terça-feira, 29 de maio de 2012

Da mora e da cláusula penal

Da mora:

Conceito:

De acordo com o art. 394 do CC, “Considera-se mora o devedor que não efetuar o pagamento, e o credor que o não quiser recebê-lo no tempo, lugar e forma que a lei ou a convenção estabelecer”.

Para que haja mora faz-se necessário os seguintes requisitos: existência de dívida líquida e certa; o vencimento da dívida e culpa do devedor.

Mora (inadimplemento relativo)
Inadimplemento absoluto
A obrigação não é cumprida em tempo, lugar e forma devidos, mas o cumprimento da obrigação ainda é útil para o credor.

A obrigação não é cumprida e é impossível que seja proveitosa para o credor.

Espécies de mora:

a) Mora solvendi ou debitoris – mora do devedor, quando este não cumpre, por sua culpa, a prestação devida no tempo, lugar e forma devidos. Manifesta-se como:

a.1) mora ex re (decorre da lei, resultando do simples descumprimento da obrigação e independendo de provocação do credor);

a.2) mora ex persona (se não houver estipulação de termo certo para a execução da relação obrigacional, sendo indispensável a adoção de certas providências do credor para constituir o devedor em mora). Para se configurar, exige culpa do devedor, pois se não houver fato ou omissão imputável ao devedor, não estará este em mora (art. 396 do CC).

b) Mora accipiendi – mora do credor, quando este se recusa injustamente a aceitar o adimplemento da obrigação no tempo, lugar e forma devidos. Independe de culpa.

Efeitos jurídicos da mora:

a) Mora do devedor – traz as conseqüências abaixo arroladas:

- O devedor responderá pelos prejuízos a que sua mora der causa, mais juros, atualização dos valores monetários segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, e honorários advocatícios (art. 395 do CC);

- Tornando-se a prestação inútil ao credor devido à mora, poderá este rejeitá-la e exigir perdas e danos (art. 395, parágrafo único do CC);

- Mesmo no caso de a impossibilidade da prestação advir de caso fortuito ou força maior, se ocorridos durante a mora, deverá o devedor responder por esta impossibilidade; salvo se provar isenção de culpa, ou que o dano sobreviria, ainda quando a obrigação fosse desempenhada oportunamente (art. 399 do CC).

b) Mora do credor – traz as conseqüências abaixo arroladas (art. 400 do CC):

- Subtrai o devedor isento de dolo à responsabilidade pela conservação da coisa;

- Obriga o credor a ressarcir as despesas (necessárias) empregadas na conservação da coisa;

- Sujeita o credor a receber a coisa pela estimação mais favorável ao devedor, se o valor oscilar entre o dia estabelecido para o pagamento e o da sua efetivação.

Termo inicial da mora:

a) Mora ex re – “o inadimplemento de obrigação, positiva e líquida, no seu termo constitui de pleno direito em mora o devedor” (art. 397 do CC).
b) Mora ex persona – “não havendo termo, a mora se constitui mediante interpelação judicial ou extrajudicial” (art. 397, parágrafo único do CC).

c) Mora solvendi na obrigação negativa – alguns doutrinadores entendem que nas obrigações negativas, o devedor fica constituído em mora, desde o dia em que executar o ato de que se devia abster. Entretanto, parece-nos que a melhor opinião é a daqueles, tais como Gagliano e Pamplona Filho (2003, 297) que defendem que neste caso não há mora, mas sim inadimplemento absoluto (art. 390 do CC).

d) Mora em caso de ato ilícito – “nas obrigações provenientes de ato ilícito, considera-se o devedor em mora desde que o perpetrou” (art. 398 do CC).

Purgação da mora:

Segundo Sílvio de Salvo Venosa (2003, 245), “purgar a mora é o ato pelo qual a parte que nela incorreu retira-lhe os efeitos. Aplica-se tanto no caso do devedor, como no do credor”. Resta óbvio que a purgação da mora gera efeitos ex nunc (para o futuro), restando a responsabilidade pelas cominações até a data da purgação.

Purgação da mora do devedor ocorre quando este oferecer a prestação devida (quando ainda útil ao credor), acrescida da importância dos prejuízos até o dia da oferta (art. 401, I do CC). É possível que terceiro, legitimado a receber e dar quitação, purgue a mora.

Sendo a lei silente, surge dúvida acerca de até quando poderá o devedor purgar a mora. A melhor doutrina é a que entende ser razoável a aceitação da purgação da mora pelo devedor até o prazo para contestação, salvo se houver cláusula resolutória expressa, pois neste caso, o advento do termo já constitui em mora o devedor.

Já a purgação da mora pelo credor ocorre quando este se oferece para receber o pagamento e se sujeitar aos efeitos da mora até a mesma data (art. 401, II do CC).

Purgação da mora
Cessação da mora
Significa reparar a mora.
Significa extinguir todos os efeitos da mora (pretéritos e futuros), o que pode ocorrer, por exemplo, pela remissão da dívida, pela renúncia da mora pelo devedor ou pela novação.

OBS. Não é possível mora de ambos os sujeitos da relação obrigacional, pois elas se anulariam. Uma vez estando em estado idêntico, não podem as partes imputar nada uma a outra.

Da Cláusula penal:

Conceito:

“É um pacto secundário e acessório, em que se estipula pena ou multa para a parte que se subtrair ao cumprimento da obrigação, a que se obrigara, ou que apenas retardá-la” (Washington de Barros Monteiro, 1997, 206). É também denominada pena convencional.

Podem ser elencadas as seguintes características da cláusula penal (Maria Helena Diniz, 2004, 407-11):

a)      Acessoriedade – segue, portanto, a obrigação principal. Silvio de Salvo Venosa (2003, 166) cita Serpa Lopes dizendo que existem duas exceções em que, mesmo na nulidade do contrato, sobrevive a cláusula penal, pois será obrigação autônoma:
1ª) nas situações em que a nulidade seja tal a ponto de dar margem a uma indenização por perdas e danos, como é o caso da venda de coisa, dolosamente, não pertencente ao devedor;
2ª) quando a cláusula penal foi justamente pactuada para os casos de ser tida como nula a obrigação principal.

b)      Condicionalidade – pois que o dever de pagar a pena está condicionado à evento futuro e incerto;

c)      Compulsoriedade (intimidatório) – pois é meio forçado do cumprimento da obrigação que consiste numa pena, constrangendo psicologicamente o devedor ao pagamento da obrigação (art. 416, caput, CC);

d)     Subsidiariedade – salvo no caso de pena moratória. Substitui a obrigação principal não cumprida por culpa do devedor (art. 410, CC);

e)      Ressarcibilidade – por constituir liquidação prévia e convencional das perdas e danos, no caso de inadimplemento futuro do convencionado;

f)       Imutabilidade relativa – pois deverá ser modificada pelo juiz em determinados casos legais (art. 413, CC).

OBS. Sua estipulação pode ocorrer conjuntamente com a obrigação principal ou em ato posterior (art. 409).

Silvio de Salvo Venosa (2003, 166) diz que “É comum as partes camuflarem a cláusula penal, estipulando-a ao avesso, isto é, no contrato de locação, fixam um desconto, caso o devedor pague até determinado dia, rezando a avença que o preço do aluguel é outro, mais elevado. Trata-se de verdadeira multa moratória, como veremos”.

Função:

São duas as suas funções: pré-liquidação de danos e intimidatória do devedor.

Espécies:

Da análise do art. 409 do CC, pode-se identificar as duas espécies de cláusula penal:

a)      Compensatória – estipulada para o caso de descumprimento total da obrigação principal;

b)      Moratória - estipulada para o caso de descumprimento de qualquer cláusula do contrato ou de inadimplemento relativo (mora).

OBS. Nos casos excepcionais em que o descumprimento de cláusula especial do contrato frustra integralmente a expectativa do credor, ou diminui as possibilidades que o contrato lhe oferecia, a cláusula penal deve ser entendida como compensatória.

OBS. O art. 410 do CC, referindo-se à cláusula penal compensatória, prevê alternativa ao credor: ou pede o valor da multa ou o cumprimento da obrigação ou perdas e danos.

Valor:

Em conformidade com o art. 412 do CC, a pena convencional prevista no contrato não poderá exceder o valor da obrigação principal, sob pena de invalidade.

No art. 413, encontra-se regra expressa de que o juiz deverá reduzir eqüitativamente a pena quando a obrigação principal tiver sido cumprida em parte, ou se o montante da penalidade for manifestamente excessivo. Silvio Rodrigues (2002, 276) revela que esta norma deve ser entendida como de ordem pública, para efeito de não permitir que a convenção entre os particulares derrogue o princípio aí consignado.
No caso de o credor, diante do inadimplemento absoluto do devedor, entender que o seu prejuízo ultrapassou a multa (pena) previamente pactuada, só poderá exigir o restante se houver expressa disposição convencional nesse sentido, valendo a pena como mínimo de indenização (art. 416, parágrafo único do CC). Neste caso, o credor deverá provar o prejuízo que excedeu o valor da pena convencional. Observe-se que, uma vez ocorrido o descumprimento obrigacional, não precisará o credor provar o prejuízo para fazer jus à pena convencionada, pois este será presumido (art. 416 do CC).   

Concorda-se com o raciocínio de Gagliano e Pamplona Filho (2003, 346) de que “Se a cláusula penal for instituída para o caso de inadimplemento relativo da obrigação (mora) ou infringência de determinada cláusula contratual, objetivou-se, com isso, apenas a pré-liquidação de danos decorrentes do atraso culposo no cumprimento da obrigação ou do descumprimento de determinada cláusula estipulada, de forma que, por óbvio, seu valor pecuniário deverá ser menor do que aquele que seria devido se se tratasse de cláusula compensatória por inexecução total da obrigação”. Assim sendo (caso de cláusula penal moratória), o art. 411 do CC admite que o credor cumulativamente exija a satisfação da pena conjuntamente com o cumprimento da obrigação.

Momento em que se torna devida:

De acordo com o art. 408 do CC, nas obrigações com prazo certo, o simples decurso do tempo torna exigível a multa. Já nas obrigações em que não há prazo, a multa só será exigível após a constituição em mora (art. 397 do CC). Atenção para o fato de que o devedor só incorre na cláusula penal quando culposamente deixe de cumprir a obrigação ou se constitua em mora.

Cláusula penal em obrigação indivisível e em obrigação divisível:

Quando há o descumprimento de uma obrigação indivisível por qualquer dos coobrigados, todos incorrerão na pena convencional, não obstante somente o culpado seja obrigado a pagá-la integralmente (art. 414 do CC). Neste caso, os coobrigados que não tiveram culpa responderão na respectiva proporção de suas quotas, assitindo-lhes o direito de regresso contra aquele que deu causa à aplicação da pena.

Nas obrigações divisíveis, deverá a pena ser imputada apenas ao devedor que deu causa à aplicação da mesma (art. 415 do CC).