quinta-feira, 6 de junho de 2013


A escolha do nome e as possibilidades de mudança do registro civil

O nome é de extrema relevância na vida social e concretiza o princípio constitucional da dignidade da pessoa humana. Nessa linha, a lei civil dispõe que toda pessoa tem direito ao nome, nele compreendidos o prenome e o sobrenome.

Ocorre que muitos não se sentem confortáveis com o próprio nome ou sobrenome, sendo certo que para algumas pessoas a escolha feita chega a causar constrangimento. Em casos menos intensos, o cidadão quer apenas ver reconhecido o direito de usar o nome de seus ascendentes.

No direito brasileiro, a regra predominante é a da imutabilidade do nome civil. Entretanto, a possibilidade de mudança é permitida em determinados casos: vontade do titular no primeiro ano seguinte ao da maioridade civil; decisão judicial que reconheça motivo justificável para a alteração; substituição do prenome por apelido notório; substituição do prenome de testemunha de crime; adição ao nome do sobrenome do cônjuge e adoção.

Em duas decisões recentes e inéditas, o STJ entendeu que mesmo que vigore o princípio a imutabilidade, a jurisprudência tem apresentado interpretação mais ampla, permitindo, em casos excepcionais, o abrandamento da regra.

No primeiro caso, a decisão permitiu que uma menor, representada pelo pai, alterasse o registro de nascimento. Ela queria retirar de seu nome a partícula “de” e acrescentar mais um sobrenome da mãe. O relator da questão, ministro Massami Uyeda, entendeu que há liberdade na formação dos nomes, porém a alteração deve preservar os apelidos de família.

No segundo caso, a 3ª turma do STJ entendeu ser possível a retificação do registro civil para inclusão do sobrenome paterno no final do nome, em disposição diversa daquela constante no registro civil do pai, desde que não se vislumbre prejuízo aos apelidos de família.

Ressaltou a relatora, ministra Nancy Andrighi, que a lei não faz exigência de determinada ordem no que se refere aos nomes de família, seja no momento do registro, seja por ocasião da sua posterior retificação. E acrescentou, ao contrário do que a maioria dos cidadãos imagina, que a lei "...não proíbe que a ordem do sobrenome dos filhos seja distinta daquela presente no sobrenome dos pais".

Vale ressaltar que embora a mudança no registro civil, obrigatoriamente, dependa de ordem judicial, para simples correção de erros evidentes o procedimento foi simplificado. Com o advento da lei 12.100/09, os erros evidentes podem ser corrigidos de ofício pelo oficial de registro do próprio cartório, dispensando a intervenção judicial.

Vale ressaltar, finalmente, que o abrandamento da regra da imutabilidade não dispensa o bom senso daqueles que escolhem os nomes dos filhos.
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*Andréa Angélico Massa é advogada do escritório Angélico Advogados.
http://www.migalhas.com.br/dePeso/16,MI179884,81042-A+escolha+do+nome+e+as+possibilidades+de+mudanca+do+registro+civil

O sagrado direito ao sossego e a desinformação (Rizzatto Nunes)

Como, ultimamente, os meios de comunicação têm abordado com certa regularidade a questão do barulho, mas nem sempre têm tratado as questões jurídicas como exige o caso, eu volto a cuidar do assunto, lembrando, desde logo, que a violação do sossego no Brasil é mais um exemplo de como a sociedade é dividida e as pessoas são egoístas e desrespeitosas umas com as outras. Todos têm direito ao sossego, ao descanso, ao silêncio, direito este cada dia mais violado abertamente.

Em abril de 2012, um trabalhador rural foi morto a tiros na cidade de General Salgado. O acusado do crime era um vizinho, professor de ciências, que praticou o delito por causa do barulho que sempre ocorria no local. Testemunhas disseram a polícia que as discussões entre os vizinhos eram constantes. A ironia é que o professor já havia inclusive registrado na delegacia local um boletim de ocorrência contra os vizinhos por causa do barulho, o que não foi apurado, mas depois do homicídio a investigação estava sendo feita...

No início do mês passado, num condomínio de luxo na grande São Paulo, um empresário que reclamava constantemente do barulho provocado por seu dois vizinhos, após outra discussão, matou os dois, marido e mulher. Depois se suicidou.

Fazendo uma busca na internet sobre esse crime, eu encontrei uma carta de uma leitora que, de algum modo, traduz o sentimento de ira e impotência que esse tipo de violação ao sossego envolve. Veja: "Eu já tive problemas terríveis com vizinhos que ouvem música alta. Isso vai dando uma irritação progressiva e a gente chega ao ponto de quase explodir...Por conta disso, tive depressão e literalmente abandonei esse apartamento que era meu, quitado, bem localizado e de três quartos. Acho que o sujeito que atirou não teve uma crise súbita, acho que foi um acúmulo de circunstâncias que terminou em tragédia...".

Recentemente, a Câmara Municipal de São Paulo aprovou uma lei que proíbe o uso de aparelhos de som portáteis instalados em carros estacionados que emitam som alto, considerado este o que atinge 50 decibéis. A medida, naturalmente, é boa, mas é muito menos do que já existe legalmente estabelecido no país, como se verá na sequência. Nós temos em vigor leis muito mais rigorosas que permitem que se puna os infratores e exige que se faça cessar a violação quando ela estiver ocorrendo.

Como já tive oportunidade de comentar, na sociedade atual não só há uma falta de educação, cortesia e respeito ao direito do outro como, de fato, parece que neste capitalismo do império globalizante em que vivemos, tudo faz barulho. Existe mesmo uma busca incessante em sua produção: são músicas em altos volumes nos automóveis, nas lojas e nos restaurantes, nos clubes, nas academias, nos intervalos comerciais da tevê, nos espetáculos teatrais e nos cinemas, nos estádios de futebol, onde há também o barulho das torcidas que atinge toda a redondeza; são festas de aniversário e de casamento; são shows ao vivo em estádios que vão muito além de suas arquibancadas; são bares, boates e danceterias que invadem o espaço dos vizinhos, etc. Além disso, há, no dia a dia, excesso de ruído por todos os lados: dos veículos nas ruas, das máquinas nas fábricas, das construções, das oficinas, etc. Trata-se de um enorme amontoado de ações barulhentas, algumas ensurdecedoras, nem sempre em nome do tão sonhado progresso.

E, claro, há os sons "privados" dos aparelhos eletrônicos domésticos que saem pelas janelas de apartamentos e casas perturbando os vizinhos com seus exagerados volumes. Há também latidos incessantes de cachorros e até "imitações" dos papagaios (licenciados ou não pelo IBAMA). Enfim, os barulhos, ruídos, sons em altos volumes entram em nossas casas e apartamentos a toda hora sem pedir licença, violando esse nosso direito sagrado ao silêncio e ao sossego.

Não abordarei um aspecto importante dos sons não pedidos, como a imposição dos estabelecimentos comerciais de que seus frequentadores escutem as músicas por eles escolhidas (o que, por exemplo, em academias de ginástica e musculação pode ser altamente prejudicial não só pelo excesso de volume, como pela qualidade das músicas...). Tratarei do outro lado da questão: do direito ao silêncio, ao sossego e ao descanso, sagrados e que qualquer pessoa pode exigir, com base nas leis em vigor!

O direto ao sossego é correlato ao direito de vizinhança e está ligado também à garantia de um meio ambiente sadio, pois envolve a poluição sonora. A legislação brasileira é bastante clara em estipular esse direito, que envolve uma série de transtornos que já foram avaliados e julgados pelo Poder Judiciário.

Por exemplo, o Judiciário considerou que viola o direito ao sossego: a) o barulho produzido por manifestações religiosas, no interior de templo, causando perturbações aos moradores de prédios vizinhos; b) os ruídos excessivos oriundos de utilização de quadra de esportes; c) a utilização de heliporto em zona residencial; d) o movimento de caminhões que fazem carga e descarga de cimento, no exercício de atividade comercial em zona residencial; e) os ruídos excessivos feitos por estabelecimento comercial instalado em condomínio residencial; f) os latidos incessantes de cães; g) a produção de som por bandas que tocam ao vivo em bares, restaurantes, boates e discotecas; o mesmo vale para sons produzidos eletronicamente etc.

Anoto, antes de prosseguir, que o abuso sonoro reconhecido nas ações judiciais, independe do fato de, por acaso, ter sido autorizado pela autoridade competente. Num caso em que se considerou excessivo o ruído produzido pelo heliporto, havia aprovação da planta pela Prefeitura e seus órgãos técnicos; num outro em que se constatou que a quadra de esportes produzia excessivo barulho, a Prefeitura também tinha aprovado sua construção.

Aliás, lembro que os shows produzidos em estádios de futebol e que violam às escâncaras o direito ao sossego dos vizinhos são, como regra, autorizados pela Prefeitura local. Alguns shows, inclusive, varam a noite e a madrugada, numa incrível violação escancarada. Realço que, nesses casos, a própria Prefeitura é responsável pelos danos causados às pessoas.

Dizia acima que a legislação pátria é rica no tema. Muito bem. A Lei das Contravenções Penais (decreto-lei 3.688/1941) no seu artigo 42 estabelece pena de prisão para aquele que "perturbar o trabalho ou o sossego alheios: com gritaria ou algazarra; exercendo profissão incômoda ou ruidosa, em desacordo com as prescrições legais; abusando de instrumentos sonoros ou sinais acústicos; provocando ou não procurando impedirbarulho produzido por animal de que tem a guarda".

Nesse último assunto, faço parênteses para dizer que, muitas vezes, o latido de cães mantidos em casa pode caracterizar outro delito, previsto já no art. 3º do antigo decreto-lei 24.645/1934 que dispõe que "Consideram-se maus tratos: I - Praticar ato de abuso ou crueldade em qualquer animal; II - Manter animais em lugares anti-higiênicos ou que lhes impeçam a respiração, o movimento ou o descanso, ou os privem de ar ou luz". Essa antiga norma foi, posteriormente, incorporada na nossa legislação ambiental. A lei de Crimes Ambientais (lei 9605/98) estebelece, no seu art. 32, prisão para quem "Praticar ato de abuso, maus-tratos, ferir ou mutilar animais silvestres, domésticos ou domesticados, nativos ou exóticos".

É essa mesma lei ambiental que pune severamente com pena de prisão o crime de poluição sonora. Seu art. 54 diz: "Causar poluição de qualquer natureza em níveis tais que resultem ou possam resultar em danos à saúde humana, ou que provoquem a mortandade de animais ou a destruição significativa da flora".

E o novo Código Civil Brasileiro, que entrou em vigor em janeiro de 2003, garante o direito ao sossego no seu art. 1277 ao dispor: "O proprietário ou o possuidor de um prédio tem o direito de fazer cessar as interferências prejudiciais à segurança, ao sossego e à saúde dos que o habitam, provocadas pela utilização de propriedade vizinha".

Consigno que, para a caracterização do delito penal de perturbação do sossego, a lei não exige demonstração do dano à saúde. Basta o mero transtorno, vale dizer, a mera modificação do direito ao sossego, ao descanso e ao silêncio de que todas as pessoas gozam, para a caracterização do delito. Apenas no crime de poluição sonora é que se deve buscar aferir o excesso de ruído. Na caracterização do sossego não. Basta a perturbação em si.

Evidente que os danos causados são, primeiramente, de ordem moral, pois atingem a saúde e a tranquilidade das pessoas, podendo gerar danos de ordem psíquica. Além disso, pode também gerar danos materiais, como acontece quando a vítima, não conseguindo produzir seu trabalho em função da perturbação, sofre perdas financeiras. 
 
 http://www.migalhas.com.br/ABCdoCDC/92,MI179877,31047-O+sagrado+direito+ao+sossego+e+a+desinformacao

Da (im)possibilidade do testamento vital no ordenamento jurídico brasileiro

A declaração prévia de vontade do paciente terminal, no Brasil conhecida simplesmente por testamento vital, é assunto que, a cada dia, ganha fôlego nos mais diversos campos do conhecimento, havendo, inclusive, conforme outrora analisado, certos países que já reconhecem sua existência, validade e eficácia, a exemplo dos Estados Unidos da América, da Espanha e do Uruguai.
 Todavia, em que pese a sua relevância como símbolo do apelo ao direito de viver uma morte de feição humana, no ordenamento jurídico pátrio, até o momento, não há regulamentação legal específica sobre o assunto, razão pela qual se impõe verificar a possibilidade do testamento vital ser reconhecido na órbita jurídica brasileira.
No plano infralegal, a Resolução CFM n.º 1.805, em vigor desde a sua publicação no Diário Oficial da União, ocorrida em 28 de novembro de 2006, disciplina que na fase terminal de enfermidades graves e incuráveis é permitido ao médico limitar ou suspender procedimentos e tratamentos que prolonguem a vida do doente, garantindo-lhe os cuidados necessários para aliviar os sintomas que levam ao sofrimento, na perspectiva de uma assistência integral, respeitada a vontade do paciente ou de seu representante legal.[92]
Entretanto, tendo em vista a repercussão no meio social que à época causou, o Ministério Público Federal, através do procurador Wellington Oliveira, ajuizou a Ação Civil Pública n.º 2007.34.00.014809-3 contra o Conselho Federal de Medicina, alegando, em síntese, que este conselho profissional não teria poder regulamentador para, por meio da resolução supra nem por qualquer outro instrumento, estabelecer como parâmetro ético uma conduta tipificada como crime.
Sob um enfoque estritamente legalista e em decisão liminar, o juiz Roberto Luís Luchi Demo, da 14ª Vara da Justiça Federal, Subseção Judiciária do Distrito Federal, entendeu que, se há um projeto de lei propondo a descriminalização da ortotanásia (PLS n.º 116/2000, de iniciativa do senador Gerson Camata – PMDB/ES), esta efetivamente é prática criminosa, e, assim, suspendeu os efeitos da resolução editada pelo Conselho Federal de Medicina.
Ocorre que, em agosto de 2010, o Ministério Público Federal, por meio da procuradora Luciana Loureiro, que substituiu o procurador Wellington Oliveira na ação, revisou o caso e em suas alegações finais reconheceu que na realidade havia se instalado uma confusão entre os conceitos de eutanásia e de ortotanásia, sendo a prática desta última totalmente constitucional.
Dessa forma, em dezembro de 2010, por ocasião da prolação da sentença, o magistrado revogou a antecipação de tutela anteriormente concedida e julgou improcedente o pleito ministerial, afirmando que se alinhava à tese defendida pelo Conselho Federal de Medicina durante todo o processo e pelo Ministério Público Federal nas suas alegações finais, haja vista que traduzia, na perspectiva da resolução questionada, a interpretação mais adequada do Direito diante do atual estado de arte da medicina. “E o faço com base nas razões da bem-lançada manifestação da ilustre procuradora da República Luciana Loureiro Oliveira”.[93]
No que diz respeito a proposta de descriminalização da ortotanásia lançada no PLS n.º 116/2000, que sequer teve seu desfecho, haja vista que o referido projeto ainda se encontra em plena tramitação no Senado Federal,[94] compartilhamos do entendimento perfilhado por JIMMY MATIAS NUNES e LORENA SALES ARAÚJO, segundo o qual não há que se falar em descriminalizar algo que efetivamente não constitui crime, na medida em que, não bastasse inexistir tipificação da conduta em nosso ordenamento jurídico penal, a prática da ortotanásia não infringe qualquer norma ética ou jurídica, mas, pelo contrário, cultiva um dos princípios basilares da Carta Magna de 1988: o princípio da dignidade da pessoa humana.[95]
De outro norte, existem pelo menos 4 (quatro) projetos de lei no Senado Federal que versam, direta ou indiretamente, sobre o tema: o PLS n.º 79/2003, apresentado pelo senador Delcídio do Amaral (PT/MS)[96], e o PLS n.º 101/2005, do senador Pedro Simon (PMDB/RS),[97] que dispõem sobre os direitos dos pacientes em serviços de saúde; o PLS n.º 103/2005, do senador Papaléo Paes (PSDB/AP), que estabelece o Estatuto do Enfermo;[98] e o PLS n.º 524/2009, apresentado pelo senador Gerson Camata (PMDB/ES), que dispõe sobre os direitos da pessoa em fase terminal de doença.[99]
Interessa-nos especificamente este último projeto de lei, qual seja, o PLS n.º 524/ 2009, elaborado pela Comissão de Bioética da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) e apresentado ao Senador Federal pelo então senador Gerson Camata, o qual está umbilicalmente relacionado à resolução CFM n.º 1.805/2006, contendo basicamente os mesmos dispositivos desta, porém de forma mais detalhada.
Depreende-se que o PLS n.º 524/2009 dispõe sobre os direitos da pessoa que se encontra em fase terminal de doença, no que diz respeito à tomada de decisões sobre a instituição, a limitação ou a suspensão de procedimentos terapêuticos, paliativos e mitigadores do sofrimento, estabelecendo, em suma, que
a)  a pessoa em fase terminal de doença tem direito, sem prejuízo de outros procedimentos terapêuticos que se mostrarem cabíveis, a cuidados paliativos e mitigadores do sofrimento, proporcionais e adequados à sua situação;
b)  se houver manifestação favorável da pessoa em fase terminal de doença ou, em casos de impossibilidade em decorrência de doença mental ou outra situação que altere o seu estado de consciência, da sua família ou do seu representante legal, é permitida, desde que fundamentada e registrada no prontuário do paciente, bem como submetida a análise médica revisora, a limitação ou a suspensão, pelo médico assistente, de procedimentos desproporcionais ou extraordinários destinados a prolongar artificialmente a vida; e
c)  na hipótese de impossibilidade superveniente de manifestação de vontade do paciente e caso este tenha, anteriormente, enquanto lúcido, se pronunciado contrariamente à limitação e suspensão de procedimentos desproporcionais ou extraordinários destinados a prolongar artificialmente a vida, deverá ser respeitada tal manifestação.
Objetivando sua correta interpretação, o referido projeto de lei preocupa-se também em conceituar o que se entende por pessoa em fase terminal de doença; procedimentos paliativos e mitigadores do sofrimento; cuidados básicos, normais e ordinários; procedimentos proporcionais; procedimentos desproporcionais; e procedimentos extraordinários.[100]
No mais, tanto o PLS n.º 524/2009 como os demais projetos de leis alhures mencionados atualmente ainda estão na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) aguardando a designação do relator. Após, seguirão para as Comissões de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH) e de Assuntos Sociais (CAS), esta última em apreciação terminativa.
Dessa forma, considerando que o devido processo legislativo é o meio hábil para alcançar uma norma geral e abstrata, que consolide as várias visões da sociedade brasileira acerca do tema, mediante o exercício da representação política, da participação popular e do diálogo democrático, resta-nos aguardar a efetiva aprovação de tais projetos de lei.
Enquanto isso, pesquisa[101] realizada por CAMILA STOLZ, GÉSSICA GEHLEN, ELCIO LUIZ BONAMIGO e MARCELO CARLOS BORTOLUZZI com médicos[102] da região da Associação dos Municípios do Meio Oeste Catarinense (AMMOC),[103] cujo objetivo era avaliar em que proporção as vontades antecipadas do paciente irão influir na conduta da equipe médica durante a tomada de decisões sobre procedimentos médicos no final da vida e se a distanásia poderá ser inibida mediante essa manifestação, observou que, numa escala de 0 a 10, quando questionados:
a)  se acreditavam ser conveniente que os cidadãos façam planos sobre seus desejos de saúde, deixando-os escritos na declaração das vontades, a média de respostas foi 8,18;
b) se as vontades antecipadas são instrumentos úteis para os profissionais de saúde na hora de tomar decisões sobre um paciente, a média de respostas foi 8,37;
c) se as vontades antecipadas são também úteis para os familiares do paciente no momento de se tomar decisões, a média de respostas foi 8,09;
d) sobre o valor da nomeação de representantes pelo paciente em suas vontades antecipadas, para facilitar a tomada de decisões dos profissionais de saúde quando o paciente estivesse em situação de incapacidade, a média de respostas foi 7,57; e
e) se respeitariam os desejos expressos por um paciente em declaração de vontades antecipadas, a média de respostas foi 8,26;
Ademais, quando questionados se havia, de fato, a regulamentação legal das vontades antecipadas no Brasil, bem como se já haviam lido algum desses documentos, obtiveram-se, respectivamente, as seguintes respostas: 12% dos médicos afirmaram que há regulamentação, 54% responderam que não há e 34% disseram que não sabiam; e 46% dos médicos afirmaram que já tinham lido algum documento sobre vontades antecipadas, contra 54% que nunca leram algo do tipo.
Assim, os pesquisadores puderam concluir que as vontades antecipadas do paciente serão respeitadas quando ele estiver incapacitado de se comunicar, constituindo verdadeira garantia de que não serão adotadas medidas desproporcionais que se configurem como prática de distanásia, motivo pelo qual propuseram que as vontades antecipadas fossem regulamentadas tanto do ponto de vista ético quanto legal, como importante instrumento para o respeito à autonomia do paciente.[104]
Nesse desiderato, desde 13 de abril de 2010 está em vigor o sexto Código de Ética Médica reconhecido no Brasil (Resolução CFM n.º 1.931/2009), o qual, em diversas passagens, consolida a autonomia do paciente e a postura comprometida do profissional como condicionantes para a qualidade de vida daquele, no sentido de não lhe serem impostas medidas clínicas desarrazoadas.
Analisemos, por exemplo, a redação do Capítulo I, XXII e do Capítulo V, art. 41, caput e parágrafo único:
Capítulo I (Princípios fundamentais)
XXII – Nas situações clínicas irreversíveis e terminais, o médico evitará a realização de procedimentos diagnósticos e terapêuticos desnecessários e propiciará aos pacientes sob sua atenção os cuidados paliativos apropriados.
Capítulo V (Relação com pacientes e familiares)
É vedado ao médico
Art. 41. Abreviar a vida do paciente, ainda que a pedido deste ou de seu representante legal.
Parágrafo único: Nos casos de doença incurável e terminal, deve o médico oferecer todos os cuidados paliativos disponíveis sem empreender ações diagnósticas ou terapêuticas inúteis ou obstinadas, levando sempre em consideração a vontade expressa do paciente ou, na sua impossibilidade, a de seu representante legal.[105]
Ambos os textos normativos, ao passo em que atuam no caminho de coibir a prática da distanásia, reconhecendo que aos doentes em fase terminal não se deve empregar medidas extraordinárias que importem em verdadeira obstinação terapêutica, impõem a manutenção das ações apropriadas sob a ótica dos cuidados paliativos, é dizer, capazes de propiciar o bem estar do paciente em situação de terminalidade.
O artigo 41, entretanto, vai além e se reveste de clareza solar no que se refere ao direito de o paciente expressamente externar sua vontade sobre os cuidados que, nos casos de doença incurável e terminal, deseja ou não se submeter, amparando-se, de certa forma, na disposição legal de que “ninguém pode ser constrangido a submeter-se, com risco de vida, a tratamento médico ou a intervenção cirúrgica”, inserta no art. 15, do Código Civil brasileiro.
Esse artigo do Diploma Civil visa à preservação da integridade do corpo humano, diante das situações em que um tratamento médico necessário a longo prazo para o restabelecimento do enfermo possa colocar em risco a sua própria vida.[106]
Outrossim, sob a égide do nosso Estado Democrático de Direito, é sabido que a Constituição Federal de 1988, em seu art. 1º, inciso III, resguarda como fundamento da República Federativa do Brasil a dignidade humana[107], que é a possibilidade, para cada ser humano, de “escolher morrer com a mesma dignidade que escolheu viver, sem prolongamento da agonia, na companhia de seus entes queridos, se assim desejar”.[108]
Dessarte, “após a promulgação da Constituição Republicana de 1988, que positivou o princípio da dignidade da pessoa humana como princípio fundamental, o conceito de vida digna foi inserido nas discussões jurídicas”[109] e o direito à vida, consequentemente, deixou de ser interpretado como a garantia simplesmente da existência biológica; senão, vejamos:
[...] o direito à vida não se exaure somente na mera existência biológica, sendo certo que a regra constitucional da dignidade da pessoa humana deve ser ajustada ao aludido preceito fundamental para encontrar-se convivência que pacifique os interesses das partes. Resguardar o direito à vida implica, também, em preservar os valores morais, espirituais e psicológicos que se lhe agregam.[110]
Igualmente, o sistema constitucional brasileiro protege a autonomia e liberdade individuais (princípios implícitos no art. 5º, da Carta Magna), relacionados com a causa ética da emancipação do sujeito em direção à sua autodeterminação, causa essa que, em última instância, diz respeito à afirmação da sua cidadania; e, com veemência, rechaça o tratamento desumano ou degradante (art. 5º, inciso III, da Constituição Federal), evitando ao paciente o constrangimento de submeter-se a tratamentos médicos que, diante do estado terminal em que se encontra, caracteriza-se como obstinação terapêutica.
Não bastasse, da análise conjunta desses princípios, verificamos as dimensões que devem ser atribuídas aos direitos da personalidade, sendo impossível limitar-lhes, tanto no número, quanto na extensão de seus valores, devendo ser reconhecidos como tais, todos aqueles que fundamentem o ser humano e lhe garanta qualidade existencial, aqui compreendida como sua dignidade.[111]
Nessa esteira, apesar da inexistência de norma específica no Brasil a respeito do testamento vital, a interpretação integrativa de todas as normas constitucionais e infraconstitucionais que por ora se analisou concede aparato para se defender a possibilidade deste documento ser adotado no ordenamento jurídico pátrio.
Isso é, considerando sobretudo a Resolução CFM n.º 1.805/2006; os projetos de lei n.º 79/2003, 101/2005, 103/2005 e 524/2009 que tramitam no Senado Federal; os resultados das pesquisas empreendidas com o corpo médico que atua nas situações de terminalidade da vida; a Resolução CFM n.º 1.931/2009; e o arcabouço constitucional que protege a dignidade da pessoa humana, a autonomia e liberdade individuais, e proíbe o tratamento desumano ou degradante; não se pode recusar às pessoas o direito de expressarem seus desejos de não serem submetidas a tratamento que prolonguem artificialmente, de forma irracional e cruel suas vidas, poupando-as, bem como sua família, de desgastes físicos, emocionais e financeiros.
 Não é outro o entendimento de JIMMY MATIAS NUNES e LORENA SALES ARAÚJO, para quem,
utilizando-se de uma visão sistemática desse ordenamento jurídico em comunhão com os princípios da autonomia privada da vontade do indivíduo, da autodeterminação de sua vontade e da dignidade da pessoa humana, há plena possibilidade de introdução do testamento vital no Direito brasileiro.[112]
E assim deve ser porque o Direito está mais além daquilo que os textos legislativos podem nos informar, ou seja, deve ser interpretado para além da literalidade de seus textos, tentando abarcar as mais diversas situações que surgem no turbilhão denominado vida, sem se prender às amarras que o exegetismo jurídico por vezes traz.
Entretanto, é urgente que nossos legisladores se dediquem para efetivamente institucionalizar o testamento vital, pois “os médicos não podem continuar com a ‘espada da Justiça’ sobre a cabeça”[113] e a previsão legislativa, sem dúvida, daria à sociedade maior legitimidade e respaldo para resolver sobre o processo de morte, haja vista que o simples reconhecimento de direito muda posturas, jurídicas e sociais, ao longo do tempo, cabendo alertar, também, que a ausência de recursos materiais para a efetivação dos direitos sociais não deve servir de desestímulo para o reconhecimento do direito à morte digna.[114]
DÉLIO KIPPER e MÁRCIO PALLIS HORTA, com fidedignidade, bem retratam esse drama e corroboram a necessidade de se preencher a lacuna:
[...] temos a clara percepção de que ainda fazemos uso excessivo e inapropriado da tecnologia, prolongando inutilmente o sofrimento humano, gastando mal os finitos recursos destinados à saúde e ocupando mal os sempre insuficientes leitos das UTIs e emergências; nos vemos desamparados, sob o ponto de vista legal, de tomar qualquer decisão de não-oferta ou retirada de suporte vital; sentimos falta de normas e diretrizes de como nos conduzirmos com esses paciente.[115]
Rebelarmo-nos contra a organização médica do morrer é tarefa inadiável. A medicina e a sociedade brasileira têm hoje diante de si um desafio ético, ao qual é mister responder com urgência, o de humanizar a vida no seu ocaso, devolvendo-lhe a dignidade perdida. Centenas ou talvez milhares de doentes estão hoje jogados a um sofrimento sem perspectiva em hospitais, sobretudo nas suas terapias intensivas e emergências. Não raramente, acham-se submetidos a uma parafernália tecnológica que não só não consegue minorar-lhes a dor e o sofrer como ainda os prolonga e os acrescenta, inutilmente.[116]
Dessa forma, convém discutirmos a estrutura e o conteúdo do testamento vital considerando a realidade brasileira, na humilde tentativa de se vislumbrarem sugestões a fim de que, finalmente, o documento seja regulamentado em nosso ordenamento jurídico.
De início, cumpre considerar que o testamento vital é negócio jurídico, ou seja,
é fato jurídico cujo elemento nuclear do suporte fáctico consiste em manifestação ou declaração consciente de vontade, em relação à qual o sistema jurídico faculta às pessoas, dentro de limites predeterminados e de amplitude vária, o poder de escolha de categoria jurídica e de estruturação do conteúdo eficacial das relações jurídicas respectivas, quanto ao seu surgimento, permanência e intensidade do mundo jurídico.[117]
Sendo assim, os seus requisitos de validade, quais sejam, a capacidade do agente; a licitude, possibilidade e determinabilidade do seu objeto; e a observância da forma não proibida ou determinada em lei; obviamente devem estar presentes, consoante disposição do art. 104, do Código Civil brasileiro.
O testamento vital deverá ser escrito por pessoa capaz, vale dizer, com competência para decidir autonomamente, o que pressupõe que compreende a informação transmitida e é capaz de efetuar um juízo independente de acordo com seus valores.
Nesse particular, deve-se entender que o discernimento para a realização do testamento vital não está diretamente ligado à idade, razão pela qual a liberdade de autodeterminação do paciente não pode ser averiguada aprioristicamente com base tão somente nos critérios objetivos definidos pelo Código Civil brasileiro no que diz respeito a incapacidade absoluta ou relativa do indivíduo.
Portanto, caberá ao juiz analisar se, por exemplo, um adolescente de 15 anos tem discernimento suficiente para manifestar sua vontade sobre os tratamentos que deseja ou não se submeter caso venha a padecer de uma doença terminal.[118]
Naqueles casos em que a pessoa já não tem ou até mesmo sequer chegou a ter o discernimento, nos moldes acima, para a realização do testamento vital – recém-nascidos, anencéfalos, crianças em sua mais tenra infância e deficientes mentais severos, por exemplo –, entende-se que a competência para a tomada de decisão caberá aos seus responsáveis, que devem adotar a doutrina do melhor interesse do paciente, de acordo com critérios universais de razoabilidade.[119]
Contudo, há quem entenda que, em tais casos, a tomada de decisão deve ser sempre uma responsabilidade compartilhada entre a equipe médica e os responsáveis legais pelo paciente[120], situação na qual deve existir um consenso que, não obtido, obrigará se recorrer aos meios formais de resolução, seja intra-institucional, como o Comitê de Ética, seja extra institucional, através da intervenção o Poder Judiciário.
Quanto ao conteúdo, a doutrina dominante destaca que poderá conter disposições
a) de recusa a certos tratamentos que prolonguem artificialmente a vida, em contraste com a sua qualidade;
b)  sobre a nomeação de representante para executar o documento nos casos de o paciente não mais conseguir fazê-lo pessoalmente; e
c) disciplinando acerca da doação de órgãos.
Porém, compartilhando do entendimento de LUCIANA DADALTO PENALVA,[121] ressaltamos que as disposições acerca da doação de órgãos no testamento vital podem desvirtuar seu objetivo, não bastassem ser desnecessárias, na medida em que a doação de órgãos no Brasil já é regulada pela Lei 9.434/1997, alterada pela Lei 10.211/2001.
Importante verificar que o cumprimento da manifestação de vontade do paciente terminal, externada através do testamento vital, deverá comportar certos limites, como a proibição de se levar a cabo disposições:
a)  contrárias ao ordenamento jurídico brasileiro;
b)  contraindicadas à patologia do paciente; e
c)  superadas pelo avanço da medicina.
A primeira limitação se justifica no fato de que, revestindo-se em documento que, a priori, apenas veicularia o desejo de o paciente não se submeter a tratamentos obstinados terapeuticamente, poderia a vontade do paciente se caracterizar em real prática intervencionista proibida pelo ordenamento jurídico, a exemplo da abreviação da vida.
A proibição de disposições contraindicadas à patologia do paciente também é salutar, na medida em que o testamento vital, antes de qualquer coisa, defende o direito à morte digna, e não o suposto direito de morrer.
Dessa forma, entende-se que o paciente não poderá dispor sobre a recusa dos chamados cuidados paliativos, posto que, objetivando proporcionar a atenção básica necessária a manutenção da qualidade de vida no seu fim, verdadeiramente retratam o princípio constitucional da dignidade da pessoa humana.
Assim, interpretando-se a segunda limitação, tem-se que só serão aceitas no testamento vital disposições que digam respeito à recusa de tratamentos fúteis, estes compreendidos como a intervenção médica que, objetivamente, não trará benefícios ao paciente, ou, na conceituação outrora analisada de GENIVAL VELOSO FRANÇA, “que não tem objetivo imediato, que é inútil ou ineficaz, que não é capaz de oferecer uma qualidade de vida mínima e que não permite uma possibilidade de sobrevida”,[122] devendo-se ter em mente, entretanto, que “os tratamentos não são fúteis em si, mas fúteis em relação a um objetivo”.[123]
Por sua vez, a proibição de se levar a cabo disposições superadas pelo avanço da medicina é necessária porque, entre a feitura da declaração prévia de vontade e a efetiva necessidade de sua utilização, poderá ter decorrido lapso temporal considerável, que, conjugado ao surgimento de tratamentos inexistentes à época da manifestação de vontade, poderia determinar a suspensão de esforço terapêutico em casos que não mais se caracterizam como obstinação terapêutica.
Poderá também o efetivo cumprimento do testamento vital sofrer limitação por objeção de consciência do médico, na medida em que o atual Código de Ética Médica (Resolução CFM 1.931/2009) o reveste de autonomia profissional para recusar-se a realizar certos serviços, vejamos:
Capítulo I (princípios fundamentais)
VII – O médico exercerá sua profissão com autonomia, não sendo obrigado a prestar serviços que contrariem os ditames de sua consciência ou a quem não deseje, excetuadas as situações de ausência de outro médico, em caso de urgência ou emergência, ou quando sua recusa possa trazer danos à saúde do paciente.
Capítulo II (Direitos dos médicos)
É direito do médico:
IX – Recusar-se a realizar atos médicos que, embora permitidos por lei, sejam contrários aos ditames de sua consciência.[124]
Entretanto, nesse caso se entende que o médico deverá respaldar sua recusa, seja por motivos éticos, morais, religiosos ou qualquer outro de foro íntimo, e outro profissional deverá ser designado para acompanhar o paciente.
No tocante a lavratura do testamento vital, tratando-se de negócio jurídico solene, embora não se tenha a definição de uma forma especial, entende-se mais adequado seja realizada por escritura pública no Cartório competente, mormente só assim poderá surtir efeitos erga onmes, é dizer, cônjuge, companheiro, amigos, filhos, eventual representante legal, instituições de saúde e médicos, estes últimos com a ressalva supra, estarão atrelados aos seus termos, cabendo-lhes dar fiel cumprimento às diretrizes antecipadas pelo paciente em momento de lucidez.
Todavia, tais efeitos somente surtirão em situações de terminalidade de vida e apenas a partir da inscrição no prontuário médico de que existe um testamento vital, cabendo realçar que ao médico incumbe fazer tal anotação, bem como anexar o documento de vontades antecipadas ao histórico clínico do paciente.
No mais, defende-se a criação de um Registro Nacional de Declarações Prévias de Vontade do Paciente Terminal, ou seja, um banco de dados onde serão eletronicamente depositados os testamentos vitais a fim de possibilitar maior efetividade no cumprimento da vontade do paciente, cabendo ao Cartório encaminhar o testamento vital a tal registro em prazo exíguo, evitando que a declaração de vontade se torne inócua.[125]
A criação online desse banco armazenador de testamentos vitais, além de possibilitar maior efetividade no cumprimento das disposições contidas em tais documentos, proporcionaria, pelo fato de está interligado a rede mundial de computadores, a atualização em tempo real nos mais diversos espaços do globo terrestre.
Diante desse dinamismo, advoga-se que não há que se falar em validade predeterminada de tais testamentos vitais, podendo a declaração de vontade ser livremente revogada e/ou alterada até a prática do ato concreto, enquanto, obviamente, o autor do instrumento tiver a competência que detinha quando da feitura do mesmo.[126]
Há quem entenda, porém, que o testamento vital deve conter um prazo de validade, sob o argumento de que tal documento não pode ser esquecido no tempo após sua elaboração, bem ainda que a medicina avança a passos largos e, consequentemente, determinada enfermidade considerada incurável na data de elaboração do documento talvez já tenha se tornado curável no momento de sua aplicação.
Enfim, defende-se que o testamento vital é instrumento válido no atual ordenamento jurídico do Brasil, estando legitimado pela interpretação integrativa do nosso sistema jurídico, sobretudo pela força do princípio constitucional da dignidade da pessoa humana. Contudo, entende-se que uma lei específica sobre o tema é de suma importância para dispor sobre questões formais e materiais atinentes, o que, certamente, facilitaria sua implementação no território nacional.
Deve-se ressaltar, todavia, que a efetiva regulamentação do testamento vital no ordenamento jurídico brasileiro, por si só, não abreviará a luta pela humanização no cuidado dos pacientes terminais, mas certamente terá o condão de “reforçar o direito social à morte digna e o direito subjetivo à vida, que deve ser gozada de forma harmônica, respeitando os limites do corpo, dos sentimentos e do tempo”.[127]

LEÃO, Thales Prestrêlo Valadares. Da (im)possibilidade do testamento vital no ordenamento jurídico brasileiro. Jus Navigandi, Teresina, ano 18, n. 3626, 5 jun. 2013 . Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/24638>. Acesso em: 6 jun. 2013.

O direito à morte digna e o direito de morrer


A elaboração do testamento vital como meio de se registrar a complexa decisão de não prolongar a própria vida importa em fazer a distinção entre o direito à morte digna e o “direito de morrer”, a fim de realçar, afinal, qual deles efetivamente é resguardado pelo instrumento de diretiva antecipada.
Como se sabe, a vida é considerada o bem jurídico de mais alto valor, direito inalienável e intransferível, exigindo-se dever geral de abstenção no sentido de não lesar e não perturbar. Ademais, depreende-se que a Carta Magna brasileira é terminantemente favorável ao direito à vida, que é, sem dúvida, o primeiro e mais importante de todos os direitos fundamentais do homem.[69]
Em face de tamanha importância, CARLOS ALBERTO BITTAR acrescenta:
o direito à vida integra-se à pessoa até o seu óbito, abrangendo o direito de nascer, o de continuar vivo e o de subsistência, mediante trabalho honesto (CF, art. 7º), ou prestação de alimentos (CF, art. 230), pouco importando que seja idosa (CF, art. 230), nascituro, criança, adolescente (CF, art. 227), portadora de anomalias físicas ou psíquicas (CF, arts. 203, IV, 227, § 1º, II), que esteja em coma ou que haja manutenção do estado vital por meio de processo mecânico.[70]
Entretanto, diante de todos os direitos fundamentais, não se deve ver o direito à vida isoladamente, cabendo considerar que tal direito não é absoluto nem exatamente um dever, sob pena de se transformar a vida em direito para quem a deseja e obrigação para quem não a quer.
Por tais razões, no âmbito da ética da vida, normalmente nos deparamos com dois tipos de discursos: o parenético e o científico. Naquele, a vida é verdadeira propriedade de Deus e ao homem incumbe apenas administrá-la, isto é, trata-se de um valor absoluto que só a Deus pertence e, consequentemente, o ser humano não tem nenhum direito sobre a vida própria e alheia; ao tempo em que, no segundo discurso, igualmente a vida é um dom recebido, porém fica à disposição daquele que o recebe, com a tarefa de valorizá-lo qualitativamente, o que nos permite reconhecer ser o homem protagonista da sua própria existência.[71]
Assim, quando se fala em sacralidade da vida, utiliza-se a explicação parenética e, ao se falar em qualidade de vida, o discurso científico, de tal modo que, naquele âmbito, o princípio fundamental é a inviolabilidade da vida e, com base na abordagem científica, a qualidade de vida é o valor fundamental.
Todavia, a sacralidade e a qualidade de vida não precisam ser dois vetores oponentes, sendo necessário, no atual estágio da civilização humana, conjugar as duas abordagens, conforme bem se posiciona HUBERT DOUCET:
O caráter sagrado da vida não se opõe necessariamente à qualidade de vida. Na tradição judaico-cristã as duas dimensões se comunicam. Em nossas sociedades ocidentais, saídas dessa tradição, a preservação da vida humana é um valor fundamental mas não absoluto. A presunção em favor da vida deve ser temperada, se não o absolutismo do princípio poderia conduzir ao desrespeito de certos doentes.[72]
Desse modo, é de se considerar a existência de uma disponibilidade controlada ou parcial da vida, tendo em vista que “quando a vida física é considerada um bem supremo e absoluto, acima da liberdade e da dignidade, o amor natural pela vida se transforma em idolatria, [...] organizando a fase terminal como uma luta a todo custo contra a morte”[73], o que não significa, porém, legitimar o direito de morrer, mas, pelo contrário, ressaltar a dignidade no momento da morte.
Nesse ponto, então, a partir da noção de vida digna, analisada sob o prisma da saúde como qualidade de vida ou bem-estar biopsicossocial do ser humano, inserido em seu contexto histórico, sociocultural e ambiental, possibilitando o pleno desenvolvimento da pessoa,[74] ROXANA CARDOSO BRASILEIRO BORGES conceitua morte digna como
a recusa de se submeter às manobras tecnológicas que só fazem prolongar a agonia. É um apelo ao direito de viver uma morte de feição humana (...) significa o desejo de reapropriação de sua própria morte, não objeto da ciência, mas sujeito da existência.[75]
De mais a mais, morrer com dignidade é “a reivindicação por vários direitos, como a dignidade da pessoa, a liberdade, a autonomia, a consciência, refere-se ao desejo de se ter uma morte humana, sem o prolongamento da agonia por parte de um tratamento inútil”.[76]
Não se trata de defender qualquer procedimento que antecipe ou cause a morte do paciente, mas de reconhecer sua liberdade e sua autodeterminação, dando-lhe permissão para morrer com seu caráter, com sua personalidade e com seu estilo,[77] diferentemente do “direito de morrer”, que teoricamente seria o direito de o indivíduo, que esteja em estado terminal ou até mesmo saudável, submeter-se a procedimentos que causem ou antecipem a sua morte, a exemplo da eutanásia, o que, consoante outrora relatado, não se admite no Brasil.
O direito de morrer tampouco deve ser confundido e/ou fundamentado no direito que o paciente tem de não ser constrangido a submeter-se, com risco de vida, a tratamento médico ou a intervenção cirúrgica (CC/02, art. 15), na medida em que o que se visa através dessa regulamentação no Código Civil é justamente à preservação da integridade do corpo humano diante de situações em que um tratamento médico necessário a longo prazo para o restabelecimento do enfermo possa colocar em risco a sua própria vida, ou seja, o bem jurídico tutelado é a própria vida do cidadão, que estaria em risco por conta de um tratamento apontado como necessário.
Logo, a diferença entre o direito à morte digna e o direito de morrer é salutar, na medida em que o testamento vital, objetivando evitar o prolongamento da vida através de meios artificiais que põem em cheque o próprio bem estar do paciente, busca resguardar tão somente aquele, e não propriamente um suposto direito generalizado de o ser humano ceifar a própria vida, sobretudo quando não se concebe que o seu titular possa dela dispor, haja vista que a vida não é uma concessão jurídico-estatal nem tampouco um direito a si mesmo.[78]

LEÃO, Thales Prestrêlo Valadares. Da (im)possibilidade do testamento vital no ordenamento jurídico brasileiro. Jus Navigandi, Teresina, ano 18, n. 3626, 5 jun. 2013 . Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/24638>. Acesso em: 6 jun. 2013.

Testamento vital: generalidades


  Deste longa data, objetivando conquistar segurança jurídica nas suas relações interpessoais, o homem se preocupou em eternizar a ocorrência dos mais variados fatos, inclusive a exteriorização de suas idéias, em um documento, tido como sendo toda coisa que, por força de uma atividade humana, seja capaz de representar um fato[54] ou na qual estejam inseridos símbolos que tenham aptidão para transmitir idéias ou demonstrar a ocorrência de fatos.[55]
Assim, aliado a percepção de que, “na hora da morte e do prolongamento da angústia de um indivíduo, o que ocorre é que parece haver desejo em não se respeitar a mesma dignidade garantida nos procedimentos da vida”,[56] nos tempos atuais é vigorosa a expansão do chamado testamento vital, conceituado pela tradicional doutrina como
documento em que a pessoa determina, de forma escrita, que tipo de tratamento ou não tratamento que deseja para a ocasião em que se encontrar doente, em estado incurável ou terminal, e incapaz de manifestar sua vontade;[57]
instrumentos legales que expresan en forma escrita las preferencias de tratamientos o cuidados que se desean o que no se desean en caso de encontrarse en una situación que disminuya considerablemente o que elimine la capacidad de dar el propio consentimiento;[58]
documento em que a pessoa poderá esclarecer sua vontade quanto aos tipos de procedimentos médicos que deverão ser realizados no caso de encontrar-se doente, em estado terminal ou incurável, sem que possa transmitir seu interesse, podendo até manifestar-se pelo não tratamento;[59]
documento elaborado por uma determinada pessoa que, mediante diretrizes antecipadas, realizadas em situação de lucidez mental, declara a sua vontade, autorizando os profissionais médicos, no caso de doenças irreversíveis ou incuráveis, em que já não seja mais possível expressar a sua vontade, a não prolongarem o tratamento;[60] ou ainda
ato unilateral de vontade onde o declarante, com lucidez e convicção, atestadas por um especialista, expressa seu desejo, perante duas testemunhas de, em situações terminais, na hipótese de ser acometido de uma doença grave, ou no caso de um acidente que acarrete um quadro de inconsciência permanente, ser evitado o prolongamento da vida por meios artificiais.[61]

Ademais, também a Associação Médica Mundial definiu o que se entende por testamento vital: “documento escrito e assinado ou declaração verbal perante testemunhas no qual uma pessoa expressa seus desejos em relação à atenção médica que quer ou não receber se estiver inconsciente ou se não puder expressar sua vontade”.[62]
Dessa forma, caracteriza-se por ser aplicado nos casos de quadros clínicos terminais, sob um estado permanente de inconsciência ou um dano cerebral irreversível que não possibilite a capacidade de a pessoa se recuperar e tomar decisões, e é de suma importância para determinar que a pessoa não deseja submeter-se a tratamento para prolongamento da vida de modo artificial, às custas de sofrimento, evitando medidas invasivas contra a sua real vontade. 
Ocorre que o testamento vital é apenas espécie do gênero diretivas antecipadas, que contempla ainda o mandado duradouro,[63] “documento no qual o paciente escolhe uma pessoa que deverá tomar decisões em seu nome, quando o próprio paciente não puder exprimir mais sua vontade”,[64] ou seja, “documento no qual o paciente nomeia um ou mais procuradores que deverão ser consultados pelos médicos na circunstância de sua incapacidade – terminal ou não –, para decidirem sobre o tratamento ou não”.[65]
Vê-se que o testamento vital é um documento mais abrangente que o mandado duradouro, na medida em que, não bastasse ser possível incluir em suas disposições a nomeação de um procurador, efetivamente contém as diretrizes sobre aceitação e recusa de tratamento, enquanto o mandado duradouro é apenas um instrumento de nomeação de um procurador.
Todavia, “o mandado duradouro tem um alcance mais amplo porque demonstra seus efeitos cada vez que a pessoa que o outorgou seja incapaz de tomar uma decisão, ainda que de forma temporária”,[66] ao passo em que o testamento vital somente produzirá efeito nos casos de incapacidade definitiva do paciente.
Por tal razão, alerta-se que, caso a pessoa queira fazer as duas modalidades de diretivas antecipadas, as faça separadamente, considerando que, aglutinando apenas no formato testamento vital a nomeação de um procurador e as diretrizes sobre aceitação e recusa de tratamento, a atuação do procurador em caso de incapacidade temporária do outorgante restaria inviabilizada.
Por fim, convém ressaltar que o termo testamento vital[67], tecnicamente, sob o ponto de vista jurídico, mostra-se inadequado, pois remete para o instituto do testamento[68] e, não obstante, prescinde da sua característica essencial, qual seja, ser negócio jurídico com efeito causa mortis, produzindo, ao contrário, efeitos inter vivos, ainda que imediatamente antes da ocorrência da morte.
Assim, tem-se como mais adequada a expressão “declaração prévia de vontade do paciente terminal”, haja vista que o “testamento vital” é, na realidade, uma declaração de vontade manifestada pelo paciente terminal anteriormente à situação de terminalidade.    Entretanto, tendo em vista que “testamento vital” é o nome pelo qual no Brasil é mais conhecido, este continuará por nós a ser utilizado, apesar de sua imprecisão técnico-jurídica.

LEÃO, Thales Prestrêlo Valadares. Da (im)possibilidade do testamento vital no ordenamento jurídico brasileiro. Jus Navigandi, Teresina, ano 18, n. 3626, 5 jun. 2013 . Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/24638>. Acesso em: 6 jun. 2013.

Estado clínico terminal e seus reflexos sob a autonomia do paciente

No contexto da terminalidade da vida, impõe-se compreender o quadro clínico daquele paciente considerado em estado terminal e, em face desse estágio de vulnerabilidade, analisar o grau de autonomia que ainda lhe resta, sobretudo no que se refere a capacidade para decidir sobre o rumo do seu próprio tratamento.

Em que pese a conceituação de paciente terminal não seja algo simples de se estabelecer, cumprindo-nos desde logo ressaltar que não existem critérios universalmente aceitos para identificar um doente como terminal, diversas são as contribuições doutrinárias que tentam objetivar ou, quando menos, possibilitar o reconhecimento do ser humano neste peculiar momento de sua vida.

Segundo ELENA SUÁREZ, paciente terminal é

la persona que sufre una enfermedad irreversible, cuya muerte se espera ocurra a pesar de todos los esfuerzos a nuestro alcance, es decir, está em el processo final de su vida, vivendo de acuerdo a sus circunstancias individuales, familiares, socioculturales y las de su entorno.[11]

Por outro lado, DANIEL SERRÃO e ISABEL MARIA PINHEIRO BORGES MOREIRA definem tal paciente, respectivamente, como “os doentes a quem os cuidados paliativos são dirigidos, isto é, sem possibilidades de cura e que se sabe que a sua morte está próxima”[12] e “aquele que vive um estágio ou uma etapa final de uma doença avançada, progressiva e incurável”,[13] ao passo em que CLÉCIO RAMIRES RIBEIRO destaca o seguinte:

O paciente terminal é portador de uma enfermidade letal e a experiência clínica demonstra que morrerá em prazo relativamente curto, medido provavelmente em dias ou semanas, não em meses ou anos. [...] O comprometimento severíssimo de muitos órgãos indica que pode ser esperada em questão de horas.[14]

Por sua vez, MANUEL GONZÁLEZ BARÓN[15] enumera 7 (sete) critérios que considera relevantes para diagnosticar um doente em fase terminal, quais sejam:

1) doença de evolução progressiva;
2) perspectiva de vida não superior a 2 (dois) meses;
3) insuficiência de 1 (um) órgão;
4) ineficácia comprovada dos tratamentos alternativos para a cura;
5) ineficácia comprovada dos tratamentos alternativos para o aumento da sobrevivência;
6) complicações irreversíveis finais; e
7) estado geral grave inferior a 40% na Escala Karnofski.[16]

Finalmente, discorrendo acerca do estado clínico terminal, PILAR LECUSSAN GUTIERREZ e MARIA JÚLIA KOVÁCS, respectivamente, asseveram:

É quando se esgotam as possibilidades de resgate das condições de saúde do paciente e a possibilidade de morte próxima parece inevitável e previsível. O paciente se torna "irrecuperável" e caminha para a morte, sem que se consiga reverter este caminhar.[17]

O conceito de paciente terminal é historicamente relacionado com o século XX, por causa da alteração das trajetórias das doenças, que em outras épocas eram fulminantes. Hoje, observa-se uma cronificação das doenças, graças ao desenvolvimento da medicina, da cirurgia e da farmacologia. [...] O doente passa por vários estágios desde o diagnóstico, os tratamentos, a estabilização, a recidiva e o estágio final da doença.[18]

Vê-se, portanto, que a idéia de paciente em estado terminal perpassa pela noção de está tal indivíduo acometido de patologia grave que, ainda que se esgotem os esforços com o escopo de proporcionar a reversão da enfermidade, esta se mostra irreversível e a morte revela-se iminente.

Todavia, não significa afirmar, necessariamente, que o doente em estado terminal, em razão desse quadro clínico, não teria condições de se portar autonomamente em relação aos diversos atos da vida civil e, especificamente, ao modo de encarar e determinar o desenvolvimento do seu próprio tratamento médico, considerando-se autônoma a pessoa que “não somente delibera e escolhe seus planos, mas que é capaz de agir com base nessas deliberações”.[19]

De outro giro, é forçoso reconhecer que, na maioria das vezes, diante do grau de debilidade em que se encontra imerso tal paciente, há situações em que, verdadeiramente, sua capacidade de gerir-se com autonomia é severamente reduzida ou até mesmo aniquilada, não estando em condições de externar qualquer ato autonomamente.

Nesses casos, embora, em consonância com o princípio bioético da autonomia,[20] continue a ter o direito de decidir sobre seu tratamento médico, por óbvio não poderá exercê-lo pessoalmente, motivo pela qual a decisão competirá ao seu representante legal que, invariavelmente, é algum de seus familiares mais próximos.

Com efeito, alerta MARIA HELENA DINIZ[21] que se a equipe médica observar que o responsável não está agindo de acordo com os interesses do paciente, terá o dever ético-legal de submeter à apreciação do Poder Judiciário a decisão informada pelo representante legal. Ademais, destaca que, incapaz o paciente de dar seu consentimento e inexistindo familiares, as ações da equipe médica fundam-se no princípio da beneficência,[22] podendo-se falar em consentimento presumido do doente, mormente o fato de que, quedando-se inerte o médico em circunstância grave e de iminente perigo de vida, poderá ser punido por omissão de socorro, a teor do que dispõe o art. 135 do Código Penal brasileiro.

É justamente nessa seara que emerge a importância de se questionar a possibilidade ou não de o médico, diante da incapacidade do paciente pessoalmente decidir sobre seu próprio tratamento clínico e da ausência de regulamentação específica no ordenamento jurídico brasileiro, bem ainda de diversas outras condicionantes, a exemplo da sua autonomia técnico-profissional, simplesmente levar a termo o desejo anteriormente expresso pelo doente através de um documento de diretrizes antecipadas por este assinado.

LEÃO, Thales Prestrêlo Valadares. Da (im)possibilidade do testamento vital no ordenamento jurídico brasileiro. Jus Navigandi, Teresina, ano 18, n. 3626, 5 jun. 2013 . Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/24638>. Acesso em: 6 jun. 2013.