terça-feira, 17 de abril de 2012

Adoções que superaram preconceitos

Vanessa queria ser mãe, mas o sonho lhe pareceu impossível quando ela e o marido Leonardo descobriram que não podiam ter filhos. A descoberta, entretanto, não desanimou o casal que passou a ver na adoção uma forma de consolidar o desejo de aumentar a família. Um aspecto, entretanto, chama a atenção na história do casal. Diferente da grande maioria, ambos não buscaram no filho a ser adotado algum tipo de semelhança física. Eles -brancos e de olhos claros -escolheram três crianças negras e com idades mais elevadas. Oito anos após a decisão, a conclusão deles é: "Nós é que fomos adotados", revelam emocionados.

A experiência de Vanessa e Leonardo é uma exceção já que mitos e preconceitos ainda permeiam a escolha de muitos pretendentes, o que acaba por atravancar a adoção. Segundo dados do Cadastro Nacional de Adoção (CNA), gerido pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), o número de interessados em adotar é quase cinco vezes maior que o de crianças e adolescentes disponíveis. Pelo levantamento feito no último dia 12 de abril, há 5.163 crianças e adolescentes disponíveis para a adoção em todo o Brasil enquanto há 27.813 pretendentes.

O juiz auxiliar da Corregedoria Nacional de Justiça Nicolau Lupianhes, coordenador do Cadastro Nacional de Adoção, explica que o número de interessados é maior justamente por causa do perfil exigido. "Os pretendentes tem um perfil para a criança a ser adotada. Geralmente, eles querem brancos, do sexo feminino, em média com até dois anos, sem moléstia ou irmãos. Temos poucos nesse perfil. Por essa razão o número de pretendentes é maior", afirma.

De acordo com a última consulta, menos de 1% do total de pretendentes tem interesse em adotar crianças com mais de oito anos de idade, por exemplo. Os dados mostram que mais da metade desejam crianças com até dois anos de idade -estes somam 57,8% dos cadastrados.

A raça também se mostra outra restrição à adoção. O levantamento mostra que 90,9% dos cadastrados querem crianças brancas. Pardas são aceitas por 61,5% dos interessados. Negras são preferidas por 34,7% das pessoas que querem adotar. Outros 36,5% desejam crianças amarelas, e 33,6% aceitam crianças indígenas.

Também de acordo com o CNA, 82,5% dos pretendentes desejam adotar apenas uma criança. O percentual cai consideravelmente para os interessados em adotar duas crianças -estes chegam a 16,4%. Já em relação aos interessados em adotar três crianças, o percentual cai para 0,76%.

O coordenador do CNA afirma que políticas públicas têm sido desenvolvidas para conscientizar os interessados sobre esse tipo de exigências. Nesse sentido, Lupianhes destaca a nova Lei da Adoção (Lei 12.010) que entrou em vigor em 2009. "A legislação trouxe uma série de exigências, entre as quais a necessidade de os pretendentes participarem de um curso, a fim de se prepararem para a adoção. Isso tem se mostrado algo muito positivo, pois tem conscientizado os pretendentes sobre a questão do perfil", explica o magistrado, para quem laços familiares e fraternos podem e devem ser construídos independentemente de critérios tais como raça ou idade.

Na contramão - A história de Vanessa e Leonardo prova que isso é possível. Na contramão de muitos pretendentes e suas diversas exigências, o casal, que reside no Rio de Janeiro, adotou Mário (atualmente com 18 anos) e seus irmãos gêmeos Bruno e Bruna (14 anos). "Queríamos adotar uma criança com uns cinco e seis anos. No juizado, na época, a assistente social nos explicou que havia uma criança neste perfil, mas que ela tinha dois outros irmãos. Fomos conhecê-los e ficamos apaixonamos", conta Vanessa.

Ela explica que não enfrentou problemas graves de adaptação. "Eles sempre foram muito tranqüilos. Não vivenciamos maiores dificuldades. A criança mais velha está querendo ser adotada. E isso facilita a convivência. Eles já estavam no abrigo há quatro anos. A empatia foi muito grande", destaca.

Vanessa dá a receita para a construção de uma relação harmoniosa com os filhos adotados. "Essa coisa de achar que a criança mais velha é cheia de mania, que não é possível contornar, não é realidade. A convivência com a criança, bem como a educação e o amor que você dá, supera isso. Esses preconceitos, como idade e cor, não deveriam ser levados em consideração", afirma.

Giselle Souza
Agência CNJ de Notícias
Fonte: JUSBRASIL

Bolsonaro: quais os limites da imunidade parlamentar?

Saiu na Folha de hoje (5/4/12):

Deputados defendem que Bolsonaro seja processado
Deputados da Comissão de Direitos Humanos da Câmara pediram ontem ao presidente da Casa, Marco Maia (PT-RS), que abra processo disciplinar contra o deputado Jair Bolsonaro (PP-RJ) (…)
Segundo o relato dos deputados, Bolsonaro destratou um dos funcionários da comissão ao solicitar documentos levados por testemunhas que participaram da Guerrilha da Araguaia.
Elas foram ouvidas em reunião secreta da subcomissão para que tivessem as identidades preservadas, pois sofrem ameaças de morte.
O deputado, que não é membro da comissão, teria entrado na sala aos gritos, ofendendo os depoentes.
‘O deputado constrangeu membros da comissão, agrediu um servidor, tentou atrapalhar o debate. Tirou fotos escondidas dos depoentes e disse ao servidor, ao ter negado o direito de arrancar documentos das suas mãos, que a conversa não tinha 'chegado no chiqueiro'’, relatou o presidente da comissão, Domingos Dutra (PT-MA)


E também na Folha de hoje:

Político é preso ao xingar guarda-civil de 'macaco' no ABC
A polícia autuou Adriano Giovanni Pieroni, 48, em flagrante por injúria racial e desacato à autoridade. Ele continuava preso até ontem à noite.
Segundo a polícia, o político estava no velório de um primo e passou a ofender os guardas Edemir Edinor da Silva, 39, e Jucélio Marciano da Silva, 37.
A polícia apurou que os xingamentos aconteceram após Pieroni tomar três doses de vodca em um bar ao lado do velório. Pieroni teria chamado um guarda de ‘preto’ e de ‘macaco’
".

Senadores e deputados têm imunidade parlamentar (deputados estaduais e vereadores também têm algo parecido).

A imunidade parlamentar, segundo nossa Constituição, significa que “são invioláveis, civil e penalmente, por quaisquer de suas opiniões, palavras e votos” e “não poderão ser presos, salvo em flagrante de crime inafiançável” (art. 53).

Pode soar estranho, mas a imunidade parlamentar serve para proteger o eleitor.

A imunidade parlamentar, nos moldes que a conhecemos hoje, surgiu na Inglaterra, durante a Idade Média, para proteger o povo contra o rei. Se o parlamentar – que representa o eleitor – pudesse ser preso, torturado e morto se dissesse algo que o rei não gostasse, ele não estaria representando os seus eleitores. Logo, eles se viram obrigados a criar um mecanismo através do qual se tornassem intocáveis pelo que dissessem no exercício de suas funções parlamentares (algo parecido beneficiava os lordes, que também eram parlamentares, mas não eram eleitos. Mas essa é outra discussão).

Se lermos a Constituição com cuidado, veremos que a imunidade parlamentar não é uma varinha de condão que torna a pessoa imune a processos.

Primeiro, o parlamentar é inviolável por suas opiniões, palavras e votos. A lei não diz nada a respeito de suas ações. Logo, se um parlamentar resolve amputar os braços dos inimigos políticos com um serra elétrica, ou invadir um determinado local, agredir uma testemunha ou expo-la a perigo de vida, ele não está protegido.

A mesma coisa acontece se suas opiniões nada tiverem a ver com o exercício de seu mandato, ou quando ele deixa de cumprir suas obrigações (um deputado que deixa de pagar a conta de água ou descumpre os termos de um crontrato que assinou com alguém, está sujeito a um processo como qualquer outra pessoa). Em resumo: a imunidade serve para proteger o exercício de sua função e não para coloca-lo acima da lei.

Segundo, ele só pode ser preso em flagrante por crimes inafiançáveis. Isso serve para que ele não seja preso 'por acaso' no dia de uma votação importante, ou algo parecido. Não adiantaria nada dar liberdade para falar o que quiser, mas mante-lo preso, impossibilitado de ser ouvido.


A lei diz que, se o crime for afiançável, ele não pode ser preso. Mas aqui a Constituição está apenas falando da prisão antes do julgamento. Ele será processado e julgado (pelo STF, se for membro do Congresso Nacional), e, se condenado, poderá ser preso como qualquer outra pessoa. Ou seja, ele não aguardará seu julgamento preso, exceto se foi preso em flagrante por um crime inafiançável. Mas, ele será julgado e, se condenado, poderá ser preso.

A pessoa só tem imunidade enquanto for parlamentar. E para se manter como parlamentar ele precisa, entre outras coisas, agir com decoro (decência, dignidade). Se ela não agir com decoro, ela  perde seu mandato (art. 55, II) e fica sujeito às mesmas regras que todo mundo.

E aqui entra um detalhe interessante: ela possui prerrogativas de um parlamentar (inclusive a imunidade) mas, segundo a própria Constituição, “é incompatível com o decoro parlamentar (…) o abuso das prerrogativas” (§1º). O que a Constituição está dizendo aqui é que ele pode perder seu mandato (e, por consequência, sua imunidade) se abusar de sua imunidade. Ou seja, a imunidade deve ser usada com parcimônia.

 
http://direito.folha.com.br/1/post/2012/04/bolsonaro-quais-os-limites-da-imunidade-parlamentar.html