segunda-feira, 27 de novembro de 2017

Gestação de substituição e registro da filiação

Eudes Quintino de Oliveira Júnior

Todo o esforço da medicina deve ser desenvolvido para fornecer ao homem um padrão de vida com mais qualidade para que possa reunir as melhores condições de realizar os seus objetivos propostos.

domingo, 26 de novembro de 2017

Todas as normatizações, por mais dinâmicas que sejam, principalmente aquelas com incidência nas áreas médicas, devem experimentar revisões periódicas, justamente para que sejam submetidas às necessárias adequações, em razão da introcução das novas tecnologias que vão invadindo reiteradamente a ars curandi. E não só. Sendo um dos objetivos da Medicina a proteção da saúde humana com o aprimoramento dos conhecimentos do profissional e a utilização do progresso científico em benefício do paciente, todo o esforço deve ser desenvolvido para fornecer ao homem um padrão de vida com mais qualidade para que possa reunir as melhores condições de realizar os seus objetivos propostos.

Assim é que, no tocante à medicina genética, mais precisamente na área da reprodução assistida, o Conselho Federal de Medicina editou em 2013 a Resolução 2.013, estabelecendo os princípios éticos e bioéticos a serem observados na utilização das técnicas de reprodução assistida. Referida Resolução foi revogada dois anos após, por outra que levou o nº 2.121, encarregada de acrescentar as inovações reclamadas e necessárias para o procedimento. Nova Resolução, contemplada agora com o nº 2.168/2017, por sua vez, revogou a anterior e criou novos patamares e dimensões para a eficácia e sucesso dos procedimentos na área da reprodução assistida.1

Resolução, no caso específico, como é sabido, é o regramento feito para uma determinada categoria, com validade interna corporis, estabelecendo normas éticas e técnicas para solucionar os problemas relacionados com a reprodução humana, partindo da premissa que a infertilidade é um problema de saúde. Assim, no tocante à maternidade de substituição, pela Resolução agora revogada, era permitida a gestação compartilhada de substituição, desde que existisse um problema médico que contraindicasse a gestação da doadora genética, em caso de união homoafetiva ou de pessoa solteira, somente aos familiares dos parceiros numa relação de parentesco consanguíneo até o quarto grau, compreendendo, nesta ordem: mãe, irmã/avó, tia e prima, observando, em qualquer caso, a idade limite de 50 anos.

A nova normatização ampliou o rol e acrescentou também a filha e sobrinha como doadoras temporárias de útero. O acréscimo referido é justamente para ampliar a relação de mulheres ligadas à família e que possam voluntariamente colaborar com o processo de procriação pretendido. O dispositivo deontológico, de certa forma, após estabelecer o limite máximo de idade das eventuais colaboradoras intrafamílias, de forma clara e imbuído do bom senso norteador que exige a matéria, levando-se em consideração o princípio da autonomia da vontade do paciente, admite a utilização das técnicas de reprodução assistida, em mulheres acima de 50 anos, desde que seja feita uma avaliação técnica e científica consubstanciada em parecer médico devidamente fundamentado, com o devido esclarecimento à candidata dos riscos que envolvem o procedimento.

Também a mesma Resolução deixa a entender que, excetuando o relacionamento familiar, é possível também encontrar colaboradora. Assim, não havendo candidatas no âmbito familiar, pessoa não aparentada poderá exercer a maternidade de substituição, desde que preenchidas as seguintes condições, com a devida autorização do Conselho Regional de Medicina: a) documento que comprova que a paciente não reúne condições para a gravidez e que a doadora se encontra em condições saudáveis para assumir a maternidade de substituição e, em caso de não ser parente, que o a decisão vem calcada somente pelos laços de amizade, solidariedade e afinidades familiares; b) elaboração do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido entre a paciente e a doadora temporária de útero especificando todos os detalhes técnicos do procedimento e os riscos existentes; c) apresentação de documento explicitando que não há qualquer compensação financeira pela cessão temporária do útero, com a consequente entrega da criança à mãe genética; d) a mãe genética deve conferir o tratamento e acompanhamento médico, abrangendo equipes multidisciplinares, se necessário, à doadora de útero, até o puerpério; e) se a cedente for casada ou viver em união estável, o cônjuge ou o companheiro deve aprovar o procedimento.

Outro problema que surgia era exatamente o assento de nascimento da criança que, inicialmente, era feito em nome da mulher que exerceu a maternidade substitutiva, em razão da até então inquebrantável regra da maternitas certa est e, posteriormente, buscava-se o Poder Judiciário para anular o registro e nele fazer inserir os dados dos pais genéticos.

A Corregedoria Nacional de Justiça, em boa hora, editou o Provimento 52, de 15 de março de 2016, do Conselho Nacional de Justiça, dispondo sobre o registro de nascimento e emissão da respectiva certidão dos filhos havidos por reprodução assistida. Na primeira parte do documento cuida da regularização, sem qualquer intervenção judicial, dos filhos gerados pelas técnicas de reprodução assistida de casal heteroafetivo ou homoafetivo, observando, com relação ao último, dentre outras exigências, que o assento de nascimento deverá ser adequado para que constem os nomes dos ascendentes sem qualquer distinção quanto à ascendência paterna ou materna.

O recente Provimento 63 da Corregedoria Nacional de Justiça, publicado no dia 17 de novembro de 2017, considerando a necessidade de uniformização dos registros de nascimento e da emissão da respectiva certidão para filhos havidos por técnica de reprodução assistida de casais homoafetivo ou heteroafetivos, foi mais além e estabeleceu a salutar regra contida no artigo 17, III, § 1º: "Na hipótese de gestação por substituição, não constará do registro o nome da parturiente, informado na declaração de nascido vivo, devendo ser apresentado termo de compromisso firmado pela doadora temporária do útero, esclarecendo a questão da filiação".2

Não há, portanto, necessidade de autorização judicial. O ato poderá ser realizado perante o cartório de registro civil das pessoas naturais de todo país, bastando somente a presença dos pais munidos da documentação exigida pelo Provimento. É exemplo típico de instrumentos legais que dialogam entre si com a finalidade específica de proporcionar ao homem a solução mais adequada para resolver os entraves entre a cessão temporária de útero e o registro da prole.
____________________
1 REPRODUÇÃO ASSISTIDA: CFM anuncia novas regras para o uso de técnicas de fertilização e inseminação no País
2 Provimento nº 63/2017 do CNJ institui novos modelos nacionais para as certidões de Registro Civil
_____________________

*Eudes Quintino de Oliveira Júnior é promotor de justiça aposentado/SP, mestre em Direito Público, pós-doutorado em ciências da saúde, advogado, reitor da Unorp e membro ad hoc da CONEP/CNS/MS.

http://www.migalhas.com.br/dePeso/16,MI269802,11049-Gestacao+de+substituicao+e+registro+da+filiacao

STJ: Mulher que pode trabalhar não tem direito à pensão do ex-marido

Decisão é da 3ª turma do STJ.
segunda-feira, 27 de novembro de 2017

"O fim de uma relação amorosa deve estimular a independência de vidas e não, ao contrário, o ócio, pois não constitui garantia material perpétua. O dever de prestar alimentos entre ex-cônjuges ou companheiros é regra excepcional que desafia interpretação restritiva, ressalvadas as peculiaridades do caso concreto, tais como a impossibilidade de o beneficiário laborar ou eventual acometimento de doença invalidante."

Com esse entendimento, a 3ª turma do STJ deu provimento a recurso especial para exonerar o ex-marido de continuar pagando pensão alimentícia em dinheiro à ex-mulher.

Após o fim do relacionamento, ele foi condenado a arcar mensalmente com o valor de 4,7 salários mínimos a título de pensão alimentícia, sendo três salários em dinheiro e 1,7 salários mínimos correspondentes à metade do valor do aluguel do imóvel comum, ainda não partilhado, que é utilizado exclusivamente pela ex-companheira.

Na ação de exoneração de alimentos, a alteração da condição financeira da mulher e o fato de ela já ter iniciado uma nova relação afetiva serviram como fundamentos para a interrupção da obrigação.

Em 1ª instância, o juízo reconheceu o aumento das possibilidades financeiras da ex-companheira e dispensou o pagamento em dinheiro, mantendo a pensão em 1,7 salários mínimos, na forma de ocupação exclusiva do imóvel comum. No caso de desocupação do imóvel, a importância equivalente à metade do aluguel deveria ser paga em espécie.

O TJ, no entanto, restabeleceu integralmente a obrigação alimentar por entender que não teria sido comprovada a constituição de união estável entre a mulher e seu novo namorado e que o aumento nos seus vencimentos visava garantir o poder aquisitivo e não representou ganho salarial.

Temporário

O relator do recurso no STJ, ministro Villas Bôas Cueva, destacou que o entendimento do tribunal de origem destoa da jurisprudência da Corte sobre o caráter temporário da pensão alimentícia.

Citando julgado da ministra Nancy Andrighi, Villas Bôas afirmou que os alimentos devidos a ex-cônjuge devem apenas assegurar tempo hábil para sua "inserção, recolocação ou progressão no mercado de trabalho, que lhe possibilite manter, pelas próprias forças, status social similar ao período do relacionamento".

"No caso dos autos, pode-se aferir a plena capacidade da recorrente para trabalhar, tanto que se encontra empregada, atual realidade da vida moderna. Assim, impõe-se a exoneração gradual da obrigação alimentar, independentemente da qualificação da nova relação amorosa da alimentanda, na forma posta na sentença."

Exoneração

O ministro lembrou ainda que, conforme estabelecido em precedente da 2ª seção do STJ, o fato de a ex-mulher residir sozinha no imóvel – já que a partilha está sob pendência judicial – garante ao ex-marido o direito de receber aluguel pelo uso privado do bem comum.

Foi determinada, então, a exoneração do pagamento da pensão em dinheiro, em razão do uso privado da residência e das demais circunstâncias do caso, e especialmente porque, conforme destacou o relator, a ex-mulher já recebeu o auxílio por quase uma década.

Na hipótese de desocupação do imóvel, o pagamento do valor de 1,7 salário mínimo deverá ser feito em espécie, mas apenas até partilha, data em que o homem ficará definitivamente exonerado de qualquer obrigação alimentar.

O relator ressalvou a possibilidade de a recorrida, caso necessite, formular novo pedido de alimentos direcionado a seus familiares, uma vez que "o ordenamento pátrio prevê o dever de solidariedade alimentar decorrente do parentesco (artigos 1.694 e 1.695 do CC)".

O processo corre em segredo de Justiça.

Informações: STJ
http://www.migalhas.com.br/Quentes/17,MI269868,101048-Mulher+que+pode+trabalhar+nao+tem+direito+a+pensao+do+exmarido