quarta-feira, 2 de agosto de 2017

O filho maior de idade tem direito a receber pensão alimentícia?

A maioridade civil e a pensão alimentícia.

Publicado por DEBONE & VASCONCELOS ADVOGADOS

No direito de família os alimentos são devidos entre os cônjuges e companheiros, recíproco entre pais e filhos, extensivo aos ascendentes (avós, bisavós) e na falta deles aos irmãos, sendo a relação de parentesco concorrente entre si, conforme artigo 1.694 a 1.697 do Código Civil.

O direito à pensão alimentícia tem em vista a subsistência do alimentado. É comum, muitos devedores de pensão alimentícia trazerem consigo a errônea ideia de que a maioridade dos filhos é o marco para extinguir automaticamente a obrigação alimentar. De igual forma, muitos credores (filhos) que atingem a maioridade equivocadamente consentem com o término do pagamento da pensão alimentícia, quedando-se silentes e inertes, mesmo conscientes de que aquela verba alimentar ainda é de extrema necessidade para auxiliá-los na manutenção das suas condições mínimas de sobrevivência

Entretanto, a maioridade civil não é empecilho para a continuação do recebimento das pensões alimentícias.

Os pais, independentemente da situação conjugal, têm a obrigação legal de exercer plenamente o seu “poder familiar” em relação aos filhos menores (artigo 1.630 e 1.634 do Código Civil), conduzindo a criação e a educação dos mesmos e gerindo a vida dos filhos até completarem 18 anos de idade. Dentre as obrigações está o pagamento da pensão alimentícia aos menores. Do poder familiar decorre diretamente o “dever de sustento”.

Portanto, a menoridade dos filhos impõe a obrigação legal do devedor de pagar a pensão alimentícia a quem os necessita. Há uma presunção de dependência.

Entretanto, a situação do pagamento de pensão para os filhos maiores de idade é divergente e debatida na doutrina e na jurisprudência porque inexiste regramento legal expresso que menciona o marco final do pagamento da verba alimentar. A situação fática é analisada caso a caso e a construção jurisprudencial é a fonte primordial para o deslinde da controvérsia.

Se a maioridade do filho capaz faz encerrar o poder familiar e o dever obrigacional de sustento, de outro lado permanece uma relação de parentesco entre os pais e os filhos. Por isso, quando a prole maior de idade não puder por si mesmo se sustentar e provar a necessidade da pensão para suprir suas necessidades básicas de sobrevivência, os pais deverão continuar com o pagamento dos alimentos. Não se trata agora do dever de sustento e sim do “dever de solidariedade”.

Ser solidário no âmbito familiar não impõe apenas a assistência material, mas também mútuo dever de afeto, respeito, cooperação e ativa participação na condução da vida dos filhos.

Completar 18 anos de idade nem sempre significa estar totalmente apto para sozinho reger a sua própria vida financeira

No intuito de pacificar o tema sobre o não cancelamento automático do pagamento da pensão sob a alegação apenas da maioridade, o Superior Tribunal de Justiça editou a Súmula 358. Vejamos:
“STJ - Súmula 358. O cancelamento de pensão alimentícia de filho que atingiu a maioridade está sujeito à decisão judicial, mediante contraditório, ainda que nos próprios autos.”

O posicionamento jurisprudencial convencionou que a idade limite perdura até os 24 anos de idade, que é a média para formação nos cursos universitários, a partir do qual está apto a inserir-se no mercado de trabalho. Antes disso, a frequência em curso de ensino superior pressupõe a necessidade de continuar a receber a pensão para a ajuda do pagamento da mensalidade, materiais escolares e outros custos.

Ressalta-se, outrossim, que o filho maior pode necessitar dos alimentos por não possuir condições de saúde que lhe permitam sozinho se manter, cabendo ao devedor a continuidade do pagamento da pensão.

Mas é importante ressaltar que o pagamento da pensão não poderá se eternizar no tempo, evitando-se, assim, a ociosidade do filho. Além disso, pensão não é salário e tão pouco renda extra.

Artigo escrito por:
Leonardo Castro de Bone: Pós-graduando em Direito Tributário e Processo Tributário pela FDV/ES; Membro da Comissão Especial de Direito do Consumidor OAB/ES; Membro da Comissão Especial de Estudos Tributários OAB/ES

Kênia Silva Vasconcelos: Pós-graduada em Direito Processual pela PUC/MG; Membro da Comissão Especial de Direito do Consumidor OAB/ES; Membro da Comissão Especial de Direito Imobiliário OAB/ES;

https://leodebone.jusbrasil.com.br/artigos/483590520/o-filho-maior-de-idade-tem-direito-a-receber-pensao-alimenticia?utm_campaign=newsletter-daily_20170802_5734&utm_medium=email&utm_source=newsletter

Direito de preferência na venda de bem indivisível de múltipla titularidade

Por 
Direito de preferência é a prerrogativa de se adquirir um bem pelas mesmas condições oferecidas a terceiro (como preço e forma de pagamento). Tratando-se de bem comum, o exercício do direito de preferência objetiva mantê-lo no domínio de quem já é proprietário, evitando o ingresso de terceiro na gestão do patrimônio “ante o potencial conflituoso inerente a essa forma anômala de propriedade” (STJ, REsp 1137176/PR, rel. min. Marco Buzzi, 4ª Turma, 16/2/2016). Assim, a manutenção da titularidade do bem de propriedade comum pelo já coproprietário poderia evitar maiores animosidades entre os donos sobre a administração e uso do bem (artigo 1.314 do CC).
Para se operacionalizar o exercício do direito de preferência, o condômino deve ser notificado sobre a intenção do coproprietário de alhear fração ideal do bem antes que seja, de fato, transferida para terceiro. A lei não determina que se ofereça o quinhão aos demais condôminos antes de lançá-lo no mercado (embora tal conduta possa ser realizada por uma questão prática). Ou seja: em tese, pode-se colocar à venda o bem indiviso de propriedade, mas antes de fechado o negócio, deve ser concedido prazo para o exercício da preferência. Destaque-se que, nos bens imóveis, a propriedade apenas é transferida com o respectivo registro em cartório (artigo 1.245 do Código Civil).
No caso de bem indivisível comum, por expressa previsão legal, deve ser observado o direito de preferência do condômino (artigo 504 do CC). Na classificação do Código Civil, “bens divisíveis são os que se podem fracionar sem alteração na sua substância, diminuição considerável de valor, ou prejuízo do uso a que se destinam” (artigo 87). Em sentido contrário, “são indivisíveis os bens que não admitem divisão cômoda sem desvalorização ou dano, a exemplo de um cavalo de corrida”[1]. Em outros termos, um bem é considerado indivisível, quando, por suas características, “percebe-se não existir a possibilidade de divisão igualitária que mantivesse a substância e utilidade do referido bem, conforme disciplina o artigo 87 do Código Civil” (TJ-PE, Apelação Cível 313.102-0, rel. des. Eduardo Sertório Canto, 3ª Câmara Cível, j. 18/6/2014).
Os bens poderão ser indivisíveis por: 1) determinação legal (caso do módulo rural); 2) por convenção das partes; 3) por sua própria natureza (como um animal).  A jurisprudência admite que no caso concreto, pode ser difícil provar a indivisibilidade (STJ, REsp 9.934/SP, rel. min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, 4ª Turma, e REsp 1207129/MG, rel. min. Luis Felipe Salomão, 4ª Turma, 16/6/2015), vez que a “diminuição considerável de valor” pode obstar a divisão (artigo 87 do CC).
Como na alienação de quinhão para um condômino não há entrada de um terceiro na titularidade do bem comum, não é necessária a oferta para os demais coproprietários (STJ, REsp 1137176/PR, Rel. Min. Marco Buzzi, 4ª Turma, 16/02/2016). Sendo unidades autônomas de um condomínio, cada proprietário tem direitos exclusivos sobre seus bens. Não há o direito de preferência na alienação por serem bens naturalmente divisíveis.   
Diferentemente, na copropriedade de unidade de apartamento de edifício edilício (artigo 1.331 e seguintes do CC), as suas características revelam indivisibilidade. Na prática, é comum ocorrer essa configuração na aquisição de bem por causa mortis (v.g., irmãos que herdam apartamento deixado pelo genitor). Nessa hipótese, construir adaptações para torná-lo divisível (como pôr um muro interno para segmentar o imóvel), além de oneroso, poderia comprometer sua substância, diminuir-lhe consideravelmente o valor ou prejudicar-lhe o uso – o que revela a sua natureza indivisível (STJ, REsp 1207129/MG, rel. min. Luis Felipe Salomão, 4ª Turma, 16/06/2015; TJ-PE Apelação Cível 313.102-0, rel. des. Eduardo Sertório Canto, 3ª Câmara Cível, j. 18/06/2014; TJPE, Apelação Cível nº 0134302-6, rel. des. Eduardo Augusto Paurá Peres, 27/11/2006).
Importa destacar a peculiaridade sobre bens indivisíveis, mas passíveis de divisão. Como exemplo, têm-se a hipótese da copropriedade de imóvel com vários apartamentos e área comum não configurado na forma de condomínio edilício em que há indivisibilidade fática por ser um único registro para todo o bem (que pode discriminar apartamentos, mas sem matrículas próprias). Nesse caso, apesar de encontrar-se indivisível, pode passar por divisão como ao tornar-se edifício edilício. Houve celeuma doutrinária acerca da aplicabilidade do direito de preferência em tal hipótese. Porém, essa polêmica foi dirimida através de julgados do STJ que abordaram a questão, primeiramente, sob a égide do Código Civil anterior (REsp 489.860/SP, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Segunda Seção, julgado em 27/10/2004). Mais recentemente, a Quarta Turma do STJ ratificou essa orientação para que seja observado o direito de preferência do coproprietário previsto no artigo  504 do Código Civil, in verbis:
DIREITO CIVIL. CONDOMÍNIO. ARTIGO 504 DO CÓDIGO CIVIL. DIREITO DE PREFERÊNCIA DOS DEMAIS CONDÔMINOS NA VENDA DE COISA INDIVISÍVEL. IMÓVEL EM ESTADO DE INDIVISÃO, MAS PASSÍVEL DE DIVISÃO. MANUTENÇÃO DO ENTENDIMENTO EXARADO PELA SEGUNDA SEÇÃO TOMADO À LUZ DO ARTIGO 1.139 DO CÓDIGO CIVIL DE 1916.
1. O condômino que desejar alhear a fração ideal de bem em estado de indivisão, seja ele divisível ou indivisível, deverá dar preferência ao comunheiro da sua aquisição. Interpretação do artigo 504 do CC/2002 em consonância com o precedente da Segunda Seção do STJ (REsp n. 489.860/SP, Rel. Ministra Nancy Andrighi), exarado ainda sob a égide do CC/1916.
2. De fato, a comparação do artigo 504 do CC/2002 com o antigo artigo 1.139 do CC/1916 permite esclarecer que a única alteração substancial foi a relativa ao prazo decadencial, que - de seis meses - passou a ser de cento e oitenta dias e, como sabido, a contagem em meses e em dias ocorre de forma diversa; sendo que o STJ, como Corte responsável pela uniformização da interpretação da lei federal, um vez definida tese sobre determinada matéria, deve prestigiá-la, mantendo sua coesão.
3. Ademais, ao conceder o direito de preferência aos demais condôminos, pretendeu o legislador conciliar os objetivos particulares do vendedor com o intuito da comunidade de coproprietários. Certamente, a função social recomenda ser mais cômodo manter a propriedade entre os titulares originários, evitando desentendimento com a entrada de um estranho no grupo.
4. Deve-se levar em conta, ainda, o sistema jurídico como um todo, notadamente o parágrafo único do artigo 1.314 do CC/2002, que veda ao condômino, sem prévia aquiescência dos outros, dar posse, uso ou gozo da propriedade a estranhos (que são um minus em relação à transferência de propriedade), somado ao artigo 504 do mesmo diploma, que proíbe que o condômino em coisa indivisível venda a sua parte a estranhos, se outro consorte a quiser, tanto por tanto. 
5. Não se pode olvidar que, muitas vezes, na prática, mostra-se extremamente difícil a prova da indivisibilidade. Precedente: REsp 9.934/SP, Rel. Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira, Quarta Turma.
6. Na hipótese, como o próprio acórdão reconhece que o imóvel sub judice se encontra em estado de indivisão, apesar de ser ele divisível, há de se reconhecer o direito de preferência do condômino que pretenda adquirir o quinhão do comunheiro, uma vez preenchidos os demais requisitos legais.
7. Recurso especial provido. (REsp 1207129/MG, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, 4ª T, j. 16/06/2015)
Mais recentemente, o STJ tratou novamente sobre o direito de preferência em bens indivisíveis passíveis de divisão.  O caso abordava coproprietários de frações ideais de lotes de terras recebidos por doação. Um donatário alienou a sua parcela sobre o imóvel a outro condômino sem oferecer aos demais cotitulares.  Ante tal fato, os condôminos que se sentiram preteridos ajuizaram ação para pleitear a nulidade do negócio.  Contudo, o STJ entendeu pela desnecessidade de exercer o direito de preferência nessa situação, visto que só houve alterações no percentual da parte ideal de condômino que adquiriu a parte de outrem, sem ingresso de terceiros na titularidade do bem (REsp 1137176/PR, relator ministro Marco Buzzi, 4ª Turma, julgado em 16/02/2016).  Em outros termos, se o adquirente fosse um terceiro, na compra do bem indivisível que poderia passar por divisão, o imóvel mereceria ser ofertado a algum dos coproprietários em respeito ao direito de preferência. 
O Código Civil de 2002, assim como o anterior, não estabelece prazo para que o condômino regularmente cientificado possa informar a intenção de adquirir o quinhão do outro, fazendo jus ao exercício do direito de preferência. O STJ já entendeu, por exemplo, que o prazo de 4 dias  entre a missiva e a alienação para terceiro não viola o dispositivo legal (REsp 88.408/SP, rel. min. Salvio de Figueiredo Teixeira, 4ª Turma, julgado em 23/9/1998, DJ 18/12/1998[2]).
Se feita a alienação sem prévia e regular notificação ao condômino, há o prazo de 180 dias para que o comunheiro alegue judicialmente a inobservância do direito de preferência sobre o bem (conforme redação da parte final do artigo 504 do Código Civil), mediante Ação Anulatória de Prelação, depositando o valor em juízo. Caso não tenha ocorrido a ciência anteriormente, sendo imóvel, conta-se do registro do título de propriedade.
CONDOMÍNIO EM COISA INDIVISÍVEL - VENDA A TERCEIROS - AUSÊNCIA DE CONHECIMENTO DOS CO-PROPRIETÁRIOS - DIREITO DE PREFERÊNCIA - PRAZO DECADENCIAL - INÍCIO DA CONTAGEM - A PARTIR DA CIÊNCIA, PELO INTERESSADO, DA ALIENAÇÃO - É anulável a venda a terceiro de parte da coisa indivisível tida em condomínio quando não se der ciência aos co-proprietários que, em caso de preterição, poderão exercer o seu direito de preferência movendo a ação competente dentro do prazo decadencial de seis meses, contados a partir do momento em que tomarem ciência direta e efetiva da realização do negócio(alienação), não se admitindo a ciência presumida. Apelo improvido à unanimidade. (TJPE, Apelação Cível nº 28617-3, Relator Desembargador Florentino de Lima, 5ª Câmara Cível, data do julgamento: 25/04/2000).
O prazo de 180 dias é contado a partir da efetiva ciência da alienação (feita sem respeitar o regular direito de preferência). A manifestação desse conhecimento sobre a venda a terceiro pode dar-se de diferentes maneiras, visto que o Código não delimita uma forma específica. Sobre o tema, o Tribunal de Justiça de Pernambuco, em Ação de Inventário, considerou “que o termo inicial do prazo de cento e oitenta dias para o depósito do preço do bem que é objeto do exercício do direito de preferência se deu em 04/02/2010 (fls. 41/42), quando os herdeiros (ora agravantes) interpuseram petição requerendo ‘a nulidade de todos os atos processuais posteriores à juntada dos instrumentos de procuração anexados aos autos às fls. 617 e 900, inclusive do Alvará de venda nº 897/2009’, momento em que restou demonstrada a ciência destes da autorização judicial para venda do imóvel em comento”. (TJ-PE, inteiro teor do voto no Agravo de Instrumento nº 0249052-6, relator desembargador Roberto da Silva Maia, 1ª Câmara Cível, data do julgamento: 26/03/2013)
Do exposto, constata-se que direito de preferência entre coproprietários permite que o titular de um bem comum possa adquirir fração ideal alienada nas mesmas condições oferecidas por terceiro. Trata-se de uma previsão legal amparada pela jurisprudência com o objetivo de manter a pacificação social e o bom uso da propriedade, vez que o ingresso de terceiro alheio à comunhão pode aumentar o potencial de atrito entre os condôminos sobre a administração do bem. Tal prerrogativa é aplicável nas alienações de bens comuns indivisíveis por sua natureza ou por força de lei.  Outrossim, deve ser observada nas alienações de bens que, embora indivisíveis, permitam divisão, conforme tem sido compreendido pela jurisprudência.  
Referências bibliográficas
GAGLIANO, Pablo Stolze & PLAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo Curso Direito Civil. Parte Geral. Saraiva, 2009.
GOMES, Orlando. Introduções ao Direito Civil. Forense, 2001.
GONÇALVES, Roberto Carlos. Direito Civil Brasileiro. Volume V, Direito das Coisas. Saraiva, 2008.
FIGUEIREDO, Luciano & FIGUEIREDO, Roberto. Direito Civil. Parte Geral. JusPodivm, 2013.
MISQUIATI, Débora Fayad .  Venda de coisa comum indivisível. Artigo jurídico publicado no portal do Conselho Notarial do Brasil – Conselho Federal.  Disponível em <http://www.notariado.org.br/index.php?pG=X19leGliZV9ub3RpY2lhcw==&in=NTkwNQ==>. Acesso em 14/07/2017.
LOUREIRO, Luiz Guilherme. Registros Públicos: Teoria e Prática. Gen Método, 2014.

[1] FIGUEIREDO, Luciano & FIGUEIREDO, Roberto. Direito Civil. Parte Geral. JusPodivm, 2013, p. 311.
[2] (...) I - O art. 1.139 do Código Civil incumbe o condômino que deseja alhear seu quinhão do imóvel indiviso de promover a comunicação prévia aos demais, sem determinar o prazo que lhes deve ser concedido para o exercício da preferência. II - Assentado nas instâncias ordinárias ter havido essa comunicação, e nem afirmada má-fé da alienante pelas instâncias ordinárias, não há que se invocar violação do art. 1.139, CC. (REsp 88.408/SP, Rel. MIN. SALVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA, QUARTA TURMA, julgado em 23/09/1998, DJ 18/12/1998, p. 358)
Ana Carolina de Araújo Dantas Loureiro é advogada pós-graduada em Direito Público pela Universidade Federal de Pernambuco.
Revista Consultor Jurídico, 1 de agosto de 2017, 7h22

Execução de alimentos e prisão do devedor no novo Código de Processo Civil

Por 
No cumprimento de sentença ou de decisão antecipatória que tenha por objeto obrigação alimentar, sempre a requerimento do exequente, o juiz determinará a intimação pessoal do executado para, em três dias, pagar o débito, provar que o fez ou justificar a impossibilidade de efetuar o pagamento.
Para a execução de prestações alimentares, prevista no artigo 528 do novo Código de Processo Civil, com a possibilidade do decreto de prisão, exige-se a intimação pessoal do devedor, não bastando a mera intimação na pessoa de seu advogado. A observância dessa determinação é inafastável sempre que a execução de alimentos definitivos se der ex intervallo, com a prévia extinção do processo de conhecimento, ainda que não tenha transcorrido o prazo de um ano a contar do trânsito em julgado, de acordo com a previsão do artigo 513, parágrafo 4°, do aludido diploma legal. Fica, pois, excluída a aplicação da regra geral do artigo 513, parágrafo 2°, inciso I, que contempla a intimação pela imprensa oficial, na pessoa do advogado, para as execuções de alimentos definitivos, sob pena de prisão.
A necessidade da intimação pessoal na situação em apreço, como é evidente, decorre da gravidade da imposição da pena de prisão, que não pode surpreender o devedor em circunstância alguma. A intimação do devedor será feita por meio de carta com aviso de recebimento, encaminhada para o endereço constante dos autos, sendo ônus das partes mantê-lo atualizado (cf. artigo 274).
Todavia, se o cumprimento não for de sentença, mas de decisão antecipatória de tutela, instaurado em autos suplementares, forçosamente perante o mesmo juízo no qual ainda tramita o processo, entendo que é dispensável a intimação pessoal do devedor que tem procurador constituído nos autos. É suficiente que a intimação se aperfeiçoe na pessoa do advogado que representa o executado, o que propicia enorme economia de esforços e garante maior efetividade ao processo, dispensando atos e termos desnecessários.
Caso o executado não cumpra o comando judicial, o respectivo ato decisório poderá ser levado a protesto, incumbindo ao exequente apresentar certidão de inteiro teor do provimento condenatório ao cartório de protesto (artigo 517). A previsão de protesto do pronunciamento judicial confere maior efetividade à execução de alimentos, sendo ainda possível a inscrição do nome de devedor de alimentos no cadastro de proteção ao crédito, segundo preceituam os parágrafos 3° e 5° do artigo 782 do atual Código de Processo Civil.
Nesse sentido, de todo elogiável a decisão proferida, já sob a vigência do novo estatuto processual, pela magistrada Margot Chrisostomo Corrêa, da 2ª Vara de Família e Sucessões do Foro Regional do Butantã, da capital paulista, do seguinte teor: “Vistos. Fls. 411: A prisão civil já fora decretada às fls. 339/341, razão pela qual, ante o silêncio do executado à intimação das decisões de fls. 396 e 403, determino o cumprimento da ordem de prisão, devendo constar no mandado o valor atualizado do débito indicado, qual seja, R$ 22.805,90 (vinte e dois mil, oitocentos e cinco reais e noventa centavos). Ademais, nos termos do artigo 528, parágrafo 1°, do Código de Processo Civil, proceda-se ao protesto do pronunciamento judicial, negativando-se o CPF do executado junto aos órgãos de proteção ao crédito”.
Consoante o disposto no artigo 517, parágrafos 1° e 2°, expressamente referido pelo parágrafo 1° do artigo 528, como já antes frisado, caberá ao exequente apresentar ao tabelionato de protesto a certidão que indicará o nome e a qualificação do exequente e do executado, o número do processo, o valor da dívida e a data de decurso do prazo para pagamento voluntário.
Independentemente do protesto, no cumprimento que se processa sob pena de prisão, a execução de alimentos não comporta o acréscimo da multa prevista no artigo 523.
Acerca da incidência da multa em débito alimentar excutido por meio do procedimento previsto no revogado artigo 733, pontuava Maria Berenice Dias que: “Sobre o valor do débito não se incorpora a multa. Embora a lei diga que o montante da condenação será acrescido de multa no percentual de 10% (CPC/1973, artigo 475-J), tal encargo não integra a obrigação alimentar quando o pagamento é exigido sob pena de prisão. Descabe dupla sanção. No entanto, cumprida a prisão e não feito o pagamento, como a execução prossegue pelo rito do cumprimento de sentença (CPC/1973, artigo 475-J), a multa incide sobre a totalidade do débito” (“Execução dos alimentos e as reformas do Código de Processo Civil”, Revista Magister de Direito Civil e Processual Civil, 16:36).
A rigor, tal entendimento é ainda sustentável, sob a vigência do atual Código de Processo Civil, porque, se o cumprimento de sentença se iniciar pelo procedimento do artigo 528, admitido o decreto de prisão, mas se restar frustrado mesmo após a imposição da pena, o exequente poderá requerer o prosseguimento da execução por meio da sub-rogação de bens, nos termos do que dispõe o subsequente artigo 530. E, nessa hipótese, são perfeitamente cabíveis os acréscimos de multa e honorários previstos no parágrafo 1° do artigo 523.
Frise-se, ademais, que, consoante o parágrafo 7° do artigo 528, só é cabível a execução sob pena de prisão em relação às três prestações anteriores à instauração do cumprimento de sentença e a todas as demais que se vencerem no curso da execução. Trata-se da positivação de construção pretoriana que já havia sido consolidada no enunciado da Súmula 309/STJ (“O débito alimentar que autoriza a prisão civil do alimentante é o que compreende as três prestações anteriores ao ajuizamento da execução e as que se vencerem no curso do processo”), o que implica significativa distinção legislativa no tratamento concedido aos alimentos presentes e aos pretéritos.
Diante da considerável efetividade advinda do receio da pena de prisão, verifica-se que, ao restringir a possibilidade do seu decreto às três últimas prestações, o legislador praticamente retira a natureza alimentar das dívidas mais antigas, que só podem ser exigidas como débito comum, pelo procedimento previsto no Livro II, Título II, Capítulo III, do novel diploma processual, com temperamento das demais regras aplicáveis à execução de alimentos (excetuando-se, obviamente, a possibilidade do decreto de prisão do devedor).
Se esse entendimento era questionável sob a égide da apontada Súmula 309, deixa de sê-lo a partir da vigência do Código de Processo Civil, a teor do disposto no parágrafo 7° do artigo 528.
Assim, tratando-se de prestações vencidas há menos de três meses, o exequente pode optar pelo procedimento previsto no artigo 528, requerendo que o cumprimento da sentença ou da decisão de natureza antecipatória se efetive sob pena de prisão. Alternativamente, o devedor pode requerer o cumprimento de sentença previsto nos artigos 523 e seguintes do mesmo diploma, caso em que não será admissível o pedido de prisão do executado. Os meios executórios, nessa hipótese, devem recair sobre o patrimônio do devedor, com a penhora de bens suficientes à satisfação do crédito alimentar, e, se não houver o pagamento voluntário no prazo de 15 dias, a dívida sofrerá acréscimos de multa e de honorários.

Aduza-se que não cabe a fixação de honorários advocatícios se no prazo de três dias o devedor proceder ao pagamento do débito alimentar excutido. Primeiramente, porque não poderia haver decreto de prisão por dívida diversa da alimentar. Mas, além disso, há de se outorgar tratamento simétrico à questão, seja no cumprimento processado pelo artigo 528, seja naquele disciplinado pelo artigo 523. O parágrafo 1° desse dispositivo legal não deixa margem para dúvida: só cabe a fixação de honorários advocatícios de sucumbência, na fase de cumprimento de sentença, se o devedor intimado não proceder ao adimplemento da dívida, acrescida de custas, no prazo que para tanto lhe for assinado.
José Rogério Cruz e Tucci é professor titular e diretor da Faculdade de Direito da USP e membro da Academia Brasileira de Letras Jurídicas.
Revista Consultor Jurídico, 1 de agosto de 2017, 8h05
http://www.conjur.com.br/2017-ago-01/paradoxo-corte-execucao-alimentos-prisao-devedor-cpc