sábado, 3 de março de 2012

Dados Abertos Governamentais: uma nova perspectiva democrática na era da Internet

Em seu artigo 37, a Constituição Brasileira dispõe dos princípios que regem a administração pública direta e indireta, dentre os quais se inclui o Princípio da Publicidade. Este princípio administrativo, cujo significado e importância muitas vezes passa despercebido, possui um papel fundamental na transparência da gestão pública: garantir que o povo tenha conhecimento do que os seus administradores estão fazendo. Esta é uma prerrogativa óbvia: só é possível aos cidadãos fiscalizarem seus governantes através do acesso pleno às informações sobre sua conduta e de como vêm empregando os recursos públicos. Esta vigilância e cobrança por parte da população, inclusive, reforça a aplicação do Princípio da Eficiência, que objetiva um emprego otimizado e satisfatório dos recursos públicos.
A crescente informatização das atividades administrativas ocorrida nas últimas décadas trouxe consigo novas perspectivas para um emprego mais efetivo do Princípio da Publicidade. Dados relativos às mais variadas atividades públicas estão agora em formato digital, e salvo casos em que se necessite preservar informações de privacidade e segurança, eles podem ser liberados a um amplo público através da Internet. Entretanto, o que se observa na prática é uma mentalidade de não liberação de dados de interesse da sociedade ou, na melhor das hipóteses, uma publicação de dados pré-processados (documentos com visualizações parciais extraídas a partir dos dados brutos, onde muitas informações potenciais acabam sendo perdidas).
Neste contexto, cidadãos e organizações ao redor do mundo vêm se articulando no debate sobre Dados Abertos Governamentais - informações públicas livres para qualquer pessoa acessar, analisar e reutilizar, com qualquer finalidade. A efetiva publicação e disseminação destes dados pelo governo pode representar um grande avanço no processo democrático, aumentando a transparência na gestão pública e permitindo que a população participe ativamente da interação governo-sociedade.
Entretanto, mais do que disponibilizar informações, é preciso garantir que elas sejam distribuídas sem restrições de uso e em formato bruto e aberto, sendo passíveis de serem analisadas, processadas e reutilizadas em aplicações digitais desenvolvidas pela sociedade ou pelo próprio governo. Para garantir o acesso a informações em um formato aberto e aproveitável, o grupo de trabalho americano Open Government Data[1] elaborou uma listagem dos oito princípios que devem ser respeitados para que dados governamentais possam ser considerados abertos:
1. Completos: precisam estar disponíveis, sem restrições de privacidade, segurança ou controle de acesso;
2. Primários: devem ser apresentados como foram coletados na fonte, em seu estado bruto, sem modificações;
3. Atuais: quanto mais recentes os dados, maior o seu valor;
4. Acessíveis: sua disponibilização deve ser realizada de forma a alcançar o maior número de pessoas e atender aos mais diversos interesses;
5. Compreensíveis por máquinas: devem possuir alguma estrutura padronizada para que possam ser processados de forma automatizada;
6. Não discriminatórios: é necessário que estejam disponíveis para qualquer cidadão, sem a necessidade de requerimento ou cadastro;
7. Não proprietários: não podem estar sobre o controle de uma entidade ou organização;
8. Livres de licenças: não devem estar sujeitos a restrições de direitos autorais, patentes ou outros registros.

3. Iniciativas

Atentos à possibilidade de melhorar a efetividade e eficiência dos seus serviços - além da inerente redução de custos -, governos de vários países vêm promovendo iniciativas para abrir suas informações públicas. Dentre eles destacam-se o governo americano - que em seu portal[2] já liberou mais de 390 mil conjuntos de dados - e o governo britânico, com seus mais de 8000 conjuntos de dados disponibilizados na Internet[3].
No Brasil, muito da discussão relacionada à abertura de dados governamentais surgiu com o grupo Transparência Hacker[4], formado em 2009 por membros da sociedade civil, com o objetivo de participar ativamente no desenvolvimento de soluções baseadas em dados públicos abertos. Através do desenvolvimento de aplicativos como o Deputados Analytics[5], que agrega estatísticas extraídas do site do Congresso Nacional, o grupo vem ganhando visibilidade e estimulando o surgimento de iniciativas do próprio governo.
Dentre os projetos apoiados pelo governo brasileiro, destaca-se o portal liderado pela Secretaria de Logística e Tecnologia da Informação do Ministério do Planejamento[6], que agrega   dados criados ou mantidos pela administração pública e o Grupo de Trabalho da Infraestrutura Nacional de Dados Abertos - GT INDA[7], que elabora um conjunto de padrões e mantém um catálogo de dados do governo, através dos princípios dos dados abertos.

4. Conclusão

Apesar dos grandes avanços obtidos através de iniciativas da sociedade e do governo, as discussões sobre Dados Abertos Governamentais ainda estão no início, e muitas questões técnicas e legais ainda precisam ser debatidas. Neste aspecto, a recém-sancionada lei nº 12.527/2011, a Lei de Acesso a Informação Pública, representa um marco na política brasileira de abertura e disseminação de dados.
Algumas diretrizes desta lei - como o preceito geral da publicidade e a divulgação de informações de interesse público através de meios de comunicação eletrônicos, independentemente de solicitações - favorecem o debate relativo aos dados abertos e ao direito fundamental de acesso à informação. Esta e outras iniciativas legais estimulam uma maior participação da sociedade na administração pública e demonstram o compromisso do governo brasileiro na busca de uma gestão mais transparente e uma democracia mais efetiva.

ALMEIDA, Rafael José de Alencar. Dados Abertos Governamentais: uma nova perspectiva democrática na era da Internet. Jus Navigandi, Teresina, ano 17, n. 3165, 1 mar. 2012. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/21196/dados-abertos-governamentais-uma-nova-perspectiva-democratica-na-era-da-internet>

A contribuição do incentivo financeiro ICMS ecológico para o melhoramento da política ambiental do Estado do Maranhão

O Poder Público, ao elaborar normas para a distribuição de recursos públicos, deve fazê-lo de forma a compatibilizar a destinação das receitas públicas com as prioridades sociais, haja vista o entendimento comezinho de que as necessidades da população são infinitamente maiores que os recursos financeiros à disposição do Estado.

Não adentrando no mérito da eleição das susomencionadas prioridades sociais, e entendendo ser o meio ambiente ecologicamente equilibrado princípio constitucional de destaque e um patrimônio público a ser necessariamente assegurado e protegido, tendo em vista o uso coletivo, busca-se neste texto transcrever algumas linhas acerca da possibilidade da criação, no Maranhão, do repasse intitulado ICMS ecológico, com vistas ao aprimoramento da política de proteção ambiental no Estado, pois não é conveniente que o Estado distribua recursos públicos, sem que esta não contemple alguma finalidade pública.

No que concerne ao imposto sobre a circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação - ICMS, a Constituição Federal, em seu art. 155, II, dispõe que a sua instituição compete aos Estados, e já no art. 157, IV prevê hipótese de distribuição dessa receita tributária aos Municípios, senão vejamos:
IV - vinte e cinco por cento do produto da arrecadação do imposto do Estado sobre operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação.
Parágrafo único. As parcelas de receita pertencentes aos Municípios, mencionadas no inciso IV, serão creditadas conforme os seguintes critérios:
I - três quartos, no mínimo, na proporção do valor adicionado nas operações relativas à circulação de mercadorias e nas prestações de serviços, realizadas em seus territórios;
II - até um quarto, de acordo com o que dispuser lei estadual ou, no caso dos Territórios, lei federal.

Pela interpretação literal do dispositivo constitucional, resta claro que dos 25% (vinte e cinco por cento) devidos aos Municípios em função do produto da arrecadação do ICMS, 75%, no mínimo, devem ser repassados aos referidos entes federados, na proporção dos valores adicionados nas operações relativas à circulação de mercadorias e nas prestações de serviços, realizadas em seus territórios.

A divisão dos mencionados 75% é regulamentada pela Lei Complementar nº 63, de 11 de Janeiro de 1990, a qual prevê, inclusive, o momento da transferência das receitas pelo Estado aos Municípios.

No caso do restante, ou seja, dos 25% (1/4) estabelecidos pela Constituição Federal, a divisão será feita conforme Lei Estadual ou, em Lei Federal, no caso dos Territórios.

Pela Constituição Federal, o repasse dessas verbas é obrigatório e enseja até mesmo a possibilidade de intervenção da União no ente federado estadual que vier a descumpri-lo (art. 34, b da CF).

No Estado do Maranhão, a norma regulamentadora do repasse é a Lei Estadual nº 5.599 de 24 de dezembro de 1992 que, ao dispor sobre a distribuição dos 25% restantes elenca, em seu art. 1º, o seguinte:
Art. 1º [...]
II. 25% (vinte e cinco por cento), da seguinte forma:
 a) 15% (quinze por cento), linearmente, em quotas iguais para todos os Municípios;
b) 5% (cinco por cento), na proporção da população do Município em relação a do Estado;
c) 5% (cinco por cento), na proporção da área territorial do Município relativamente à do Estado;
Veja-se que a distribuição das receitas de ICMS, de que trata o inciso II do parágrafo único do art. 157 da Constituição Federal, pelo Estado do Maranhão aos Municípios apresenta critério que não proporciona uma destinação que leve em consideração o atendimento das necessidades públicas prioritárias, pois como se verifica, 15% dessa verba são divididos em partes iguais para todos os entes federados municipais e os outros 10% na proporção entre população e área territorial em relação ao Estado.

Nesse passo, entendendo que tal divisão é inútil à satisfação das necessidades sociais e sendo a defesa do meio ambiente uma missão constitucional a ser seguida pelo Poder Público e por toda a coletividade para garantir a sobrevivência digna das presentes e futuras gerações, entende-se razoável que o critério de distribuição do ICMS aos Municípios leve em consideração a condicionante da proteção ao meio ambiente, ocasião em que se faz surgir a figura do ICMS ecológico, também conhecido como ICMS verde ou ambiental.

O ICMS ecológico, compondo-se como uma forma de repasse de parte do ICMS recolhido pelo Estado aos Municípios já foi instituído nos Estados brasileiros do Acre, São Paulo, Rio de Janeiro, Mato Grosso, Rondônia, Piauí, Ceará, Pernambuco, Amapá, Tocantins, Rio Grande do Sul, Minas Gerais e Mato Grosso do Sul[i], com a finalidade de fomentar a prática constante da preservação ambiental nos municípios.

AMARAL (p. 202, 2007), ao citar vagamente o citado incentivo financeiro, resume algumas legislações estaduais sobre ICMS ambiental e suas formas de distribuição, senão vejamos:

A LC 59/91 do Estado do Paraná concede 5% da receita do produto da arrecadação do ICMS aos seus municípios que abriguem em seu território mananciais de abastecimento público e unidades de conservação diretamente influenciadas por elas.
A LC 8.510/93 do Estado de São Paulo destina 0,5% do produto de sua arrecadação com o ICMS aos seus municípios que possuem unidades de conservação criadas e sob responsabilidade do Estado.
A LC 12.040/95 do Estado de Minas Gerais, conhecida como Lei Robin Hood, distribui de parcela de sua receita do produto da arrecadação do ICMS aos seus municípios que se enquadrarem nos critérios fixados, por exemplo, municípios que detém tratamento de lixo e esgoto sanitário que atendam, no mínimo, respectivamente, 70% e a 50% da sua população ou que possuam unidades de conservação estaduais, federais e particulares, bem como as unidades municipais que venham a ser cadastradas ou aos que tenham patrimônio cultural, entre outros.
A LC 147/96 de Rondônia distribui 5% da receita de seu ICMS aos seus municípios que desenvolvam melhorias ambientais.

Como se vê, o ICMS ecológico é um verdadeiro instrumento de política ambiental que o Poder Público Estadual dispõe para fomentar a preservação do meio ambiente nos Municípios, com o intuito de promover a melhoria da qualidade de vida dos habitantes da municipalidade.

Tal sistema de repasse é não mais que uma forma diferente de distribuição da arrecadação de um tributo já existente, no caso o ICMS, não representando nova forma de exação tributária, haja vista ser o mesmo oriundo dos recursos já existentes em função da arrecadação do ICMS, tendo natureza jurídica compatível com as normas de direito financeiro.

No Maranhão, essa iniciativa ainda não é uma realidade, mesmo sabendo-se que a Lei n° 6.938/1981, que trata da Política Nacional de Meio Ambiente, eleva, em seu art. 2º I, a ação governamental na manutenção do equilíbrio ecológico como princípio a ser seguido pelo Poder Público.

Com base nessas considerações, entende-se perfeitamente viável ao Estado, mediante consideração do critério ambiental no momento de calcular a participação de cada um dos municípios na repartição dos valores arrecadados, implantar o ICMS ecológico, fazendo com que parte dos 25% (1/4) seja revertido aos Municípios que trabalharem em políticas de incentivo à preservação ambiental.

Dessa forma, o ICMS ecológico, além de ter uma finalidade pública de grande relevância, certamente servirá como instrumento de grande estímulo à preservação ambiental, pois o ente municipal ao sentir-se recompensado por conta da preservação do meio ambiente dará mais importância a iniciativas que promovam o bem-estar ambiental, já que, neste caso, a cidade ganha por conservar a natureza.


MOYSES, Miguel Antonio Figueiredo. A contribuição do incentivo financeiro ICMS ecológico para o melhoramento da política ambiental do Estado do Maranhão. Jus Navigandi, Teresina, ano 17, n. 3165, 1 mar. 2012. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/21191/a-contribuicao-do-incentivo-financeiro-icms-ecologico-para-o-melhoramento-da-politica-ambiental-do-estado-do-maranhao>.

Ministério Público é contra venda de bebida alcoólica nos estádios

A Comissão Permanente de Adoção de Medidas de Prevenção de Combate à Violência nos Estádios de Futebol, do Conselho Nacional de Procuradores-Gerais (CNPG) - na qual o Ministério Público de Santa Catarina (MPSC) é representado pelo coordenador do Centro de Apoio Operacional do Consumidor, Promotor de Justiça Marcelo de Tarso Zanellato -, divulgou nota pela manutenção da restrição da venda e do consumo de bebidas alcoólicas nos estádios de futebol durante a Copa do Mundo, que será realizada no Brasil em 2014.

De acordo com a nota, as medidas implementadas de restrição ao consumo de bebidas alcoólicas resultaram em significativa redução da violência no interior e nos arredores dos estádios. No entanto, esse resultado estaria ameaçado com a flexibilização da legislação. É com perplexidade que o Ministério Público tem acompanhado as discussões atualmente promovidas no Congresso Nacional, priorizando-se a visão econômica, em detrimento da segurança, dando como certa a abolição das medidas restritivas ao consumo de bebidas alcoólicas, desprezando e aniquilando as conquistas e resultados alcançados, escreveram os representantes do Ministério Público dos Estados e da União no documento, alertando, ainda, que a eventual liberação da venda de bebida alcoólica apenas nos eventos da FIFA afrontaria o princípio da isonomia, o que revelaria uma postura discriminatória em desfavor do torcedor brasileiro.

A preocupação do Ministério Público foi levada ao Governo Federal, à Câmara dos Deputados e ao Senado na última terça-feira (28/02), em Brasília. O Presidente do CNPG, Cláudio Lopes, e 20 Procuradores e Promotores de Justiça de diversos Estados estiveram em reunião com o Chefe de Gabinete da Casa Civil, Carlos Carboni, e o Subchefe para Assuntos Jurídicos da Casa Civil, Ivo da Motta Azevedo Corrêa, para discutir as alterações provocadas no Estatuto do Torcedor com a eventual aprovação do relatório da Lei Geral da Copa do Mundo de 2014.

Os Procuradores e Promotores de Justiça também conversaram com diversos Parlamentares da Comissão Especial na Câmara criada para examinar a Lei Geral da Copa e entregaram a nota, com as estatísticas que mostram a redução da violência nos estádios onde a venda de bebidas alcoólicas foi abolida. Depois de passarem pela Câmara, os Membros do Ministério Público foram até o Senado, onde também entregaram cópia do documento a Senadores.

Fonte: Ministério Público de Santa Catarina
JUSBRASIL