus e ao próximo.
Todos conhecem o amor, mesmo escapando da razão a possibilidade de sua perfeita explicação. Fernando Pessoa, em trecho cuja autoria lhe é atribuída, elucida: “amo como ama o amor. Não conheço nenhuma outra razão para amar senão amar. Que queres que te diga, além de que te amo, se o que quero dizer-te é que te amo?”.
Mas, para doutrina e jurisprudência, o mais nobre dos sentimentos não pode ser exigido, pois não é um direito. Trata-se de um corpo estranho ao universo jurídico, pelo simples argumento de supostamente não estar previsto no ordenamento. Neste sentido, o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro decidiu:
1. Indenização. 2. Dano Moral. 3. Objetivo indenizatório deduzido por filha contra o pai, visando à compensação pela ausência de amor e afeto. 4. Ninguém está obrigado a contemplar quem quer que seja com tais sentimentos. [...] “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”. 7. Pretensão manifestadamente mercantilista, deduzida na esteira da chamada indústria do dano moral. (TJRJ, 4ª Câmara Cível, Rel. Des. Mário dos Santos Paulo, Julgado em 08 set. 2004. apud MACIEL, 2008, p. 104-105) (grifos nossos)
Em trabalho de Holanda e Barros, sobre a responsabilidade pelo descumprimento do dever de assistência imaterial, encontramos que “ninguém é obrigado a amar. Os pais não são obrigados a amar seus filhos [...]. O Ordenamento Jurídico em nenhum momento, ao regular os deveres dos pais, impõe o dever jurídico de amar” (2009, p. 10107). Para as autoras o debate sobre a responsabilização dos pais não deve passar pela ausência de amor ou de afeto, que não constituiriam obrigações jurídicas, mas pelo abandono imaterial, compreendido nos deveres de guarda, criação, educação e convivência familiar.
O Superior Tribunal de Justiça, por sua vez, negara, na apreciação do Recurso Especial n. 757.411/MG e do respectivo Embargo de Declaração, direito à indenização por danos oriundos de abandono afetivo. Interessante notar, que o Ministro relator do referido Recurso, com o zelo de não afastar a remota possibilidade de tardio amor paterno, vota pelo indeferimento da pretensão reparatória. Em suas palavras: “um litígio entre as partes reduziria drasticamente a esperança do filho de se ver acolhido, ainda que tardiamente, pelo amor paterno” (Relatório e Voto, p. 09).
O amor, portanto, não foi compreendido como direito, mas se apresentou como bem a ser estranhamente tutelado. A criança não recebeu amparo no braço de seu genitor, nem tão pouco do STJ, mas, na perspectiva do Ministro, ao negar acolhida pelo Judiciário estar-se-ia protegendo este bem.
Em pesquisa de jurisprudência deste Superior Tribunal, encontramos sessenta e seis acórdãos que se referem ao amor: um trata do amor em decisão sobre protesto de título de crédito; um em ação indenizatória por danos morais pelo fim de relacionamento concubino; seis afirmam existir amor em casos de adoção ou guarda; e, o restante negava amor à formalidade processual, mas exigia a forma prevista em lei. Talvez, o mais significativo deles seja o Recurso Especial n. 889852/RS, que, apreciando pedido de adoção por casal homoafetivo, encontra no amor fundamento para deferir a pretensão.
DIREITO CIVIL. FAMÍLIA. ADOÇÃO DE MENORES POR CASAL HOMOSSEXUAL. SITUAÇÃO JÁ CONSOLIDADA. ESTABILIDADE DA FAMÍLIA. PRESENÇA DE FORTES VÍNCULOS AFETIVOS ENTRE OS MENORES E A REQUERENTE. IMPRESCINDIBILIDADE DA PREVALÊNCIA DOS INTERESSES DOS MENORES. RELATÓRIO DA ASSISTENTE SOCIAL FAVORÁVEL AO PEDIDO. REAIS VANTAGENS PARA OS ADOTANDOS. ARTIGOS 1º DA LEI 12.010/09 E 43 DO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. DEFERIMENTO DA MEDIDA. [...]
9. Se os estudos científicos não sinalizam qualquer prejuízo de qualquer natureza para as crianças, se elas vêm sendo criadas com amor e se cabe ao Estado, ao mesmo tempo, assegurar seus direitos, o deferimento da adoção é medida que se impõe. [...]
13. A adoção, antes de mais nada, representa um ato de amor, desprendimento. [...]
Retornando ao caso que iniciou este artigo, a douta Ministra relatora, em seu voto, buscou afastar da apreciação do Poder Judiciário matéria de natureza intangível e imensurável, o amor. Prendeu-se àquilo que supostamente poderia ser apreciado pelo discurso racional, medido e quantificado, o dever de cuidado.
[...] o cuidado é fundamental para a formação do menor e do adolescente; ganha o debate contornos mais técnicos, pois não se discute mais a mensuração do intangível – o amor – mas, sim, a verificação do cumprimento, descumprimento, ou parcial cumprimento, de uma obrigação legal: cuidar. [...] (Relatório e Voto, p. 08) (grifos do original)
A possibilidade do amor figurar como objeto de uma relação jurídica é vergastada ao afirmar categoricamente que se trata de matéria meta-jurídica, própria de outros campos do saber.
Aqui não se fala ou se discute o amar e, sim, a imposição biológica e legal de cuidar, que é dever jurídico, corolário da liberdade das pessoas de gerarem ou adotarem filhos.
O amor diz respeito à motivação, questão que refoge os lindes legais, situando-se, pela sua subjetividade e impossibilidade de precisa materialização, no universo meta-jurídico da filosofia, da psicologia ou da religião. [...]
Em suma, amar é faculdade, cuidar é dever. [...] (Relatório e Voto, p. 09) (grifos do original)
Data máxima vênia, ousamos discordar dos posicionamentos supramencionados. O Judiciário não pode se furtar de apreciar matérias situadas no campo do “intangível” ou do que não é passível de “mensuração”, para permanecer no confortável campo do que é “mais técnico” [1], sob pena de, no mínimo, violar o direito fundamental de inafastabilidade do Poder Judiciário.
Ainda que o amor não possa ser medido e quantificado, o dano causado à criança ou adolescente pela sua ausência é passível de mensuração e não seria estranho à rotina do Judiciário, que diuturnamente aprecia pedidos de reparação por danos morais à imagem, honra, nome e demais direitos da personalidade.
Outrossim, a suposta ausência de normatização não pode ser argumento suficiente para negar o “amor” como direito subjetivo titularizado por crianças e adolescentes. A lei não é a única fonte do direito, isto já está claro desde a Lei de Introdução ao Código Civil[2], e inúmeros trabalhos têm abordado a pluralidade de direitos que coexistem na sociedade, ou da força das necessidades como produtora de novos direitos (WOLKMER, 2004). Não há dúvidas que o amor é uma necessidade de todos, principalmente para o infante.
Resta, em remate, afastar a impropriedade de que o amor não é um direito, por, supostamente, não estar previsto no ordenamento jurídico como “lei”, pois ele já se encontra devidamente positivado.
A lei n. 12.318/10, que dispõe sobre a alienação parental, conceitua-a como interferência na formação psicológica de crianças e adolescentes que causa prejuízo à manutenção de vínculos com o genitor[3]. “Vínculos”, no plural, pode envolver as relações de paternidade e relativas ao poder familiar, mas, nos parece que especialmente se refere aos vínculos amorosos e afetivos estabelecidos entre pais e filhos. No mesmo sentido, Maria Berenice Dias (201?, p. 02) descreve a consequência da alienação parental como a ruína do vínculo amoroso: “a criança, que ama o seu genitor, é levada a afastar-se dele, que também a ama. Isso gera contradição de sentimentos e destruição do vínculo entre ambos”. Não restam dúvidas, portanto, que o amor no seio das relações familiares foi definitivamente reconhecido como bem jurídico a ser devida e legitimamente tutelado.
Mas, muito antes disso, a Declaração Universal dos Direitos da Criança, adotada pela Assembléia da Organização das Nações Unidas (ONU) em 20 de novembro de 1959 já era clara a este respeito, ao declarar – e não instituir – entre os seus princípios, que toda criança tem direito de ser amada pela família e sociedade.
Também, a Convenção Sobre Direitos da Criança adotada pela Assembléia Geral da ONU em 20 de novembro de 1989, aprovada pelo Decreto Legislativo n. 28, de 14 de setembro de 1990 e promulgada pelo decreto presidencial n. 99.710, de 21 de novembro de 1990, reconhece que a criança “deve crescer em um ambiente familiar, em clima de felicidade, amor e compreensão”.
Como outros direitos expressos em tratados internacionais de direitos humanos são material e formalmente fundamentais, mormente interpretação conduzida pela doutrina especializada acerca da cláusula aberta de direitos fundamentais prevista no art. 5º, §2º da Constituição Federal (PIOVESAN, 2008). Em que pese não ser este o entendimento adotado pelo Supremo Tribunal Federal, não restam mais dúvidas que os tratados internacionais de direitos humanos ingressam na ordem jurídica interna com posição hierárquica destacada, alojando-se acima das legislações ordinárias e complementares, quando não aprovados pelo procedimento previsto no art. 5º, §3º, hipótese que equivalerão às emendas constitucionais.

3 Conclusão

O amor, tema que esteve presente na sociedade deste o sistema mítico de explicação da realidade e se mantém insuperável na atualidade, tem sido fustigado pela doutrina jurídica e jurisprudência, que lhe afasta da condição de direito subjetivo. Crianças e adolescentes, carentes do amor paternal, encontram barreira no judiciário sempre que buscavam reparação em face do pai ou mãe, sobre fundamento de que, se não é um direito expressamente reconhecido pelo ordenamento jurídico, não haveria um correlato dever jurídico a se atribuir aos pais. Consequentemente, não se configura ato ilícito passível de reparação. Da análise da doutrina e dos votos de Ministros do STJ encontramos, ainda, posicionamentos acerca da intangibilidade do amor, que o tornaria imensurável e, portanto, impossível de ser apreciado pela técnica jurídica.
Em sentido contrário, pudemos demonstrar que intangibilidade, bens imensuráveis e incertezas técnicas não são questões estranhas ao ordenamento jurídico brasileiro, assim como os “direitos” não são apenas aqueles previstos em lei, mas que existem diversos direitos sendo afirmados pela sociedade, em especial, aqueles oriundos da necessidade humana; também, apresentamos a previsão do amor como um bem jurídico e direito humano de crianças e adolescentes na legislação pátria e em tratados internacionais de direitos humanos, que integram a ordem jurídica brasileira.
Diante disto, sem negar os avanços oriundos do Recurso Especial n. 1159242/SP, que reconheceu a ilicitude da conduta de pai ausente que abandonou afetivamente filho, provocando-lhe dano moral, cremos ser hora da doutrina e jurisprudência alterarem posição acerca do direito subjetivo de crianças e adolescente serem amados por seus pais.
Esta conclusão pode ser alcançada pela técnica – com o estudo do sistema internacional de direitos humanos, da interpretação da legislação pátria e da compreensão do direito como um fenômeno que se cria e reproduz constantemente pela sociedade – ou, simplesmente, pelos caminhos do coração.

HEIM, Bruno Barbosa. Amor dos pais: direito das crianças e adolescentes. Jus Navigandi, Teresina, ano 17, n. 3390, 12 out. 2012 . Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/22789>.