quarta-feira, 20 de abril de 2016

Responsabilidade civil dos condomínios edilícios por furtos e danos de veículos ocorridos em seu interior.

Este texto visa estabelecer alguns parâmetros de aplicabilidade da norma consumerista e de responsabilização civil das partes por atos ilícitos cometidos no interior de condomínios edilícios.
Para atender a tal desiderato, primeiramente, é necessário que no atentemos à possibilidade de direcionar a resolução de um conflito de interesses para o conteúdo normativo (princípios e regras) do Código de Defesa do Consumidor (CDC). Para tanto, é necessário verificar se as partes envolvidas – condomínio e moradores – são legítimas, se podem se valer do microssistema e, com isso, receber tratamento diferenciado.
O CDC possui três características importantes, tratando-se de ummicrossistema autônomo, de uma lei principiológica, e que contém normas de ordem pública e de interesse social[1].
A relação de consumo pressupõe a existência da figura de um consumidor e de um fornecedor, com as equiparações previstas no próprio CDC. Essa é a condição necessária e suficiente para serem aplicadas as normas do CDC. É assente, no entanto, na doutrina e jurisprudência, que o CDC não se aplica ao âmbito interno do condomínio, ou seja, entre condôminos.
O condomínio não tem personalidade jurídica. Não é pessoa física nem jurídica. Não presta serviços mediante remuneração. Constitui-se em uma comunhão de interesses, pela qual são rateadas despesas. Não tem objetivo de lucro, distinguindo-se, assim, das sociedades.
 O condomínio nada mais é, em essência, que a massa ou o conjunto de condôminos, isto é, o complexo de co-proprietários da coisa comum. Ora, não teria sentido imaginar que cada um dos co-proprietários pudesse ser considerado “consumidor” em relação aos demais e que estes, por sua vez, pudessem ser tidos na qualidade “fornecedores” de “produtos” e/ou de “serviços” uns aos outros, co-respectivamente, pois isto não só contrariaria a natureza mesma das coisas como aberraria dos princípios e das normas jurídicas disciplinadoras da espécie, destoando por completo da realidade e da lógica mais complementar.
Ademais,
não existe verdadeira e própria relação de consumo, não podendo o condomínio, a toda evidência, ser considerado “fornecedor de produtos e serviços”, nem o condômino “consumidor final” de tais “produtos e serviços”, como é de meridiana clareza, ou, em outros termos, de primeira, elementar e inafastável intuição.[2]
À evidência, a relação jurídica estabelecida entre os condôminos e o condomínio não pode ser tutelada pelo CDC.
Note que o condômino é responsável pelo pagamento das despesas condominiais, inexistindo a posição de consumidor final exigida pelo art. 2º do CDC. O condomínio, por sua vez, é responsável pela administração, fiscalização e pelos investimentos dos valores recebidos no empreendimento imobiliário, inexistindo a posição de fornecedor de produto ou serviço exigida pelo art. 3º do CDC.
Nesse sentido, é a jurisprudência do STJ:
CIVIL E PROCESSUAL. AGRAVO NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE RESTITUIÇÃO. CONTRATO DE EDIFICAÇÃO POR CONDOMÍNIO. CDC. INAPLICABILIDADE. INCIDÊNCIA DA LEI N. 4.591/64. – Na hipótese de contrato em que as partes ajustaram a construção conjunta de um edifício de apartamentos, a cada qual destinadas respectivas unidades autônomas, não se caracteriza, na espécie, relação de consumo, regendo-se os direitos e obrigações pela Lei n. 4.591/64. – Agravo não provido. (AgRg no Ag 1307222/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, j. em 04/08/2011, DJe 12/08/2011).
CIVIL E PROCESSUAL. CONTRATO DE EDIFICAÇÃO POR CONDOMÍNIO. AÇÃO DE COBRANÇA E INDENIZAÇÃO MOVIDA POR CONDÔMINOS CONTRA OUTRO. MULTA. REDUÇÃO. CDC. INAPLICABILIDADE. INCIDÊNCIA DA LEI N. 4.591/64, ART. 12, § 3º. I. Tratando-se de contrato em que as partes ajustaram a construção conjunta de um edifício de apartamentos, a cada qual destinadas respectivas unidades autônomas, não se caracteriza, na espécie, relação de consumo, regendo-se os direitos e obrigações pela Lei n. 4.591/64, inclusive a multa moratória na forma prevista no art. 12, parágrafo 2º, do referenciado diploma legal. II. Recurso especial conhecido e provido. (REsp 407.310/MG, Rel. Ministro ALDIR PASSARINHO JUNIOR, QUARTA TURMA, j. em 15/06/2004, DJ 30/08/2004, p. 292).
Por conseguinte, a relação jurídica existente entre condômino e condomínio edilício é regida pela Lei de Condomínio e Incorporações Imobiliárias, isto é, pela Lei n. 4.591/64.
Neste momento, portanto, diante da não aplicação do CDC às relações entre condômino/condomínio, e da existência de legislação específica regulamentando essa relação, cabe-nos analisar a responsabilidade dos condomínios edilícios em casos de furto e danos de veículos estacionados em seu interior.
A bem da verdade, a legislação condominial é absolutamente silente no que tange à hipótese de responsabilidade civil no condomínio edilício, o que impõe algumas considerações prévias acerca dessa responsabilidade.
Como cediço, a ação de indenização fundada em responsabilidade civil de direito comum é regulamentada pelo art. 186 do atual Código Civil brasileiro, que dispõe: “Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.”.
Com efeito, para surgir o dever de indenizar, é necessário que concorram três elementos: dano, entendido como a ocorrência do efetivo prejuízo; conduta culposa do agente e nexo de causalidade entre um e outro, que pode não se estabelecer, caso se comprove ter sido o dano provocado por agente externo ou decorrente de culpa exclusiva da vítima.
Considerando tais elementos, há entendimento de que o condomínio é responsável por furtos e danos em seu interior, pois, raramente, há interesse dos condomínios em assumir tal responsabilidade por escrito, em convenção, regulamento interno ou assembleia geral:
Com a utilização de modernos sistemas de segurança e com a contratação, cada vez mais frequente, de guardas particulares ou de empresas de vigilância e segurança armada, a responsabilidade dos condomínios pela subtração criminosa de bens das unidades privativas passa a mudar de feição. Isso porque as despesas para a compra e a utilização de bens e equipamentos de segurança, como circuito fechado de câmeras e TV, sistemas de gravação de imagens em tempo real e botões antipânico, bem como para a contratação de serviços de ronda, vigilância e segurança armada, são todas arcadas pelos condôminos, que, no final das contas, buscam um maior resguardo de sua integridade física e de seus bens.
Ainda:
Se o condomínio utiliza sistema de vigilância próprio ou contrata empresa de segurança privada e armada, ainda que não haja previsão em convenção ou regulamento, passa a assumir a obrigação de zelar pela integridade dos proprietários e dos bens das unidades autônomas[3].
Esse entendimento, no entanto, não vem prevalecendo no âmbito da jurisprudência. De acordo com o Superior Tribunal de Justiça (STJ), para que o condomínio possa ser responsabilizado por furtos ou danos ocorridos nas áreas comuns ou na garagem do edifício, é necessário que haja, na convenção de condomínio ou no regimento interno, cláusula expressa prevendo tal responsabilidade. Nesse sentido:
AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE DO CONDOMÍNIO POR FURTO EM ÁREA COMUM. NECESSIDADE DE PREVISÃO EXPRESSA NA CONVENÇÃO DE CONDOMÍNIO. AUSÊNCIA DA CONVENÇÃO OU REGIMENTO INTERNO DO CONDOMÍNIO. AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 1. Ausente a Convenção de Condomínio, ou Regimento Interno do mesmo, inviável aferir se há previsão expressa de responsabilidade nos casos de furto em área comum. A presença da cláusula é condição para a responsabilização do condomínio nos termos da jurisprudência pacífica desta Corte. Precedentes. 2. Agravo regimental a que se nega provimento. (AgRg no AREsp n. 9.107/MG, Relator o Ministro Luis Felipe Salomão, DJe de 24/8/2011.)
RESPONSABILIDADE CIVIL – CONDOMÍNIO – SUBTRAÇÃO DE EQUIPAMENTO DE SOM E DE PERTENCES DEIXADOS NO INTERIOR DE AUTOMÓVEL ESTACIONADO NA GARAGEM COLETIVA DO PRÉDIO – INEXISTÊNCIA DE PREPOSTO, COM A INCUMBÊNCIA DE GUARDAR E VIGIAR OS VEÍCULOS – ENCARGO DE PROMOVER VIGILÂNCIA, COMETIDO AO SÍNDICO, EM CARÁTER GENÉRICO, QUE HAVERÁ DE SER EXERCIDO EM SINTONIA COM OS MEIOS POSTOS À SUA DISPOSIÇÃO, PELO ORÇAMENTO DE RECEITAS – INEXISTÊNCIA DE APARATO ESPECÍFICO DE VIGILÂNCIA E SEGURANÇA – SUBTRAÇÃO, ADEMAIS, QUE TERIA SIDO COMETIDA, COM AMEAÇA A MÃO ARMADA – NÃO CONFIGURAÇÃO DE CULPA IN VIGILANDO– RECURSO ESPECIAL CONHECIDO E PROVIDO. – Ao contrário da posição adotada pela Corte de origem, mostra-se relevante a necessidade expressa previsão na convenção ou, ainda, de deliberação tomada em assembleia no sentido de que o condomínio tenha, especificamente, serviço de guarda e vigilância de veículos. In casu, a circunstância de existir porteiro ou vigia na guarita não resulta em que o condomínio estaria a assumir a prefalada guarda e vigilância dos automóveis, que se encontram estacionados na área comum, a ponto de incidir em responsabilidade por eventuais subtrações ou danos perpetrados. – Em harmonia com os precedentes desta Corte Superior, bem como com lições doutrinárias, merece acolhida o inconformismo, a repercutir na inversão do ônus da sucumbência. – Recurso especial conhecido e provido. (REsp n. 618.533/SP, Relator o Ministro Hélio Quaglia Barbosa, DJ de 4/6/2007).
Sobre o tema, Rui Stoco pontifica:
Os edifícios em condomínio não respondem, como regra, pelo furto de veículos, seus acessórios ou objetos neles deixados, quando estacionados na garagem do prédio. Ao estacionar seu veículo na vaga de garagem existente no prédio o condômino ou apenas morador ou usuário não transfere a sua guarda à administração do condomínio, nem entre eles se estabelece um contrato de depósito. Aliás, quase sempre as convenções de condomínio trazem disposição nesse sentido, pois, como ali está firmado, as vagas de garagem constituem unidades agregadas à própria unidade residencial ou comercial pertencente ao usuário. Com essa previsão expressa de inexistência de garantia, o condômino, locatário ou mero usuário já não poderá alegar ignorância, posto que alertado, de modo que lhe caberá tomar maiores providências no que pertine à segurança, mantendo seu veículo permanentemente trancado, com os vidros fechados; não deixando objetos de valor visíveis em seu interior; instalando alarme, trava de segurança, sistema de corte de combustível e mantendo seguro do veículo. A obrigação de guarda só pode prevalecer se estiver expressamente prevista na Convenção ou no Regulamento Interno do condomínio ou se este mantiver guarda ou vigilante para o fim específico de zelar pela incolumidade dos veículos estacionados na garagem do prédio.[...] Portanto, para que se possa responsabilizar o condomínio, seria necessário que, por deliberação dos condôminos, determinadas medidas de segurança devessem ser adotadas e houvessem falhado no caso concreto, por culpa do síndico ou de algum preposto[4]
Dessa forma, o condomínio só responde por furtos e danos de veículos ocorridos nas suas áreas comuns se isso estiver expressamente previsto na respectiva convenção de condomínio ou em seu regimento interno.
E um ponto aqui merece nossa especial atenção: mostra-se relevante a necessidade de expressa previsão na convenção ou no regimento interno de que o condomínio tenha, especificamente, serviço de guarda e vigilância de veículos. O simples fato de haver porteiro ou vigia na guarita não resulta na conclusão de que o condomínio estaria a assumir a guarda e vigilância dos veículos estacionados na área comum, a ponto de incidir em responsabilidade por eventuais subtrações ou danos perpetrados.
O fato de existir cerca elétrica e câmera de segurança ou de haver contratado empresa para prestação de serviços de zeladoria não significa que o condomínio assumiu tacitamente a obrigação de guarda dos bens dos condôminos e não afasta a cláusula de exclusão prevista em convenção. Nem mesmo a falta de funcionamento dos equipamentos, que sequer são capazes de obstar a prática de ilícitos, enseja o dever de indenizar.
Nesse sentido, o Colendo Tribunal de Justiça de São Paulo:
Responsabilidade civil. Indenização por dano moral e material. Furto em loteamento fechado. Estatutos da associação de moradores não fixam a obrigação de indenizar eventual dano ao patrimônio. A mera existência de portaria e controle de pessoas não constitui fator capaz de gerar direito de reparação por atos ilícitos praticados por terceiros. Ausência de imputação de culpa à ré. Recurso da ré provido, prejudicado o recurso adesivo interposto pelo autor. (Apelação Cível n. 0274535-04.2009.8.26.0000, 10ª Câmara de Direito Privado, Rel. Coelho Mendes, j. em 30.07.2013).
Ademais, é possível que a própria convenção condominial exclua expressamente a responsabilidade do condomínio, sendo, pois, lícito aos condôminos estabelecer como indevida indenização pelo condomínio em virtude de danos sofridos por veículos estacionados na garagem do edifício, sendo considerada válida a cláusula de não indenizar, consoante se verifica na ementa:
APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE INDENIZAÇÃO – FURTO EM UNIDADE CONDOMINIAL – PREVISÃO EXPRESSA DE AUSÊNCIA DE RESPONSABILIZAÇÃO NA CONVENÇÃO – INDENIZAÇÃO AFASTADA – RECURSO IMPROVIDO. Estabelecendo a Convenção/Regulamento cláusula de não indenizar, não há como impor a responsabilidade do condomínio por furtos ocorridos no seu interior, ainda que exista esquema de segurança e vigilância, porque não desqualifica a força da regra livremente pactuada pelos condôminos. (APELAÇÃO CÍVEL N. 1.0024.09.760305-4/001, Relator Des. Rogério Medeiros, DJ 29/05/2014).
Dessa forma, estabelecendo a convenção cláusula de não indenizar, não há como impor a responsabilidade do condomínio, ainda que exista esquema de segurança e vigilância, que não desqualifica a força da regra livremente pactuada pelos condôminos.
O conceito de responsabilidade não pode ser estendido a ponto de fazer recair sobre o condomínio o resultado do furto ou do dano ocorridos na área comum, numa indevida socialização do prejuízo. Isso porque o condomínio, embora incumbido de exercer a vigilância do prédio, não assume uma obrigação de resultado, pagando pelo dano porventura sofrido por algum condômino. Sofrerá, no entanto, pelo descumprimento da sua obrigação de meio se isso estiver previsto na convenção.
Ademais, havendo ou não cláusula excludente da responsabilidade, o condomínio tem o dever de indenizar se o furto ou dano for cometido, por exemplo, por vigia ou empregado do edifício, pois no caso configura-se culpa in eligendo do síndico na contratação de pessoal.
AÇÃO DE INDENIZAÇÃO – RESPONSABILIDADE CIVIL – CONDOMÍNIO – FURTO DE VEÍCULO OCORRIDO EM GARAGEM DE EDIFÍCIO – I. Consolidada na jurisprudência do STJ a orientação segundo a qual o condomínio de apartamentos é responsável por ato de seu preposto que causa dano a condômino, sobretudo quando deixa de exercer a devida vigilância. II. O depositário é obrigado a ter na guarda e conservação da coisa depositada o cuidado e diligência que costuma ter com o que lhe pertence (art. 1.266, 1ª parte, Código Civil). Se ela se danifica ou é furtada, responde aquele pelos prejuízos causados ao depositante, por ter agido com culpa in vigilando. (STJ – REsp 26.458-7 – SP - Rel. Min. Waldemar Zveiter –DJU 03.11.2009).           
Para nós, portanto, o entendimento jurisprudencial prevalecente parece ser o posicionamento mais razoável, partindo do pressuposto de que a responsabilidade do condomínio por crimes de furto e de dano ocorridos nas áreas comuns, gerando prejuízo aos condôminos, só será configurada quando prevista expressamente em convenção, regimento interno ou assumida em Assembleia Geral, dentre as normas preestabelecidas pelos condôminos, salvo na hipótese de culpa do preposto.

NOTAS
[1] SILVA, Rafael Simonetti Bueno da. Direito do Consumidor: Magistratura e Ministério Público. Questões comentadas. SILVA, Rafael Simonetti Bueno da; MASSON, Cléber Rogério (Coord.). Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2011.p. 17-18.
[2] Apelação n. 614098-00/2 – 2º TAC/SP – Juiz Milton Sanseverino. 3ª Câm., j. em 23/10/2001.
[3]MORAIS, Paulo. Responsabilidade civil do condomínio.Folha de S.Paulo Online. 02117. Disponível em: <http://www.morais.com.br/casos1.html>. Acesso em:25fev. 2016.
[4] STOCO, Rui. Tratado de Responsabilidade Civil. 6. ed.São Paulo: RT, 2004. p. 661-662.
SILVA, Rafael Simonetti Bueno da. Responsabilidade dos condomínios por furtos e danos de veículosRevista Jus Navigandi, Teresina,ano 21n. 467519 abr. 2016. Disponível em: <https://jus.com.br/artigos/47015>. Acesso em: 20 abr. 2016.

Fosfoetanolamina. STF arquiva MS contra lei da pílula do câncer.

Ministro Celso de Mello entendeu que MS viola a súmula 266 da Corte.

O ministro Celso de Mello, do STF, não conheceu e determinou o arquivamento do MS impetrado pela AMB - Associação Médica Brasileira contra a lei 13.269/16, que autoriza o uso da fosfoetanolamina sintética, conhecida como “pílula do câncer”, por pacientes diagnosticados com neoplasia maligna.
O relator apontou que o MS não pode ser conhecido, pois viola a súmula 266 do STF. Destacou que o MS somente deve ser utilizado sobre os atos destinados a dar aplicação concreta ao que se contiver nas leis ou em seus equivalentes constitucionais.
Esse entendimento doutrinário, por sua vez, expressa, de maneira clara, a própria jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, que sempre vem enfatizando, a propósito da matéria em exame, não serem impugnáveis, em sede mandamental, aqueles atos estatais cujo conteúdo veicule prescrições disciplinadoras de situações gerais e impessoais e regedoras de hipóteses que se achem abstratamente previstas em tais atos ou resoluções.”
O ministro Celso de Mello frisou ainda que a própria AMB propôs, perante o STF, a ADIn 5.501, relatada pelo ministro Marco Aurélio, na qual questiona a lei 13.269/16, “em clara atestação de que o diploma legislativo em referência qualifica-se como típico ato em tese, cujo teor – embora comportando a possibilidade de controle normativo abstrato – não admite possa ser ele impugnado na via do mandado de segurança”.
No MS, a associação argumenta que há um amplo desconhecimento sobre a eficácia e dos efeitos colaterais da fosfoetanolamina sintética em seres humanos. Por isso, a seu ver, a lei é incompatível com direitos constitucionais fundamentais, como o direito à saúde, à segurança e à vida, bem como o desrespeito ao princípio da dignidade da pessoa humana.
De acordo com a entidade, a substância teria sido testada unicamente em camundongos e surtido reação positiva, no combate do câncer melanoma, nesse tipo de animal. Além disso, a fosfoetanolamina sintética não passou pelos testes clínicos, em seres humanos, realizados nos termos da lei 6.360/76, e a Anvisa não concedeu o registro ao medicamento.
  • Processo relacionado: MS 34.145
http://www.migalhas.com.br/Quentes/17,MI237900,101048-STF+arquiva+MS+contra+lei+da+pilula+do+cancer

Sou médico anestesista, como posso ser responsabilizado em um processo judicial?

Publicado por Suzanna Borges de Macedo Zubko

O artigo desta semana trará a questão da responsabilidade do médico anestesista, especialmente abrangendo aqueles que atuam em hospitais, sem necessariamente pertencer ao corpo clínico da instituição. Na eventualidade de um processo judicial, qual a extensão da responsabilidade deste profissional? O hospital deve responder junto?
Primeiramente, importante relembrar que a relação médico-paciente ou hospital-paciente é de consumo, e a atualmente a jurisprudência tem entendido que aplica-se aos hospitais o caputdo art. 14 do Código de Defesa do Consumidor, e aos médicos, o parágrafo 4º do mencionado dispositivo legal. Vejamos.
Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.
§ 4º A responsabilidade pessoal dos profissionais liberais será apurada mediante a verificação de culpa.
Assim, muitos magistrados têm firmado entendimento pela responsabilização do hospital de maneira objetiva, isto é, sem aferir se houve de fato culpa no defeito verificado pelo consumidor. Já com os médicos, o entendimento é diferente, estes somente responderão se apurada sua culpa, ou seja, respondem de maneira subjetiva, vez que necessária comprovação técnica de: imprudência, imperícia ou negligência.
Nos ensinamentos de Carlos Roberto Gonçalves:
“A conduta imprudente consiste em agir o sujeito sem as cautelas necessárias, com açodamento e arrojo, e implica sempre pequena consideração pelos interesses alheios. A negligência é a falta de atenção, a ausência de reflexão necessária, uma espécie de preguiça psíquica, em virtude da qual deixa o agente de prever o resultado que podia e devia ser previsto. A imperícia consiste sobretudo na inaptidão técnica, na ausência de conhecimentos para a prática de um ato, ou omissão de providência que se fazia necessária; é, em suma, a culpa profissional. ”
Pois bem, conceituadas as modalidades de culpa do profissional liberal, relevante é o posicionamento do jurista Sergio Cavalieri, que ensina que a aferição de culpa do médico não abrangerá o hospital em que este labora.
“Embora seja o médico um prestador de serviços, o Código de Defesa do Consumidor, no § 4 do seu art. 14, abriu uma exceção ao sistema de responsabilidade objetiva nele estabelecido. [...] Devemos ter em mente, todavia, que o Código do Consumidor foi bem claro ao dizer que a exceção só abrange a responsabilidade pessoal do profissional liberal, não favorecendo, portanto, a pessoa jurídica na qual ele trabalhe como empregado ou faça parte da sociedade. “
Ou seja, em um processo judicial, a instituição hospitalar somente se isentaria de responsabilidade se, na verificação de prestação de serviço, inexistisse defeito, ou culpa exclusiva de terceiro (art. 14§ 3ºCDC).
§ 3º O fornecedor de serviços só não será responsabilizado quando provar:
I - que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste;
II - a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.
Tendo isso em mente, fica mais fácil de compreender a extensão da responsabilidade do médico anestesista, que é profissional da área médica como qualquer outro – irá responder subjetivamente. A discussão funda-se, por exemplo, quando o anestesista que não integra o corpo clínico do hospital, ou seja, não tem relação de subordinação direta, apenas consta de um “cadastro” de profissionais da instituição, e é demandando judicialmente, junto com o cirurgião chefe e a instituição.
Pois bem, o STJ (Superior Tribunal de Justiça) já enfrentou questão semelhante, e entendeu que o mero cadastro que os hospitais mantêm de médicos que utilizam suas instalações para performance de cirurgias, não caracteriza, por si só, relação de subordinação entre o profissional e a instituição. Isto é, não configura relação de trabalho/emprego.
RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. RESPONSABILIDADE CIVIL. ERRO MÉDICO. NEGLIGÊNCIA. INDENIZAÇÃO. RECURSO ESPECIAL. 1. A doutrina tem afirmado que a responsabilidade médica empresarial, no caso de hospitais, é objetiva, indicando o parágrafo primeiro do artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor como a norma sustentadora de tal entendimento. Contudo, a responsabilidade do hospital somente tem espaço quando o dano decorrer de falha de serviços cuja atribuição é afeta única e exclusivamente ao hospital. [...]. 3. O cadastro que os hospitais normalmente mantêm de médicos que utilizam suas instalações para a realização de cirurgias não é suficiente para caracterizar relação de subordinação entre médico e hospital. Na verdade, tal procedimento representa um mínimo de organização empresarial. [...]
(STJ - REsp: 908359 SC 2006/0256989-8, Relator: Ministra NANCY ANDRIGHI, Data de Julgamento: 27/08/2008, S2 - SEGUNDA SEÇÃO, Data de Publicação: -> DJe 17/12/2008)
Tal entendimento é muito válido para a defesa médica, pois é bastante comum que o anestesista atue sozinho, sem estar necessariamente vinculado ao hospital e seu corpo clínico. Contudo, se de fato for empregado da instituição ou compuser uma sociedade médica onde o cirurgião seja “chefe”, é possível configurar a responsabilização solidária. Nesse sentido está o art.932 do Código Civil e a Súmula 341 do STF (Supremo Tribunal Federal).
Art. 932. São também responsáveis pela reparação civil:
III - o empregador ou comitente, por seus empregados, serviçais e prepostos, no exercício do trabalho que lhes competir, ou em razão dele;
SÚMULA 341, STF - É presumida a culpa do patrão ou comitente pelo ato culposo do empregado ou preposto.
Ou seja, o Cirurgião chefe ou a instituição, responderão pelos atos de seus prepostos (empregados), sempre observando os requisitos para configuração de dever de indenizar: qual é o dano? É possível verificar nexo causal e a culpa dos agentes? Sobre isso, ensina o doutrinador Sergio Cavalieri:
“Em outras palavras: embora a equipe médica atue em conjunto, não há, só por isso, solidariedade entre todos os que a integram. Será preciso apurar que tipo de relação jurídica há entre eles. Se atuam como profissionais autônomos, cada qual em sua especialidade, a responsabilidade será individualizada, cada um respondendo pelos seus próprios atos, de acordo com as regras que disciplinam o nexo de causalidade [...] A responsabilidade será daquele membro da equipe que deu causa ao evento. [...]
Assim, se a cirurgia, propriamente dita, transcorreu sem problemas, não se pode responsabilizar o médico cirurgião pelo erro do anestesista, e vice-versa. Outra, todavia, será a solução se a equipe trabalha para o cirurgião (responsabilidade pelo ato do preposto), se todos integram uma sociedade ou se, ainda, trabalham para o hospital. ”
Assim, caso ocorra um erro durante uma cirurgia, causado exclusivamente pelo médico anestesista, somente este responderá pelo evento danoso. Salvo se estiver em relação de subordinação hierárquica com o cirurgião chefe ou hospital, aí estes responderão solidária e conjuntamente. Nesse compasso têm entendido o STJ (Superior Tribunal de Justiça):
[...] ERRO MÉDICO. RESPONSABILIDADE DOS MÉDICOS CIRURGIÃO E ANESTESISTA. CULPA DE PROFISSIONAL LIBERAL (CDC, ART. 14§ 4º). [...]
4. Na Medicina moderna a operação cirúrgica não pode ser compreendida apenas em seu aspecto unitário, pois frequentemente nela interferem múltiplas especialidades médicas. Nesse contexto, normalmente só caberá a responsabilização solidária e objetiva do cirurgião-chefe da equipe médica quando o causador do dano for profissional que atue sob predominante subordinação àquele. 5. No caso de médico anestesista, em razão de sua capacitação especializada e de suas funções específicas durante a cirurgia, age com acentuada autonomia, segundo técnicas médico-científicas que domina e suas convicções e decisões pessoais, assumindo, assim, responsabilidades próprias, segregadas, dentro da equipe médica. Destarte, se o dano ao paciente advém, comprovadamente, de ato praticado pelo anestesista, no exercício de seu mister, este responde individualmente pelo evento. [...] Não há, assim, solidariedade decorrente de responsabilidade objetiva, entre o cirurgião-chefe e o anestesista, por erro médico deste último durante a cirurgia. [...]
(STJ - EREsp: 605435 RJ 2011/0041422-0, Relator: Ministra NANCY ANDRIGHI, Data de Julgamento: 14/09/2011, S2 - SEGUNDA SEÇÃO, Data de Publicação: DJe 28/11/2012)
Porém, importante ressaltar que os processos de responsabilização médica -independente da especialidade do profissional – costumeiramente dependerão de uma perícia técnica, portanto, uma análise específica do caso concreto. Mas em termos gerais, há responsabilidade individual do anestesista, de maneira subjetiva (com aferição da extensão da culpa) quando atua sozinho, tanto em atos pré ou pós operatórios. Contudo, àquele que exerce sua profissão dentro de um centro cirúrgico, será necessário verificar sua relação jurídica com os demais profissionais e instituição de saúde envolvidas, e em que grau o médico anestesista concorreu com aquele que causou o dano ao paciente.
Caso ainda restem dúvidas, comentários ou sugestões de artigos, não deixe de entrar em contato! Obrigada pela leitura.
Literatura:
GONÇALVES, Carlos Roberto, Responsabilidade Civil. 14. Ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2012.
FILHO, Sergio Cavalieri. Programa de Responsabilidade Civil. 10. Ed. São Paulo: Editora Atlas, 2012.
http://suzannamacedo.jusbrasil.com.br/artigos/326113100/sou-medico-anestesista-como-posso-ser-responsabilizado-em-um-processo-judicial?utm_campaign=newsletter-daily_20160420_3215&utm_medium=email&utm_source=newsletter

Como fica a intervenção de terceiro no Novo CPC?

Publicado por Flávia T. Ortega

1 – Introdução.
novo Código de Processo Civil, lei nº 13.105/2015, traz inovações na intervenção de terceiros, regulada nos artigos 119 a 138 do título III do livro III da parte geral. Dentre elas destaca-se o tratamento da ação de oposição nos procedimentos especiais e não mais em conjunto com as outras formas de intervenção, a criação do incidente de desconsideração da personalidade jurídica, a previsão da participação do amicus curiae.
A ação de oposição passa a ser regulada nos artigos 682 a 686 donovo Código de Processo Civil, dentro do título III do livro I da parte especial.
As formas de intervenção de terceiro, tratadas nos artigos 119 a 138 são:
Tendo em conta a necessidade de se resguardar o terceiro, assim entendido aquele que não é parte no processo, de decisões que possam afetar a sua relação jurídica com uma das partes, o Código de Processo Civil admite a sua intervenção na relação processual fazendo-se parte.
A seguir passa-se a análise do referido instituto, descrevendo os tipos atuais de intervenção e as inovações trazidas pelo novo Código de Processo Civil.
2 – A intervenção de terceiros no novo Código de Processo Civil.
Em regra, ninguém pode ver alterada a sua situação jurídica, mediante decisão judicial de cujo processo não foi parte. Contudo, as relações jurídicas não subsistem isoladas e estanques, havendo inúmeras vezes interdependência de relações, de modo que a decisão proferida quanto a uma delas atinge a outra em parte ou no seu todo.
Pela intervenção o terceiro torna-se parte ou coadjuvante no processo pendente, devendo sua existência à necessidade de evitar resultados contraditórios e diminuir o número de processos.
Código de Processo Civil de 1973 arrola como formas de intervenção de terceiros:
  • A oposição, artigos 56 a 61;
  • A nomeação à autoria, artigos 62 a 69;
  • A denunciação da lide, artigos 70 a 76;
  • O chamamento ao processo, artigos 77 a 80
  • A assistência nos artigos 50 a 55.
assistência, embora tratada no mesmo capítulo que olitisconsórcio é forma de intervenção, e não se dá por meio de ação própria e sim por incidente no processo pendente. Neste caso, o assistente atua como um auxiliar de um das partes no intuito de que o resultado final do processo seja favorável à parte a quem assiste.
Para a intervenção do terceiro é necessário que se observe o limite temporal referente ao processo pendente, assim entendido o momento em que se inicia com a petição inicial e se extingue quando a sentença torna-se irrecorrível.
A assistência pode ser: simples ou litisconsorcial, dependendo da intensidade do interesse do terceiro no resultado do processo. Qualquer que seja a modalidade, o assistente terá faculdades, ônus, poderes e deveres relativos à relação processual.
assistência tem lugar em qualquer dos tipos de procedimento e em todos os graus de jurisdição, inclusive nos Tribunais Superiores, recebendo o processo no estado em que se encontre, conformeparágrafo único do artigo 50 do CPC de 73. É cabível, portanto, em todos os ritos do processo de conhecimento; no processo cautelar; nos embargos do devedor e na liquidação de sentença.
A assistência no novo Código de Processo Civil é tratada nos artigos 119 a 124, em capítulo separado do litisconsórcio, que é regulado nos artigos 113 a 118. Continua sendo caracterizada como assistência simples, nos artigos 121 a 123, e litisconsorcial, no artigo 124.
Importante inovação refere-se ao disposto no parágrafo único do artigo 121, ao determinar que na assistência simples sendo revel ou, de qualquer outro modo, omisso o assistido, o assistente será considerado seu substituto processual e não mais gestor de negócios como dispunha o CPC de 73.
Na hipótese do parágrafo único do artigo 121 do novo Código de Processo Civil, a assistência deixa de ser simples e passa a ser litisconsorcial por força do disposto no artigo 18 do Código:
“Ninguém poderá pleitear direito alheio em nome próprio, salvo quando autorizado pelo ordenamento jurídico. Havendo substituição processual, o substituído poderá intervir como assistente litisconsorcial.”
prazo para a impugnação passa a ser de 15 dias, nos termos do artigo 120 do novo Código de Processo Civil.
Considerando que o bem e o interesse em litígio pertencem ao assistido, ressalta-se que a assistência simples não obsta que a parte principal:
  • Reconheça a procedência do pedido;
  • Desista da ação;
  • Renuncie ao direito sobre o que se funda a ação;
  • Transija sobre direitos controvertidos.
nomeação à autoria regulada nos artigos 62 a 69 do Código de Processo Civil de 73, não encontra correspondente no novoCódigo de Processo Civil. Isto porque a nomeação à autoria corresponde a uma alegação de ilegitimidade para a causa por parte do réu - correção de ilegitimidade passiva.
Candido Rangel Dinamarco destaca que “a utilidade da nomeação à autoria consiste em antecipar soluções para a questão dalegitimidade passiva mediante um incidente razoavelmente simples em que o autor, alertado, tem oportunidade de retificar a mira da demanda proposta.”
Deste modo, preceituam os artigos 338 e 339 do novo Código de Processo Civil, que:
Incumbe ao réu, quando alegar sua ilegitimidade na contestação, indicar o sujeito passivo da relação jurídica discutida, sempre que tiver conhecimento, podendo arcar com as despesas processuais e indenizar o autor pelos prejuízos decorrentes da falta de indicação.
Se o autor aceitar a indicação, procederá à alteração da petição inicial para a substituição do réu.
O autor pode, ainda, optar por alterar a petição inicial para incluir, como litisconsorte passivo, o sujeito indicado pelo réu.
denunciação da lide é tratada nos artigos 70 a 76 do Código de Processo Civil de 73, encontrando correspondente no novo Código de Processo Civil, nos artigos 125 a 129. Apresenta-se como umaação regressiva, no mesmo processo, que pode ser proposta pelo autor e pelo réu no âmbito exclusivo do processo de conhecimento.
O artigo 125 do novo Código de Processo Civil arrola as hipóteses em que a denunciação da lide é admissível, ao contrário do artigo70 do Código de Processo Civil de 73, que arrola as hipóteses em que a denunciação da lide é obrigatória. A parte tem o ônus de denunciar a lide, podendo exercer o direito regressivo em ação autônoma quando a denunciação da lide for indeferida, deixar de ser promovida ou não for permitida.
A hipótese do inciso II, do artigo 70 do CPC de 73, foi excluída das hipóteses de denunciação da lide previstas no novo Código de Processo Civil, pois como ensina Candido Rangel Dinamarco:
A hipótese descrita no inc. II do art. 70, de raríssima incidência na prática, deve ser entendida em consonância com o instituto danomeação à autoria. Aquele que exerça posse direta sobre o bem é admitido a denunciar a lide ao proprietário ou ao possuidor indireto; mas o mero detentor, que possuidor não é, apenas cabe nomear tais pessoas à autoria (art. 62) (supra, n. 599). O possuidor direito que denuncia faz como todo litisdenunciante: convoca o terceiro a oficiar como seu assistente litisconsorcial e ao mesmo tempo pede sua condenação a ressarcir em caso de sucumbir perante adversário comum; não é como o mero detentor, que, ao nomear à autoria o possuidor ou proprietário, pede sua própria exclusão do processo. [5]
No parágrafo 2º do artigo 125, admite-se apenas uma única denunciação sucessiva, promovida pelo denunciado, contra seu antecessor imediato na cadeia dominial ou quem seja responsável por indenizá-lo, não podendo o denunciado sucessivo promover nova denunciação, hipótese em que eventual direito de regresso será exercido por ação autônoma.
Isto porque, cada sujeito do processo pode denunciar a lide ao seu próprio garante e jamais aos garantes de seu garante. No Recurso Especial nº 9876/SP o Superior Tribunal de Justiça admite o indeferimento de denunciações sucessivas da lide, quando ocasionarem demora excessiva ao processo:
DENUNCIAÇÃO DA LIDE. ARTIGO 70III, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. DENUNCIAÇÕES SUCESSIVAS,POSSIBILIDADE DE INDEFERI-LAS.
Ação indenizatória, promovida por paciente contra estabelecimento hospitalar, com posterior intervenção do banco de sangue, que denunciou a lide aos laboratórios encarregados da analise do sangue utilizada em transfusões.
Embora admitida exegese ampla ao disposto no artigo 70III, doCPC, não esta obrigado a magistrado a admitir sucessivas denunciações da lidedevendo indeferi-las (certamente que com resguardo de posterior 'Ação Direta'), naqueles casos em que possa ocorrer demasiada demora no andamento do feito, com manifesto prejuízo a parte autora.
Recurso Especial não conhecido.
chamamento ao processo distingue-se da denunciação da lide, por não se tratar de um exercício de direito de regresso, mas dainstauração de um litisconsórcio sucessivo facultativo. No chamamento o réu pede a integração do terceiro ao processo, como parte, para que a sentença tenha força executiva também em relação a ele.
Os artigos 130 a 132 do novo Código de Processo Civil tratam do chamamento ao processo, e correspondem aos artigos 77 a 80 doCódigo de Processo Civil de 73. Foram alterados, apenas, os prazos para citação dos litisconsortes que passaram a ser de:
  • 30 (trinta) dias do deferimento do chamamento;
  • 2 (dois) meses se o chamado residir em outra comarca, seção ou subseção judiciárias, ou em lugar incerto.
Os referidos prazos contidos no artigo 131 do novo Código são aplicáveis à denunciação da lide, conforme determina o artigo 126. No Código de 73 ocorria o inverso, os dispositivos relativos aos prazos de citação na denunciação da lide, artigos 72 e 74, é que eram aplicáveis ao chamamento ao processo.
chamamento ao processo continua sendo procedimento exclusivo do processo de conhecimento, incompatível com o processo de execução, pois tem como objeto a condenação do terceiro a reembolsar o réu pelo que vier a pagar em razão da sentença.
Em todas as hipóteses do artigo 125 do novo Código, os terceiros já eram legitimados passivos para a causa, mas não foram incluídos na petição inicial. Deste modo, o chamamento é instituído em favor do réu e não do autor da demanda.
Foram introduzidas duas novas formas de intervenção de terceiro pelo novo Código, quais seja:
  • Incidente de desconsideração da personalidade jurídica (arts. 133 a 137)
  • Amicus curiae (art. 138).
Código Civil, no artigo 44, confere às pessoas jurídicas personalidade distinta da dos seus sócios. Ao constituírem a sociedade os sócios transferem-lhe bens que passam a integrar o seu patrimônio. A manifestação de vontade da pessoa jurídica se dá por meio de seus órgãos deliberativos e administrativos.
Ocorre que a autonomia patrimonial da pessoa jurídica não pode servir para acobertar situações antijurídicas prejudiciais a terceiros. Em razão disto foi construída a teoria da desconsideração da personalidade jurídica, possibilitando a responsabilização dos sócios quando caracterizada a utilização abusiva da forma societária.
A teoria da desconsideração da personalidade jurídica, difundida na doutrina brasileira após a década de 60, por Rubens Requião, encontra nos dias atuais suporte no ordenamento jurídico (artigo da Consolidação das Leis do Trabalho, artigo 28 do Código de Defesa do Consumidor, artigo  da Lei nº 9.605/98, artigo 50 doCódigo Civil), devendo ser aplicada quando presentes os pressupostos específicos, relacionados com a fraude ou abuso de direito em prejuízo de terceiros.
A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça trata da desconsideração da pessoa jurídica como um incidente processual, e não como um processo incidente, razão pela qual pode ser deferida nos próprios autos, em desfavor de quem foi superada a pessoa jurídica (Recurso Especial nº 1.096.604/DF).
Seguindo o mesmo entendimento, o novo Código de Processo Civildisciplina o incidente de desconsideração da personalidade jurídica, nos artigos 133 a 137, que será instaurado pela parte ou pelo Ministério Público com a comprovação dos pressupostos específicos previstos em lei, fraude ou abuso da personalidade jurídica e confusão patrimonial.
A existência dos referidos pressupostos deve ser demonstrada sob o crivo do contraditório, exigindo-se a citação do sócio ou da pessoa jurídica (no caso de desconsideração inversa), para manifestar-se sobre o incidente, no prazo de 15 (quinze) dias. Neste caso, forma-se um litisconsórcio eventual entre a sociedade e o sócio para permitir a excussão dos bens do sócio quando o patrimônio da pessoa jurídica não for suficiente para a satisfação da obrigação.
O incidente de desconsideração é cabível em todas as fases do processo de conhecimento, no cumprimento de sentença e na execução fundada em título executivo extrajudicial, podendo a desconsideração ser requerida na petição inicial, hipótese em que se dispensa a instauração do incidente, artigo 134 do novo Código de Processo Civil.
O incidente, também, é cabível na ação de execução fiscal por força do disposto no artigo  da lei nº 6.830/80, que determina a aplicação subsidiária do Código de Processo Civil. Neste caso, deve-se observar o entendimento do Superior Tribunal de Justiça que determina que a citação do sócio deva ocorrer dentro do prazo prescricional de 5 (cinco) anos.
Do mesmo modo, é cabível no processo do trabalho por decorrência expressa do artigo 769 da Consolidação das Leis do Trabalho, decreto-lei 5.452/43, que prevê a aplicação subsidiária do Código de Processo Civil nos casos omissos.
A decisão que resolve o incidente é interlocutória, cabendo agravo de instrumento, artigo 1.015 inciso IV do novo Código. No caso de acolhimento do pedido de desconsideração, a alienação ou a oneração de bens, havida em fraude de execução, será ineficaz em relação ao requerente.
Atualmente, o amicus curiae atua como um terceiro que participa do processo para defender os interesses do grupo por ele representado, perseverando no objetivo de fazer prevalecer as suas alegações.
A intervenção de terceiro como amicus curiae passou a ter previsão legal com a lei nº 6.835/76, que no artigo 31 permite a intervenção da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) em demandas individuais, nas quais devessem ser analisadas questões de direito societário, sujeitas, no plano administrativo à competência da referida autarquia. [9]
Posteriormente, a lei nº 9.868/99 no § 2º do artigo , passou a admitir a manifestação do amicus curiae no processo objetivo de controle de constitucionalidade, como instrumento de abertura do processo e de pluralização do debate constitucional.
Na ação direta de inconstitucionalidade não se admite a intervenção de terceiros, mas o relator poderá admitir mediante decisão irrecorrível, e considerada a relevância da matéria e a representatividade dos postulantes, a manifestação de outros órgãos ou entidades.
Seguindo a mesma sistemática, o novo Código de Processo Civiltrata da participação do amicus curiae, no artigo 138, dispondo que “o juiz ou o relator, considerando a relevância da matéria, a especificidade do tema objeto da demanda ou a repercussão social da controvérsia, poderá, por decisão irrecorrível, de ofício ou a requerimento das partes ou de quem pretenda manifestar-se, solicitar ou admitir a participação de pessoa natural ou jurídica, órgão ou entidade especializada, com representatividade adequada, no prazo de 15 (quinze) dias de sua intimação.”
Na decisão do juiz ou relator que admitir a participação de pessoa natural ou jurídica, será definido o poder do amicus curiae. A referida intervenção não acarreta a modificação de competência nem autoriza a interposição de recursos, salvo a oposição deembargos de declaração e de recurso da decisão que julgar o incidente de resolução de demandas repetitivas.
Conforme disposto no caput do artigo 138, a participação doamicus curiae pode ocorrer em primeiro e segundo grau de jurisdição, no âmbito do processo de conhecimento.
No tocante a representatividade e a pertinência temática, destaca-se o acórdão proferido no Agravo de Instrumento nº 201400001023563, do Tribunal Regional Federal da 2ª Região:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITO PROCESSUAL CIVIL.PROPRIEDADE INDUSTRIAL. PATENTE MAIL BOX. ADMISSÃO DA ABIFINA COMO AMICUS CURIAE. PRELIMINARES DE NÃO CABIMENTO DO AGRAVO E AUSÊNCIA DE INTERESSE RECURSO REJEITADAS. PRECEDENTES JURISPRUDENCIAIS DE ADMISSÃO DA ABIFINA EM DEMANDAS SEMELHANTES. IRRELEVANTE O INTERESSE DO AMICUS CURIAE. REPRESENTATIVIDADE E PERTINÊNCIA TEMÁTICA VERIFICADOS. PROVIMENTO NEGADO AO AGRAVO DE INSTRUMENTO I - Trata-se de agravo de instrumento, com pedido de efeito suspensivo ativo, interposto contra decisão que deferiu o ingresso como amicus curiae de ABIFINA -Associação Brasileira das Indústrias de Química Fina, Biotecnologia e suas Especialidades. II - Rejeitadas as preliminares de não cabimento do agravo e ausência de interesse recursal. III - A jurisprudência deste Tribunal Regional Federal passou a admitir o ingresso de amicus curiae sempre que a matéria debatida ultrapassar a esfera patrimonial das partes e afetar o interesse de toda coletividade. IV - O papel do amicus curiae é trazer ao processo informações que auxiliem o magistrado, sendo irrelevante eventual interesse que tenha na demanda. V - Requisito da representatividade satisfeito. A ABIFINA é “associação classista de âmbito nacional, fundada há cerca de trinta anos, que congloba laboratórios públicos (FARMANGUINHOS, LAFEPE, IQUEGO) e privados (EMS, ACHE, LIBBS, CRISTÁLIA, EUROFARMA etc)”. VI - Requisito da pertinência temática também satisfeito. A demanda principal versa sobre prazo de patente relacionado ao medicamento TAMIFLU, utilizado para tratamento do vírus influenza (H1N1). VII - Provimento negado ao agravo de instrumento.
Deste modo, a representatividade deve relacionar-se diretamente à identidade funcional, natureza ou finalidade estatutária da pessoa física ou jurídica que a qualifique para atender ao interesse público de contribuir para o aprimoramento do julgamento da causa, não sendo suficiente o interesse em defender a solução da lide em favor de uma das partes. Sendo necessário, ainda, que a matéria debatida transcenda a esfera patrimonial das partes, possuindo relevância econômica e social.
amicus curiae, agora com previsão expressa no Código de Processo Civil, representa uma nova forma de intervenção de terceiros, que se diferencia da assistência.
A intervenção de terceiros não é autorizada nos juizados especiais estaduais e federais, por força do disposto no artigo 10 da lei nº9.099/95, em razão de se orientar pelos critérios da oralidade, simplicidade, informalidade, economia processual e celeridade.
Do mesmo modo, entende o Superior Tribunal de Justiça que o rito do mandado de segurança é incompatível com a intervenção de terceiros, ainda que na modalidade de assistência litisconsorcial. [10]
O recurso previsto no novo Código de Processo Civil para as decisões interlocutórias de admissão ou inadmissão de intervenção de terceiros é o agravo de instrumento, inciso IX do artigo 1.015.
3 – O procedimento especial da ação de oposição no novo Código de Processo Civil.
Diferente do Código de Processo Civil de 73, o novo Código trata a ação de oposição como um procedimento especial, no capítulo VIII do título III do livro I da parte especial, e não em conjunto com as demais formas de intervenção de terceiros.
Isto porque, a oposição é realmente uma ação na qual terceiro deduz em juízo pretensão incompatível com os interesses conflitantes do autor e do réu de um processo cognitivo pendente. O que caracteriza a pretensão do terceiro é o fato do pedido ser relativo ao mesmo bem que as partes originárias disputam. [11]
Conforme Athos Gusmão Carneiro: “trata-se de instituto de origem germânica, ligado ao princípio da universalidade do juízo, que se contrapõe ao princípio da singularidade, que caracterizou o direito romano.” [12]
No Código de Processo Civil de 73 quando a oposição é oferecida antes da audiência, ela será apensada aos autos principais e correrá simultaneamente com a ação, sendo ambas julgadas pela mesma sentença, conforme dispõe o artigo 59. Neste caso, trata-se de verdadeira intervenção de terceiro.
Diferentemente, se a oposição for oferecida após a audiência seguirá o procedimento ordinário, sendo julgada sem prejuízo da causa principal, conforme artigo 60 do Código de Processo Civil de 73. Neste caso, a oposição não tem natureza de intervenção, mas de ação autônoma por formar um processo incidente.
A oposição interventiva não encontra correspondente no novo Código de Processo Civil, apenas a oposição autônoma é prevista nos artigos 682 a 686. A oposição deve ser oferecida até o momento de ser proferida a sentença, não havendo mais distinção se oferecida antes ou após a audiência. O oferecimento da oposição após a audiência acarreta apenas a suspensão do processo principal.
Esta é basicamente a única diferença da oposição no Código de Processo Civil de 73 e no novo Código de Processo Civil. Os artigos5758 e 61 do CPC de 73 correspondem aos artigos 682683684 e686 do novo CPC.
A ação de oposição deverá observar os requisitos para propositura da ação, artigos 319 e 320 do novo Código, devendo ser distribuída por dependência ao processo principal. Ambas as ações serão julgadas na mesma sentença, sendo a ação de oposição prejudicial à ação principal.
4 – Conclusão.
Diante do exposto, pode-se notar que houve uma adequação nas formas de intervenção de terceiros no novo Código de Processo Civil. A nomeação à autoria não encontra previsão, a oposição é somente a autônoma tratada nos procedimentos especiais, a denunciação da lide e o chamamento ao processo sofreram alguns ajustes e foram criados o incidente de desconsideração da personalidade jurídica e a participação do amicus curiae.
As referidas alterações atendem aos reclamos da celeridade, da economia processual, da efetividade e da razoável duração do processo, sem se descuidar da necessidade do contraditório.
Segue relação de como era no CPC/73 e como ficou no Novo CPC:
  • Oposição -> procedimento especial.
  • Nomeação à autoria -> correção de ilegitimidade passiva.
  • Sem correspondência no título -> assistência (simples e litisconsorcial).
  • Denunciação da lide -> denunciação da lide.
  • Chamamento ao processo -> chamamento ao processo.
  • Sem correspondência no Código -> Incidente de desconsideração da personalidade jurídica.
  • Sem correspondência no Código -> amicus curiae.
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