segunda-feira, 22 de maio de 2017

Opinião - Regime sucessório da união estável não é inconstitucional

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Estreitar uma relação afetiva, dar aquele passo adiante ao mero namoro em direção a um relacionamento mais sério e íntimo é uma decisão que brasileiros tomavam aos poucos, dia a dia, de maneira natural, espontânea, a partir de seus mais variados e complexos sentimentos, emoções e expectativas em relação à outra pessoa.
Tal processo, muito saudavelmente gradual e quase imperceptível aos próprios casais, recebeu um choque desmedido vindo de um lugar inesperado: o Supremo Tribunal Federal.
No dia 10 de maio, o Supremo Tribunal Federal, sem votação unânime, deu provimento aos Recursos Extraordinários 646.721-RS e 878.694-MG, ambos de repercussão geral, declarando incidentalmente a inconstitucionalidade do artigo 1.790 do Código Civil, que instituía o regime sucessório aplicado à união estável.
A tese fixada no julgamento, tal como proposta pelo ministro Barroso, foi a seguinte: É inconstitucional a distinção de regimes sucessórios entre cônjuges e companheiros prevista no art. 1.790 do CC/2002, devendo ser aplicado, tanto nas hipóteses de casamento quanto nas de união estável, o regime do art. 1.829 do CC/2002.
Os efeitos sucessórios típicos do casamento são a partir de agora atribuídos também à união estável.  Antes, este instituto recebia do artigo 1.790 o seguinte regramento sucessório:
A companheira ou o companheiro participará da sucessão do outro, quanto aos bens adquiridos onerosamente na vigência da união estável, nas condições seguintes:
I - se concorrer com filhos comuns, terá direito a uma quota equivalente à que por lei for atribuída ao filho;
II - se concorrer com descendentes só do autor da herança, tocar-lhe-á a metade do que couber a cada um daqueles;
III - se concorrer com outros parentes sucessíveis, terá direito a um terço da herança;
IV - não havendo parentes sucessíveis, terá direito à totalidade da herança.
Com a decisão do STF, o regramento passa a ser o do artigo 1.890, o mesmo do casamento:
A sucessão legítima defere-se na ordem seguinte:
I - aos descendentes, em concorrência com o cônjuge sobrevivente, salvo se casado este com o falecido no regime da comunhão universal, ou no da separação obrigatória de bens (art. 1.640, parágrafo único); ou se, no regime da comunhão parcial, o autor da herança não houver deixado bens particulares;
II - aos ascendentes, em concorrência com o cônjuge;
III - ao cônjuge sobrevivente;
IV - aos colaterais.
Equiparar a sucessão na união estável à sucessão no casamento trará consigo impactos sociais graves e nocivos. Como advertiu o ministro Marco Aurélio, em seu excelente voto pelo desprovimento dos recursos, “a prevalecer a ótica direcionada [da equiparação dos institutos], é possível que ocorram efeitos perversos e contrários à proteção da união estável e aos casais de companheiros”.
De fato, a alteração brusca e inadvertida no regime jurídico da união estável prejudicará enormemente o instituto e, como não poderia deixar de ser, os companheiros — sejam heterossexuais, sejam homossexuais — que vivem sob essa forma particular de entidade familiar, assim como seus herdeiros.
Ao tomarem notícia da novidade (sem precedentes em qualquer outro país do mundo, note-se) trazida pela decisão do STF, que impõe aos companheiros o mesmo regime sucessório do casamento civil, é mais provável que os companheiros que não queiram casar e que justamente por isso vivam em união estável, acabem se casando, ou, receosos e pressionados pela exacerbada gravidade que a relação acaba de adquirir graças ao STF, acabem, isto sim, dissolvendo a relação? Se a segunda opção for a que soar mais provável, o leitor pode começar a vislumbrar os perversos efeitos da decisão.
Teríamos de nos resignar com tais efeitos se a Constituição de fato vedasse distinções sucessórias entre cônjuges e companheiros. Mas não é o caso. O artigo 1.790 do Código Civil, ao fixar um regime sucessório próprio para a união estável, não tem nada de inconstitucional.
A grande inconstitucionalidade do artigo 1.790 do Código Civil, segundo os que defenderam a tese, residiria em uma suposta incompatibilidade com o artigo 226, § 3º da Constituição Federal:
Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento.
Mas este dispositivo justifica mesmo a declaração de inconstitucionalidade das regras sucessórias da união estável? Vejamos.
“...é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar...”
Casamento é entidade familiar. União estável, conforme a Constituição, é igualmente entidade familiar. Consistindo a famosa formulação do princípio da igualdade em “tratar igualmente aos iguais”, o artigo 1.790 do Código Civil, ao instituir um regime sucessório diferente para a união estável, estaria desigualando a dois iguais, e por isso seria inconstitucional. Este é, em apertada síntese, o raciocínio que fundamenta a tese de inconstitucionalidade do artigo 1.790 do Código Civil.
primeiro equívoco deste raciocínio é não perceber que a Constituição equiparou a união estável ao casamento, mas não os igualou. Se a Constituição determina que dois caminhos levam a um mesmo lugar, isto é, se tanto casamento como união estável formam entidades familiares, o legislador tem ampla margem para disciplinar cada um desses caminhos de modo a permitir que as pessoas que queiram atingir o destino — a constituição de entidade familiar — tenham à sua disposição alternativas reais, e não apenas aparentes, de caminhos a escolher. O ministro Dias Toffoli, em outro voto excelente pela não equiparação, afirmou corretamente: “a liberdade e a autonomia da vontade dos conviventes hão de ser respeitados e não foi por outro motivo que o casamento civil passou a ser questionado a partir da década de 1960, principalmente pelos jovens, que passaram a entender que deveria existir maior liberdade nas relações familiares”. 
segundo equívoco do raciocínio é a desconsideração da integridade do artigo 226, § 3º ao enxergar apenas um dos quadrantes do dispositivo constitucional, deixando indevidamente no escuro os outros dois que completam e revelam o real conteúdo da norma.
“Para efeito da proteção do Estado...”
O primeiro quadrante, para efeito da proteção do Estado, é fundamental na delimitação do alcance do comando constitucional, porque estabelece o domínio do Direito em que se opera a equiparação da união estável ao casamento: as relações jurídicas verticais entre Estado e família. É nas relações que travam com o Estado que uniões estáveis ficam plenamente equiparadas ao casamento. A título de exemplo, temos a Lei 8.213/1991, que estabelece o Regime Geral da Previdência, e prevê, em seu artigo 16, I como beneficiários da previdência na condição de dependentes, o cônjuge e o companheiro; há também o Decreto 3.000/1999, Regulamento do Imposto de Renda, que nos artigos 9º e 77, estende aos companheiros benefícios tributários conferidos aos cônjuges; e, ainda, os programas assistenciais de subsistência das famílias, como o Bolsa-Família, que distribuem seus benefícios às famílias oriundas da união estável. Há muitos outros exemplos de correta concretização, no plano infraconstitucional, da norma do artigo 226, § 3º da Constituição: a proibição de qualquer discriminação entre união estável e casamento nas relações de Direito Público.
Ora, o Direito das Sucessões, embora tenha inegável importância social, não deixa de ser, com sempre foi, uma parte do Direito Civil, ou seja, do Direito Privado. Qualquer estudioso sabe que não é possível enxertar uma norma de Direito Público no Direito Privado sem distorcer profundamente as relações jurídicas que se dão neste domínio.
“...Devendo a lei facilitar sua conversão em casamento”
Completa o artigo 226, § 3º da Constituição, fazendo-se imprescindível para a correta interpretação do dispositivo, seu terceiro quadrante: devendo a lei facilitar sua conversão em casamento. O Ministro Roberto Barroso, no voto que proferiu no Recurso 878.694-MG, bem observou que a previsão de conversão da união estável em casamento não implica um rebaixamento daquela perante este.
Porém, no curso de seu voto, escapou-lhe o fato de que a previsão de conversão reafirma categoricamente a existência de diferenças substanciais entre os dois institutos. Se assim não fosse, por que converter uma certa coisa em outra coisa igual? Como se pode converter algo em seu igual?
Essa é uma questão que inevitavelmente surge quando tomamos nota de que os seguintes efeitos da união estável já eram idênticos aos do casamento: efeitos patrimoniais, com o regime legal sendo, nos dois casos, o da comunhão parcial de bens e tendo os companheiros ampla liberdade de escolha de outro regime; efeitos pessoais, tendo os companheiros entre si os mesmos deveres e direitos dos cônjuges; e efeitos verticais perante o Estado. Com a equiparação também dos efeitos sucessórios, a união estável passa agora a produzir os mesmíssimos efeitos que o casamento. A pergunta é verdadeiramente inescapável: como se pode converter algo naquilo que já lhe é substancialmente igual?
Como se pode estimular, como se pode facilitar, de maneira a cumprir o mandamento constitucional, a conversão da união estável ao casamento se todas as diferenças que restam entre os dois são justamente aquelas que servem de desincentivo ao casamento e à permanência na união estável?
Pois, como é sabido, o casamento para se constituir requer um processo de habilitação prévio (artigo 1.525 do Código Civil), formal, instruído por documentação, com prazos fixos de eficácia que, não cumpridos, fazem o processo voltar à estaca zero. O casamento requer também uma solenidade de celebração (artigo 1.533 do Código Civil), com data e hora marcada, na presença obrigatória de testemunhas. Requer procedimentos de registro (artigo 1.536 do Código Civil).
Por que alguém iria se dispor a percorrer todo esse caminho burocrático para, ao fim e ao cabo, chegar factualmente ao mesmo lugar de onde saiu? Mais: como estimular alguém a fazer isso? Impossível com a mudança operada pelo STF!
Se não existem diferenças substanciais entre os efeitos da união estável aos do casamento, a norma constitucional que determina à lei facilitar a conversão da união estável em casamento não apenas deixa de ser cumprida como passa a ser francamente violada.
terceiro equívoco residiu na visão bitolada a dois casos em que disputavam a herança os irmãos do falecido com o companheiro sobrevivente, em uniões estáveis com duração de 40 e 9 anos, respectivamente. As decisões do STF têm repercussão geral e se aplicarão às heranças em que o falecido deixou filhos, ou pais. E, também, às relações que tenham durado somente 2 anos. Imaginemos um companheiro, que tenha se relacionado somente 2 anos com o falecido, herdando o mesmo quinhão do patrimônio que o filho do de cujus. O resultado sucessório provocado pelo STF será injusto e desproporcional, atiçando os oportunistas de plantão a se aproveitarem da tese.

Conclusão
Uma vez que não existe inconstitucionalidade evidente no artigo 1.790 do Código Civil, a decisão correta do Tribunal seria a de não declarar a sua inconstitucionalidade, respeitando a escolha do legislador. In dubio, pro legislatore, como lembrou de maneira muito pertinente o Ministro Ricardo Lewandowski em seu voto contrário à equiparação. Declarar a inconstitucionalidade, acabando com o regime sucessório próprio da união estável e determinando que sobre ela sejam aplicadas as mesmas regras sucessórias do casamento foi um grande desacerto jurídico do STF. Um desacerto que, longe de ficar adstrito ao nosso mundo jurídico, terá lamentáveis repercussões na vida de tantos milhões de casais e de seus herdeiros que pagarão o preço de uma decisão equivocada do STF.
Regina Beatriz Tavares da Silva é advogada titular do escritório Regina Beatriz Tavares da Silva Sociedade de Advogados. Pós-Doutora em Direito da Bioética pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa. Doutora em Direito e Mestre em Direito Civil USP. Presidente nacional da Associação de Direito de Família e das Sucessões - ADFAS. Coordenadora e Professora dos Cursos de Especialização em Direito de Família e das Sucessões na Escola Superior de Advocacia ESA - OAB/SP.
Revista Consultor Jurídico, 19 de maio de 2017, 6h51
http://www.conjur.com.br/2017-mai-19/regime-sucessorio-uniao-estavel-nao-inconstitucional

TJ-RS reconhece paternidade póstuma a pedido de avós da criança

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O Tribunal de Justiça do Rio Grande  do Sul vem reconhecendo, ao mesmo tempo, a filiação biológica e afetiva nos registros de nascimento, com todos os seus efeitos jurídicos, incluindo os vínculos de parentesco com os dois pais ou as duas mães. Assim, se houver concordância das partes e for do interesse do menor, é possível também o reconhecimento póstumo de paternidade biológica em pedido feito pelos avós, mesmo que este direito seja personalíssimo do pai da criança.
O fundamento levou a 8ª Câmara Cível da corte gaúcha a reconhecer a paternidade biológica póstuma, pedida originalmente pelos avós da criança e, ao mesmo tempo, manter sua paternidade registral. Com a decisão, o colegiado determinou a inclusão do sobrenome do pai biológico e os nomes dos avós paternos.
Como os avós se ofereceram para ajudar na pensão alimentícia, em pedido feito em conjunto com a mãe do menor, o colegiado também homologou o acordo de obrigação alimentar. O valor a ser repassado para mãe, mensalmente, corresponde a 25% do salário mínimo. O acórdão, com entendimento unânime, foi lavrado na sessão de 27 de abril.
A pretensão dos avós havia sido derrubada na primeira instância. O juízo entendeu que a demanda não poderia prosseguir, porque o reconhecimento espontâneo de filiação é direito personalíssimo que se extinguiu com a morte do pretenso pai biológico, quando o menor contava com dois anos de idade.
Processo peculiar
O relator da Apelação, desembargador Rui Portanova, observou que se trata de um “caso peculiar”, já que os pedidos da petição inicial são feitos pela mãe do menino, pelo pai registral e pelos avós biológicos paternos. As partes (representadas pela Defensoria Pública) entraram em acordo prévio para solicitar o reconhecimento do “estado de multiparentalidade”.
Portanova ponderou que os avós, sucessores do homem morto, não poderiam pleitear tal reconhecimento, que era direito personalíssimo do filho. Mas, por outro lado, não existe impedimento que o menor, por meio de representante legal, busque o reconhecimento de sua ancestralidade por meio da investigação genética com prova via DNA — o que ocorreu em sede de Apelação neste processo, confirmando o laço biológico.
Conforme o desembargador, o fato de os sucessores do filho concordarem com a demanda do neto, figurando como “verdadeiros assistentes simples iniciais”, não desnatura o procedimento investigatório de paternidade. Também não exige que eles passem a figurar na condição de réus na relação jurídica processual, dada a ausência de pretensão resistida. Isso porque o que conta é o interesse do menor, que deseja obter o reconhecimento de sua ancestralidade e fazê-la constar em seu registro de nascimento.
Evolução social
O desembargador Portanova citou parecer do Ministério Público, segundo o qual, as legislações tendem a se adaptar à evolução da sociedade. O parecer destaca que a filiação não decorre, exclusivamente, do parentesco consanguíneo. É que o artigo 1.593 do Código Civil considera o parentesco natural ou civil; ou seja, pode resultar de consanguinidade ou de outra origem. Ressalta, ainda, que a Constituição proíbe discriminação com relação à filiação, como sinaliza o artigo 227 no seu parágrafo 6º.
“Ademais, não se há como ignorar a possibilidade jurídica conferida aos recorrentes de invocarem os princípios da dignidade humana e da afetividade para ver garantida a manutenção ou o estabelecimento de vínculos parentais”, encerrou o procurador do MP no parecer, fundamentação agregada às razões decidir do colegiado.

Clique aqui para ler o acórdão.
Jomar Martins é correspondente da revista Consultor Jurídico no Rio Grande do Sul.
Revista Consultor Jurídico, 21 de maio de 2017, 9h12
http://www.conjur.com.br/2017-mai-21/tj-rs-reconhece-paternidade-postuma-pedido-avos-crianca

Doutrina nem jurisprudência reconhecem prestação de alimentos a amantes


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É curioso como em direito de família atualmente vive um jogo de palavras em que se pretende mudar a natureza das coisas por meio de eufemismos. É verdade que no mundo politicamente correto as palavras têm mais importância que as ações. Nunca valeu tanto o dito popular “faça o que eu falo, mas não faça o que eu faço”.
Causa espanto, por exemplo, a tentativa de substituição do termo concubinato por famílias simultâneas ou paralelas, como se o primeiro fosse necessariamente um xingamento. E mais, levando a crer que estes novos conceitos colocariam em xeque a monogamia – uma temerária confusão.
Como o Direito é o território da pluralidade de pensamentos, resolvi compartilhar minhas divergências. Há muito já escrevi, com base nas ricas lições de meu mestre Álvaro Villaça Azevedo, que concubinato tem por significado, a partir do grego assimilado pelo latim, copular, manter relação sexual, deitar-se com.
Assim, efetivamente a concubina é, tradicionalmente, a amante do homem casado e o concubino o amante da mulher casada. Note-se que se o casamento acabou de fato (por meio da separação de fato) ou houve separação judicial (que pôs fim à sociedade conjugal, mas não ao vínculo) não se fala em concubinato, mas sim em união estável (art. 1723, parágrafo primeiro).
Então vem uma pergunta: concubinato é sinônimo de “famílias paralelas ou simultâneas” como entende nosso amigo e Presidente do IBDFAM Rodrigo da Cunha Pereira? [1]
A resposta é negativa e várias são as razões. Darei número a cada uma delas.
1 – Concubinato não se refere apenas às pessoas casadas que tenham um amante.
Concubinato, definido pelo art. 1727, e a relação não eventual de pessoas impedidas de se casar.
Dois irmãos que vivam como se casados fossem são concubinos. O pai e a filha que vivem como se casados fossem são concubinos. Note-se que não são “famílias paralelas”. O impedimento do incesto gera concubinato e apenas isso. Qual termo utilizaria a lei para a união de irmãos ou pais e filhos que se comportam como se casados fossem? O “politicamente incorreto”, mas tecnicamente perfeito termo concubinato.
2 – Concubinato não significa existência de famílias paralelas.
Existem pessoas que são casadas e têm um amante ou uma amante. Não há famílias paralelas, mas apenas sexo. Dou um exemplo. Um homem casado e uma mulher casada (o mesmo vale para dois homens e duas mulheres), todas as quartas-feiras vão juntos a um motel para sexo apenas. É uma relação não eventual que não gera famílias paralelas.
3 – Concubinato não significa existência de famílias paralelas – parte 2.
Existem pessoas casadas que tem amantes. E isso não configura família paralela. Ela é executiva de renome e contrata como assessor um rapaz. Ela é casada e ele solteiro (o mesmo vale para dois homens ou duas mulheres). Durante as viagens de trabalho e no expediente, o casal se ama com paixão e furor. Após as horas de sexo ele encontra sua namorada e ela regressa ao marido. É uma relação de concubinato em que não há família paralela.
 4 – Nem toda “família paralela” gera concubinato.
Existem homens casados que tem duas famílias. Muitas vezes, em razão de profissão, o homem viaja e passa períodos fora de casa. Se ele constituir uma relação não eventual com outra mulher ou homem, que ignora a existência do casamento, temos a chamada união estável putativa e o companheiro enganado terá todos os efeitos da união estável. Na realidade, sequer há uma família paralela: há duas famílias igualmente protegidas.
5 – Existem famílias paralelas ou simultâneas?
Na realidade ambos os termos são infelizes e discriminatórios. Explico. Se um homem tiver filhos com duas mulheres, ou uma mulher com dois homens, haverá duas famílias e nenhum adjetivo pode ser utilizado. Não há hierarquia entre essas famílias e todos os filhos, como filhos que o são, recebem a mesma proteção.
O que existe, na realidade, é relações entre pessoas (de mesmo ou diferente sexo) simultâneas ou paralelas. Não família. O homem casado que tem uma amante tem uma relação paralela, mas não família. Ela é concubina. Assim como a mulher casada que tem um amante tem uma relação paralela e não família.
Daí porque dizer que o concubinato é palavra mais que adequada para definir as pessoas casadas com seus amantes por dois motivos: os filhos não merecem a pecha de serem família paralela, pois são filhos e o amante não é companheiro, pois conhece o impedimento matrimonial e dele sabe não advir vantagens.
Uma reflexão provocativa vem à tona: a concubina ou concubino (amante da pessoa casada), com ou sem filhos havidos com o amante, faria jus à pensão alimentícia?
Pelo texto expresso do Código Civil a resposta é negativa. Pela leitura que o STF fez do Código Civil a resposta também é negativa.[2] Para alguns, que ouso dizer não refletem a totalidade ou quiçá a maioria dos membros do IBDFAM a resposta também é negativa (Viva a pluralidade de pensamentos!).
Para outros a resposta é afirmativa com base no princípio constitucional da solidariedade. Se o homem e a mulher tiveram uma relação estável, mesmo na qualidade de amantes, ele não poderia se “locupletar”, tendo apenas vantagens dessa relação. O raciocínio padece de falhas diversas.
A primeira é que ninguém se locupletou de ninguém. Não se pode invocar o princípio do “coitadismo”. Os dois mantiveram uma relação que lhes foi conveniente, logo não há qualquer razão para dessa relação nascerem efeitos na seara familiar. Não há vítima nem vilão. Há duas pessoas que dividiram emoções e momentos, sabendo que aquela relação era estranha à família.
A segunda e mais séria: se se fixar alimentos em favor dos amantes, esquece-se que o grande prejudicado será o cônjuge enganado. Explico. Se o juiz condena o homem casado a pagar alimentos à sua amante, apesar de ambos terem praticado o ilícito conjuntamente, é a esposa deste que acaba pagando a conta.
A esposa ou marido, que sequer sabia que seu marido ou esposa tinha uma amante ou um amante, que manteve o dever de fidelidade, verá parte das economias familiares (de seu dinheiro, indiretamente) ser destinado ao amante ou à amante. O prejuízo direto pode ser do cônjuge que traiu, mas o indireto é do cônjuge que foi traído.
Em suma, antes de se pensar em direitos da amante ou do amante, deveria o sistema pensar nos direitos do cônjuge enganado que recebe dupla punição: ter ciência da traição e pagar a conta dela.
É por isso que é perfeita a orientação da doutrina majoritária e da jurisprudência: não há dever de prestar alimentos entre os concubinos, ou decorrentes de relacionamentos paralelos.

[1] http://conjur.com.br/2017-mai-07/processo-familiar-forca-palavras-direito-familias-sucessoes

[2] http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=90310
José Fernando Simão é advogado, diretor do conselho consultivo do IBDFAM e professor da Universidade de São Paulo e da Escola Paulista de Direito.
Revista Consultor Jurídico, 21 de maio de 2017, 8h00
http://www.conjur.com.br/2017-mai-21/nao-existe-dever-prestar-alimentos-entre-concubinos

Negócio jurídico - Uma visão inovadora do Direito Privado brasileiro

Fábio Vieira Figueiredo e Daniel Oliveira do Nascimento
Devemos, veementemente, introduzir novos valores para, diante disso, passarmos à análise dos pactos privados à luz da Constituição, compreendendo o ser humano como o centro, do ordenamento jurídico.
segunda-feira, 22 de maio de 2017

O contrato surgiu no direito romano, em um ambiente de formalismo e inspiração religiosa, suas bases legais se firmaram no direito canônico assegurando à vontade humana a possibilidade de criar direitos e obrigações.

A teoria da liberdade contratual ganhou máxima legitimidade após a Revolução Francesa em 1789, quando filósofos e juristas perceberam e afirmaram a obrigatoriedade das convenções, equiparando-as, para as partes contratantes à própria lei. Surge, assim, o princípio da pacta sunt servanda.
Nessa senda, negócio jurídico, por ser a maior expressão da autonomia privada, é sem dúvida o tema mais importante vertente sobre o direito privado, contudo, pelo curso da história, sofreu importantes modificações.

Essa liberdade conferida às pessoas, através de limites impostos pelo Estado, para que estabelecessem pactos por meio da manifestação de suas vontades, faz com que os bens e as riquezas circulem por todo o país.

Como vimos, a visão clássica, oriunda do Estado Liberal, ganhou força após a Revolução Francesa com a promulgação do Código Napoleônico, no entanto, a história nos fez passar por momentos turbulentos e após a Segunda Guerra Mundial, o Direito foi reanalisado em todo o mundo.

Para uma análise mais pragmática, tomemos aqui três pontos de extrema importância.

Primeiro, a promulgação da CF em 1988, ao trazer para o centro das discussões jurídicas o ser humano. O que por óbvio não faz com que o viés patrimonial seja deixado de lado, mas eleva o ser humano a um status antes nunca ocupado, implementando os conceitos de solidariedade, desenvolvimento nacional, promoção do bem de todos, objetivos esses que conduzem em conjunto para a máxima efetivação do axioma maior, a dignidade da pessoa humana.

Segundo, o reconhecimento dos direitos de personalidade, sobretudo após a publicação da obra do professor Rabindranath V. A. Capelo de Sousa, objeto de seu doutorado, denominado O Direito Geral de Personalidade. Esse trabalho consiste numa análise de todas as constituições democráticas vigentes à sua época, a fim encontrar um direito que a todas fosse comum.

Em todos os países ditos democráticos que foram analisados, houve esse fenômeno de elevar a pessoa como centro das relações, reconhecendo o direito de personalidade como algo inerente ao ser humano.

Em terceiro lugar, menciono o Novo CC (2002) cujos fundamentos estão na socialidade, eticidade e operabilidade, ou seja, mais uma vez nos devolve ao centro das relações jurídicas, lugar em que o ser humano ocupa posição de maior destaque.

Isso para dizer que os negócios jurídicos, antes consagrados pela força dos pactos, objetividade das relações e amparados tão somente pelos critérios de validade e eficácia, hoje tomaram novo rumo, ao passo que há vasta doutrina e também jurisprudência revisando e até mesmo resolvendo negócios jurídicos com base em elementos chamados laterais.

Os deveres secundários comportam tratamento que abranja toda a relação jurídica. Assim, podem ser examinados durante o curso ou o desenvolvimento da relação jurídica, e, em certos casos, posteriormente ao adimplemento da obrigação principal. Consistem em indicações, atos de proteção, como o dever de afastar danos, atos de vigilância, de guarda, de cooperação, de assistência, todos eles fundados no valor da probidade na relação negocial.

Vetores interpretativos do Novo Código Civil

Socialidade é um vetor que impõe prevalência dos valores coletivos sobre os individuais, respeitando os direitos fundamentais da pessoa humana.

Aqui, o que se leva em consideração é a potencialidade de os negócios jurídicos afetarem terceiros, envolvidos ou não na relação. Isso porque os contratos, quando analisados para além do pacto estabelecido entre as partes, são instrumentos responsáveis pela circulação de riquezas e sendo assim, tem potencial de ser ofensivo a Ordem Econômica.

A título de exemplo, princípio da função social do contrato, da propriedade, residência do objeto de estudo do Direito Civil Constitucional.

Operabilidade se traduz na implementação de soluções viáveis, operáveis e sem grandes dificuldades para a aplicação do direito. Não basta que as obrigações estabelecidas em um contrato sejam exequíveis, devem ser aplicadas de modo simples. O que alguns chamam de princípio da concretude pelo qual deve-se pensar em solucionar o caso concreto de maneira mais efetiva, isto é, tornar tangível as normas positivadas.

Eticidade é um conceito associado a justiça e boa-fé nas relações civis. No contrato, esse princípio tem aplicação em todas as fases (pré-contratual, contratual e pós-contratual). Trata-se de prestações idôneas entre as partes e a sociedade, o corolário desse princípio é a boa-fé objetiva (art. 422 do CC).

Deveres Laterais, Secundários ou Anexos das obrigações
Os deveres nascem a partir da incidência de comportamentos, ou seja, sua matriz não é puramente normativa, mas prática, por isso são denominados secundários, anexos ou instrumentais.

Em nosso CC, os deveres laterais não aparecem formando um sistema, mas em alguns artigos se fazem presentes, de regra, relacionados com culpa, são eles:

Venire contra factum proprium – é o ato inicial que o sujeito, futuramente, irá contrariar. Esse elemento tem por objetivo homenagear a credibilidade como segurança nas relações jurídicas e sociais. Aqui também, ainda que segundo plano, alude à segurança jurídica.

Supressio – pode ser compreendida como o fenômeno da perda, ou seja, a supressão de uma expectativa jurídica, alterada pelo decurso de uma prestação que se perfaz no tempo. Estaria esse instituto amparado pelo art. 330 do Código Civil.

Surrectio – consiste na extensão do conteúdo do negócio jurídico celebrado, levando em consideração a conduta de uma das partes que gera, na outra, a expectativa da existência de um direito diverso àquele expressamente avençado.

Tu quoque – é a inconsistência ou incoerência do comportamento da parte, que viola a boa-fé objetiva, encontramos essa figura na doutrina, com respaldo na jurisprudência, como modalidade de abuso de direito (art. 187 CC).

Caso essas ideias pareçam naturais a você, leitor, saiba que na prática não é sempre assim. Vivemos em um momento de choques ideológicos.

Em primeiro grau, juízes movidos por esses ideais proferem decisões a valorar os interesses da pessoa, na prática, significa dizer que contratos são revisados, cláusulas declaradas nulas e algumas vezes o contrato por inteiro.

Porém, o judiciário, por vezes, não julga conforme estes preceitos, tendo em vista uma visão mais conservadora que pode preponderar vez ou outra.

Daí a necessidade de se perceber o conflito e a quebra de paradigma. Devemos, veementemente, introduzir esses novos valores para, diante disso, passarmos à análise dos pactos privados à luz da Constituição, compreendendo o ser humano como o centro, do ordenamento jurídico. Afinal, na festa da vida, somos todos convidados e não penetras, a todo momento seremos reconduzidos ao mínimo para que cada ser humano viva bem, diga-se, dignamente.
*Fábio Vieira Figueiredo é advogado e professor de Direito Civil em cursos preparatórios para o Exame de Ordem e pós-graduação da EBRADI - Escola Brasileira de Direito.
http://www.migalhas.com.br/dePeso/16,MI259066,51045-Uma+visao+inovadora+do+direito+privado+brasileiro

Aécio pediu a Gilmar Mendes para conseguir voto a favor da lei de abuso de autoridade

Telefone do senador Aécio Neves estava interceptado quando foi gravado o diálogo.
sexta-feira, 19 de maio de 2017

Uma conversa entre o senador afastado Aécio Neves e o ministro do STF Gilmar Mendes foi interceptada pela procuradoria-Geral da República em investigação contra o parlamentar.

No diálogo, de 26 de abril, Aécio pede que Gilmar Mendes ligue para o senador Flexa Ribeiro pedindo que votasse no sentido que indicou Aécio, ao que o ministro concordou: "Eu falo com ele".

No mesmo dia, a Casa legislativa aprovou substitutivo do senador Roberto Requião ao PLS 85/17, que alterava a definição dos crimes na lei, e o texto seguiu para a Câmara.

Flexa Ribeiro integra a CCJ do Senado onde, também no dia 26, a matéria tramitou e foi aprovada.

Veja o diálogo, na íntegra:
Data: 26/04/2017
Hora: 09:29:13
Duração: 00:01:36
Alvo: Aécio Neves Interlocutores: Aécio Neves x Gilmar
De gravação:
AÉCIO NEVES: Oi, Gilmar. Alô.
GILMAR: Oi, tudo bem?
AÉCIO NEVES: Você sabe um telefone que você poderia dar que me ajudaria na condução çá. Não sei como é sua relação com ele, mas ponderando... enfim, ao final dizendo que me acompanhe lá, que era importante... era o Flexa, viu?
GILMAR: O Flexa. Tá bom, eu falo com ele.
AÉCIO NEVES: Porque ele é o outro titular da comissão, somos três, sabe? Né...
GILMAR: Tá bom, tá bom. Eu vou falar com ele. Eu falei... eu falei com o Anastasia e falei com o Tasso... Tasso não é da comissão, mas o Anastasia.... o Anastasia disse “Ah, tô tentando... [incompreensível]...” e...
AÉCIO NEVES: Dá uma palavrinha com o Flexa... a importância disso e no final dá sinal para ele porque ele não é muito assim... de entender a profundidade da coisa... fala ó... acompanha a posição do Aécio porque eu acho que é mais serena. Porque o que a gente pode fazer no limite? Apresenta um destaque para dar uma satisfação para a bancada e vota o texto.... que vote antes, entendeu?
GILMAR: Uhum
AÉCIO NEVES: Destaque é destaque... depois não vai ter voto, entendeu?
GILMAR: Uhum. Uhum.
AÉCIO NEVES: Pelo menos vota o texto e dá uma...
GILMAR: Uhum.
AÉCIO NEVES: Uma satisfação para ban... para não parecer que a bancada foi toda ela contrariada, entendeu?
GILMAR: Uhum.
AÉCIO NEVES: Se pudesse ligar pra Flexa ai e falar...
GILMAR: Eu falo com ele.... eu falo com ele... eu ligo pra ele... eu ligo pra ele agora.
AÉCIO NEVES: [incompreensível] ...importante.
GILMAR: Ligo pra ele agora.
AÉCIO NEVES: Um abraço.
A imagem da transcrição consta nos documentos da PGR.
Interceptação telefônica

A interceptação foi realizada no período de 21/4 a 5/5 deste ano. De acordo com o relatório da Polícia Federal, liberado nesta sexta-feira, 19, por Edson Fachi, a medida teve por fundamento fatos levados ao conhecimento da procuradoria por Joesley Batista e Ricardo Saudi, executivos da JBS, no acordo de delação premiada.

No relatório é possível encontrar a citação ao ministro Gilmar Mendes: "No que diz respeito a sua atividade parlamentar, destacou-se no Auto Circunstanciado que o investigado ligou para o Ministro GILMAR MENDES e pediu ao Ministro para que telefonasse para o Senador FLEXA RIBEIRO. Neste diálogo, o Senador investigado pede que o magistrado converse com FLEXA RIBEIRO para que este siga a orientação de voto proposta por AÉCIO NEVES."
http://www.migalhas.com.br/Quentes/17,MI259104,21048-Aecio+pediu+a+Gilmar+Mendes+para+conseguir+voto+a+favor+da+lei+de