sexta-feira, 10 de fevereiro de 2012

CDC se aplica em ação de indenização por acidente aéreo

A 4ª Turma do STJ definiu, nesta terça-feira (7/2), que o prazo de prescrição aplicável a pedidos de indenização por danos morais referentes a acidentes aéreos tem de ser regido pelo Código de Defesa do Consumidor, e não pelo Código Brasileiro de Aeronáutica. Ou seja, as ações prescrevem em cinco anos, não em dois.

O processo julgado nesta terça se referia a um pedido de indenização por danos morais em razão da queda da aeronave Fokker100 da TAM, voo 402, em 1996. A aeronave caiu 24 segundos após a decolagem do Aeroporto de Congonhas em 31 de outubro daquele ano. Além da morte dos passageiros do voo, três residentes da área também perderam a vida e houve graves danos em vias públicas e moradias no bairro do Jabaquara, na região sul da capital paulista.

A ação julgada foi ajuizada em 2003, porém o relator do processo, ministro Luis Felipe Salomão, lembrou, a título de referência, que tramitam, no STJ, 20 outras ações de indenização por danos morais representadas por um mesmo advogado, em nome de diversos moradores da vizinhança atingida pela tragédia de 1996. Tanto para o caso julgado, quanto para os demais processos, citados apenas em caráter de “informação lateral”, a questão considerada foi o porquê da demora em entrar com ações indenizatórias e qual o prazo prescricional deve ser aplicado (clique aqui para ler o voto do relator)

O limite de tempo para entrar com indenização por dano moral já estava prescrito com base em ambos os códigos, porém é o Código de Defesa do Consumidor (CDC) que deve disciplinar a ocorrência de prescrição envolvendo acidentes do tipo, decidiram, de forma unânime, os ministros da 4ª Turma. A prevalência do CDC se dá, sobretudo, por conta da formulação do Código Brasileiro de Aeronáutica ser anterior à Constituição de 1988.

Consequentemente, em razão de muitas de suas normas não acompanharem atualizações relacionadas às garantias dos consumidores previstas pelo Código Civil, o CBA assume o caráter de “legislação esparsa”, deixando de concorrer com o CDC em questões análogas.

Para tanto, nesse caso, mesmo moradores que se sentiram moralmente prejudicados com a ocorrência do acidente devem ser considerados consumidores ainda que estejam fora da relação direta de negócio estabelecida entre a companhia aérea e os passageiros. Os requerentes de indenização figuram, assim, como “consumidores por equiparação”. Embora estejam originalmente alheios à “relação consumerista direta”, as partes reclamantes também estão envolvidas em um acidente de consumo ocorrido entre terceiros.

O prazo de prescrição para solicitações de indenização por dano moral em caso de acidentes de consumo, de acordo com o Código de Defesa do Consumidor é de cinco anos. Em acidentes aéreos, com base no Código Brasileiro de Aeronáutica, é de dois anos.

REsp 1.281.090-SP
Clique aqui para ler o voto do relator, ministro Luis Felipe Salomão.


Rafael Baliardo é repórter da revista Consultor Jurídico em Brasília.
Revista Consultor Jurídico

Efeitos não patrimoniais da ausência: dissolução do casamento


Destas situações que a legislação anterior esquivou-se, encontra-se a questão do cônjuge do ausente. Percebeu-se, portanto, que o código de 1916 mantinha o mesmo em uma situação de "prisão" conjugal de forma a manter os impedimentos legais para contrair novo casamento, visto considerar a ausência como uma incapacidade e não reconhecer o divórcio, ainda não permitindo o status de viuvez, enquanto não fosse aberta a sucessão definitiva e a declaração da morte presumida, cabendo ainda preferencialmente ao supérstite a administração dos bens durante todas as fases da ausência (curadoria dos bens do ausente, sucessão provisória e definitiva). Em outras palavras, o código anterior apenas levava em consideração o patrimônio como tutela exclusiva do procedimento de ausência.

Não obstante, existiram algumas tentativas legislativas para positivar outras situações não patrimoniais antes da atual conjectura. Neste sentido, de acordo com Pereira (2009, p.192) o projeto do Código Civil de 1965 (Comissão revisora composta por Orozimbo Nonato, Orlando Gomes, Caio Mário) levantou o impedimento matrimonial, mas previa a nulidade do segundo matrimônio se reaparecesse o ausente, sendo portanto insuficiente.

Outrossim, com as mudanças sociais e desenvolvimento histórico do Divórcio (iniciado a partir da Lei 6.515 de 1977, absorvendo hoje a recentíssima Emenda Constitucional nº 66 de 2010, Art. 226, § 6º, da Constituição Federal de 1988) e a já prevista dissolução do matrimônio pelo fim real da pessoa natural, não poderia permanecer a legislação indiferente sobre o status indefinido que permanecia o cônjuge de ausente. Observa-se aqui uma situação que fere garantias individuais, a luz da atual Constituição, e a própria segurança jurídica, justamente por não ser salutar qualquer indefinição por tempo indeterminado, salvo se a pessoa abrisse mão de seus direitos sucessórios recorrendo ao divórcio a partir de 1977, caminho este não permitido na vigência do Código de 1916.

Apenas a partir do novo Código Civil passou ser possível a dissolução do matrimônio pela morte presumida.

A simples ausência da pessoa, ainda que prolongada, não tem, por si só, repercussão jurídica. O desaparecimento da pessoa sem notícia, não tendo deixado representante ou procurador, por outro lado, autoriza a declaração judicial de ausência, com nomeação de curador (Art. 22 do atual código). O decurso de tempo de ausência mais ou menos longo induzirá a possibilidade de morte da pessoa. Em matéria de direito patrimonial o simples desaparecimento ou ausência decretada não rompe o vínculo do casamento, o que ocorrerá somente pelo divórcio ou com a certeza ou reconhecimento presumido da morte (VENOSA, 2008, p.154).

Oportuniza-se, então, ao cônjuge sobrevivente o direito de escolha entre divorcia-se, abrindo mão de seus direitos sucessórios para contrair novo casamento sem impedimentos legais, ou esperar a decretação da morte presumida, com declaração de ausência ou não, permanecendo-se sucessora legítima do "de cujus", podendo contrair novo matrimônio sem impedimentos legais, atendendo somente certas exigências suspensivas (Art. 1.523, NCC).
... o novo Código Civil altera esta situação, decretando, no art. 1.571, § 1º, a dissolução do casamento pela ausência do outro cônjuge em decisão judicial transitada em julgado. Pode agora, o cônjuge do ausente, optar entre pedir o divórcio para se casar novamente ou esperar pela presunção de morte, que se dá com a conversão da sucessão provisória em definitiva. O divórcio, embora mais rápido, tem a desvantagem de fazer o cônjuge perder o direito à sucessão. Com efeito, sendo o cônjuge herdeiro ainda que haja descendentes ou ascendentes do de cujus (ou, no caso, do ausente), nos termos do art. 1.829 do novo Código, precisará, não obstante, conservar a posição de cônjuge até a conversão da sucessão provisória em definitiva, quando, só então, haverá realmente a vocação hereditária. Se se divorciar antes, embora tendo a vantagem de poder se casar novamente desde logo, terá a desvantagem de perder a capacidade sucessória do ausente (NETO, 2004, p.1).
Posiciona-se Gagliano e Filho (2010, p.176): "talvez a principal destas inovações seja a possibilidade de dissolução do matrimônio a partir da declaração do estado de ausência do cônjuge". Ademais, os mesmos autores destacam:
Esta forma de extinção não existia na codificação anterior, e restou bem observada pelo inteligente professor e amigo CRISTIANO FARIAS: "A grande novidade da Codificação quanto à disciplina jurídica do ausente é o reconhecimento de efeitos pessoais decorrentes da ausência, ao lado da tradicional proteção patrimonial"... Em nosso sentir, o reconhecimento da dissolução do vínculo por essa forma somente se dará após a abertura da sucessão definitiva do ausente, por força da última parte do supratranscrito § 1º, que faz referência à "presunção estabelecida por este Código para o ausente".
Outra inovação infere-se do fato de a codificação atual permitir que a morte presumida seja declarada antes mesmo de aberta a sucessão definitiva do procedimento da ausência em casos especiais, permitindo que certos efeitos entrem em vigor com a certeza ou extrema probabilidade do não retorno do ausente, como bem explica Maria Berenice Dias (2007, p.273):
Não só a morte efetiva, mas também a morte presumida (CC 6º e 7º) e a Declaração de Ausência (CC 22 a 39) dissolvem o casamento. A declaração de morte presumida sem a decretação de ausência pode ocorrer em duas hipóteses: quando for extremamente provável a morte de quem estava em perigo de vida ou, no caso do desaparecimento em campanha ou feito prisioneiro, não for encontrado até dois anos após o término da guerra. Assim, depois de esgotadas buscas e averiguações, é possível a declaração da morte presumida, devendo a sentença fixar a data provável do falecimento (CC 7º, parágrafo único). Obtida tal manifestação, é permito ao "viúvo presumido" casar.
Para Venosa (2008, p.156), embora aparente estar resolvida a questão da dissolução do matrimônio pela ausência, a legislação brasileira ainda não se preocupou com a hipótese do regresso do morto que encontra seu cônjuge casado com terceiro, destacando que isso deverá ocorrer cedo ou tarde. Ademais, o mesmo autor aponta que no direito argentino já se encontra positivado que o segundo matrimônio, desfeito o primeiro, deve prevalecer, "tanto mais quanto é possível que a novo matrimônio haja gerado filhos, que, de plano, ver-se-ão em dolorosa situação de ver destruído seu lar" (VENOSA apud GUILLERMO BORDA, 2008, p.155).

Por outro lado, Maria Berenice Dias aponta a solução "em face do silêncio da lei", em favor da prevalência do presente matrimônio, embora seja objeto de divergência doutrinária:
Em face do silêncio da lei, tem-se questionada o que ocorrer se o desaparecido aparece. A doutrina diverge mas, afirmando a lei que a morte presumida do ausente dissolve o vínculo matrimonial (CC 1.571, § 1º), não há que falar em bigamia. O novo casamento do cônjuge do ausente não poderá ser tido por inexistente, ou nulo, pois em matéria de casamento, não há nulidade sem previsão legal (DIAS, 2007, p.274).



RAMOS, Luiz Gustavo de Oliveira. Efeitos não patrimoniais da ausência. Jus Navigandi, Teresina, ano 17, n. 3144, 9 fev. 2012. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/21052/efeitos-nao-patrimoniais-da-ausencia>

A ausência

Gagliano e Filho (2010, p.172) bem definiram a ausência como "antes de tudo, um estado de fato, em que uma pessoa desaparece de seu domicílio, sem deixar qualquer notícia", prevalecendo desde a legislação de 1916 o interesse em proteger o patrimônio do ausente, através de um curador, visando, inclusive, a possibilidade daquele retornar, estabelecendo meios de evitar a ruína (podendo, por exemplo, a ordem de um juiz hipotecar imóveis, Art. 31 do NCC) e procedimentos certos em caso do efetivo retorno, tal como medidas para a máxima preservação dos bens, seja em qualquer fase até a transmissão definitiva destes.

Visando a não permitir que este patrimônio fique sem titular, o legislador traçou o procedimento de transmissão desses bens (em virtude da ausência) nos arts.463 a 484 do CC-16 (correspondente aos arts. 22 a 39 do novo CC), previsto ainda pelos arts. 1159 a 1169 do vigente Código de Processo Civil brasileiro (GAGLIANO e FILHO, 2010, p.172).

Destaca-se, portanto, como um instituto com bases jurídicas e procedimentos bem delineados no tocante ao patrimônio do ausente, porém se esquivou o código anterior em tecer normas externas a esta situação, por serem complexas e múltiplas as consequências jurídicas advindas do desaparecimento de uma pessoa, especialmente para a sociedade à época. Para tanto, a legislação pretérita incorreu em uma atecnia, no entender de Gagliano e Filho (2010, p.172), por considerar o ausente como absolutamente incapaz de exercer pessoalmente os atos da vida civil com previsão no código de 1916 em seu art. 5º, IV, e por ato declaratório de juiz.

Tratava-se, sem sombra de dúvidas, de um terrível equívoco conceitual, pois, na verdade, o que se buscava tutelar era o patrimônio do desaparecido, disciplinando, gradativamente, sua sucessão, sempre com a cautela da possibilidade de retorno. Não havia, portanto, incapacidade por ausência, mas sim uma premência em proteger os interesses do ausente, devido à sua impossibilidade material de cuidar de seus bens e interesses e à incompatibilidade jurídica de conciliar o abandono do domicílio com a conservação de direitos (GAGLIANO e FILHO, 2010, p.172).

Assim, como bem revela Pereira (2009, p.191), a aplicação prática demonstrou que o instituto da ausência, como consagrado naquele código, revelou-se insuficiente para atender a numerosas ocorrências e equacionar problemas de difícil solução.

RAMOS, Luiz Gustavo de Oliveira. Efeitos não patrimoniais da ausência. Jus Navigandi, Teresina, ano 17, n. 3144, 9 fev. 2012. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/21052/efeitos-nao-patrimoniais-da-ausencia>

Princípio da insignificância não se aplica a crimes ambientais

O desmatamento em área de preservação permanente, por menor que seja, ocasiona não apenas a perda das árvores abatidas, mas outros importantes danos ambientais associados. Portanto, não é possível aplicar a esse crime o princípio da insignificância.

O entendimento é da 4ª Câmara Criminal do TJRS, que confirmou condenação de Cláudio Luiz Alves de Brum. Ele estava fazendo uso de uma motosserra, sem licença ou registro do órgão competente, e havia - em 21 de agosto de 2007 - cortado três metros cúbicos de madeira de árvores nativas (angico, canela e guajuvira) da margem do Rio Vacacaí, no interior do  Município de Santa Maria (RS).

Próximo ao local, no Balneário Passo do Verde, encostado na barranca, um barco pertencente ao denunciado estava sendo utilizado para transportar os pedaços de madeira que seriam transformados em lenha, sem autorização dos órgãos competentes.

Brum foi condenado a um ano e quatro meses de detenção, em regime aberto, e 10 dias-multa à razão de 1/30 do salário-mínimo vigente à época do fato. A pena privativa de liberdade foi substituída por prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária.

No primeiro grau, o juiz Leandro Augusto Sassi considerou o acusado culpado pelo crime previsto no artigo 39 da Lei nº 9.605/98 (Código Florestal): "cortar árvores em floresta considerada de preservação permanente, sem permissão da autoridade competente".

Brum foi absolvido da outra acusação do MP: comercializar motoserra ou utilizá-la em florestas e nas demais formas de vegetação, sem licença ou registro da autoridade competente (artigo 51 da mesma lei).

O réu recorreu da sentença, defendendo insuficiência de provas. Também alegou que deve ser aplicado o princípio da insignificância, que diz respeito a ações cujos prejuízos não são considerados importantes, seja ao titular do bem jurídico tutelado, seja à integridade da própria ordem social.

O desembargador Constantino Lisbôa de Azevedo, relator do recurso, salientou que a ocorrência do crime e a culpa do réu estão devidamente comprovadas por documentos, depoimentos dos policiais e fotografias.
Quanto ao princípio da insignificância, salientou que a Câmara entende pela "impossibilidade de aplicação desse princípio aos crimes ambientais, por considerar que o dano ao meio ambiente é cumulativo e afeta, inclusive, as gerações futuras". (Proc. nº 70046425161 - com informações do TJRS e da redação do Espaço Vital).