terça-feira, 22 de maio de 2018

Opinião: Escritura de união poliafetiva com efeitos de união estável é ilegal

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O pedido de providências da ADFAS
A Associação de Direito de Família e das Sucessões (ADFAS) pediu providências ao Conselho Nacional de Justiça para que seja vedada a lavratura de escrituras públicas de uniões poliafetivas como uniões estáveis e com os respectivos efeitos.
O pedido fundamenta-se na ilegalidade dessas escrituras, decorrente do disposto na Constituição Federal (artigo 226, parágrafo 3º) e na legislação infraconstitucional (Código Civil, artigo 1.723) que estabelecem o requisito da monogamia para o reconhecimento de união estável e de seus respectivos efeitos.
A proibição de lavratura de escritura pública pelo CNJ, em razão de ilegalidade, tem precedente, como já ocorreu em relação à escritura pública de inventário e partilha sobre bens localizados no exterior, em razão da existência de violação ao Código de Processo Civil, segundo o qual a competência da autoridade brasileira destina-se a partilhar bens situados no Brasil, entendendo-se, por exclusão, que os bens situados no estrangeiro estão fora da competência da autoridade pátria (Resolução 35/2007, artigo 29).
Em decisão liminar, a ministra Nancy Andrighi, enquanto corregedora nacional de Justiça, recomendou que não fossem lavradas essas escrituras até o julgamento do pedido de providências, que teve início em 24 de abril de 2018, quando o ministro João Otávio de Noronha, atual corregedor nacional de Justiça, preferiu voto pela procedência do pedido de providências, e terá continuidade em 22 de maio de 2018.
As escrituras de uniões poliafetivas
As escrituras públicas declaram que as relações entre três pessoas têm a natureza de entidade familiar, com o regramento da união estável e os respectivos efeitos jurídicos pessoais, como o dever de lealdade, e patrimoniais, como o regime da comunhão parcial previsto para o casamento (Código Civil, artigos 1.658 a 1.666).
Também nos efeitos por morte é feita a equiparação à união estável (Código Civil, artigo 1.790).
E, ainda, pretende-se alcançar, por meio dessas escrituras e declaração de dependência recíproca, efeitos perante o Instituto Nacional de Seguridade Social, Receita Federal, seguradoras, convênios médicos e hospitalares, clubes, entre outros.
Essas escrituras declaram a existência da união poliafetiva e também que essa relação tem efeitos que a lei atribui exclusivamente às uniões monogâmicas.
Ilegalidade das escrituras de união poliafetiva
No pedido de providências da ADFAS não se pretende proibir que alguém viva uma relação poligâmica.
O que se requer é a proibição aos Tabelionatos de Notas que declarem efeitos jurídicos que uma relação não tem segundo a ordem legal.
Conforme Ives Gandra da Silva Martins, a especial proteção à família por parte do Estado foi erigida ao nível constitucional, de modo que a interpretação do artigo 226, em todos os seus parágrafos, deve ser realizada sob o fundamento de que a família é a “base da sociedade”[1].
A Constituição Federal estabelece no artigo 226, parágrafo 3º, que a união estável é monogâmica, podendo ser constituída somente por duas pessoas:
Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento.
O Código Civil estabelece no artigo 1.723, caput, o reconhecimento da união estável como entidade familiar, destacando sua formação entre duas pessoas e o seu objetivo específico de constituição de família.
Saliente-se que não foi abandonado o princípio da monogamia no acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal (ADPF 132 e na ADI 4.277) que determinou a aplicação daquele dispositivo do Código Civil às uniões homoafetivas, muito ao contrário:
“... proposição de que a isonomia entre casais heteroafetivos e pares homoafetivos somente ganha plenitude de sentido se desembocar no igual direito subjetivo à formação de uma autonomizada família... Reconhecimento que é de ser feito segundo as mesmas regras e com as mesmas conseqüências da união estável heteroafetiva.” (relator ministro Carlos Ayres Britto)
“Pede-se seja obrigatório o reconhecimento, no Brasil, da legitimidade da união entre pessoas do mesmo sexo, como entidade familiar, desde que atendidos os requisitos exigidos para a constituição da união estável entre homem e mulher e que os mesmos direitos e deveres dos companheiros nas uniões estáveis estendam-se aos companheiros nas uniões entre pessoas do mesmo sexo.” (ministra Cármen Lúcia).
“...reconhecida a união homoafetiva como entidade familiar aplicam-se a ela as regras do instituto que lhe é mais próximo, qual seja, a união estável heterossexual, mas apenas nos aspectos em que são assemelhados...” (ministro Ricardo Lewandowski).
“... por isso, nesse momento, limito-me a reconhecer a existência da união entre pessoas do mesmo sexo... e, com suporte na teoria do pensamento do possível, determinar a aplicação de um modelo de proteção semelhante – no caso, o que trata da união estável –, naquilo que for cabível, nos termos da fundamentação aqui apresentada, sem me pronunciar sobre outros desdobramentos...” (ministro Gilmar Mendes).
“... E se deve preenchê-la, segundo as regras tradicionais, pela aplicação da analogia, diante, basicamente, da similitude - não da igualdade -, da similitude factual entre ambas as entidades de que cogitamos: a união estável entre o homem e a mulher e a união entre pessoas do mesmo sexo.” (ministro Cezar Peluso).
Portanto, não há lacuna legal. Existe previsão legal expressa de que a união estável somente pode ser constituída entre duas pessoas, do que decorre a ilegalidade das escrituras em tela.
Afetividade, por si só, não constitui direitos
O Direito somente tutela a afetividade em caso de relações lícitas, válidas e que acatam a ordem jurídica.
O sedutor e falso argumento da afetividade, é sempre acompanhado da alegação de que a liberdade e a dignidade não podem ser violadas pelo Estado.
O direito à liberdade não pode implicar completa ausência de limitações.
A dignidade da pessoa humana, como fundamento da República Federativa do Brasil (Constituição, artigo 1º, III) não é um conceito meramente individual, que cada um forja ao seu próprio talante.
Fatos da vida e fatos jurídicos
A intermediação entre o chamado fato da vida e o fato jurídico é feita pela norma jurídica, que “adjetiva os fatos do mundo, conferindo-lhes uma característica que os torna espécie distinta dentre os demais fatos – o ser fato jurídico”, como explica Bernardes de Mello[2].
Como já expressava Pontes de Miranda “Para que os fatos sejam jurídicos, é preciso que regras jurídicas - isto é, normas abstratas - incidam sobre eles, desçam e encontrem os fatos, colorindo-os, fazendo-os ‘jurídicos’”[3].
Como acentua Ricardo Dip, a atividade notarial submete-se às normas e aos princípios e não simplesmente ao acolhimento de um fato [4].
É de clareza solar que a relação afetiva entre três pessoas ou mais não está abarcada pelo suporte fático normativo da união estável.
Conforme lições de Pontes de Miranda e de Marcos Bernardes de Mello, “objeto ilícito é aquele contrário a direito, portanto, não somente à lei, mas também à moral (bons costumes) e à ordem pública”[5]. Assim, o ato jurídico praticado pelo Tabelião ao lavrar escrituras de uniões poliafetivas, por violar disposição legal, tem objeto ilícito o que importa, de acordo com o artigo 166 do Código Civil, na sua nulidade.
Note-se que na defesa da legalidade das escrituras em tela os argumentos voltam-se à atribuição de efeitos de direito de família, sucessórios e previdenciários à mancebia. Não há nada mais equivocado. As instâncias superiores de nossos tribunais são uniformemente contrárias à atribuição de efeitos jurídicos de direito de família, sucessórios e previdenciários às relações que compreendem mais do que duas pessoas[6]. O Superior Tribunal de Justiça disponibilizou em “Jurisprudência em Teses” os entendimentos consolidados sobre o tema da união estável, deixando clara a inviabilidade jurídica da poligamia[7].
Autonomia notarial sujeita aos comandos legais
Os Tabelionatos de Notas devem cumprir a lei, e não fazer a lei.
Como acentua Ricardo Dip, na obra Prudência Notarial:
“...ser jurista, em síntese, é ser ‘alguém do direito’, o que se ocupa de saber o direito.”, sendo que “...a função política (ou social) do notário não é apenas a de ser jurista, mas é, sobretudo, a de ser um jurista a quem se faz convergir a titularidade da fé pública.”[8].
Na conformidade da obra Direito Notarial e Registral Avançado:
“A doutrina atesta que a fé pública do Notário... importa em exatidão, enquanto traduz a concordância entre o escrito e a realidade jurídica”[9].
A “fé pública” sempre é relacionada à confiabilidade social, sujeitando a todos, “inclusive o Estado e o juiz, se, afinal, o documento notarial lhe for apresentado para que produza seus efeitos”[10] .
É equivocado o argumento de que haveria legalidade na lavratura das escrituras em tela porque sua natureza seria meramente declaratória, de modo que não haveria, prima facie, qualquer violação à ordem legal, uma vez que não modificam a esfera jurídica dos declarantes, constituindo relações jurídicas.
Somente se pode declarar o que já existe no mundo jurídico.
Quando a escritura pública de “união poliafetiva” declara, está afirmando, sem suporte legal, que aquela relação fática entre três ou mais pessoas entrou no mundo jurídico.
No entanto, essas “uniões poliafetivas” não entraram no mundo jurídico como entidades familiares, com os respectivos efeitos.
Quando o Tabelião lavra uma escritura de “união poliafetiva” como união estável não confere a proteção do ordenamento jurídico àqueles que o procuraram com o intuito de obtê-la, faz mau uso da confiança que a sociedade nele depositou, transmitindo a esta a errônea informação - com presunção de existência e veracidade - de que entrou no mundo jurídico aquilo que, em verdade, nele não adentrou. A pretexto de desjudicializar, inutilmente judicializa.
No entanto, as escrituras públicas possuem eficácia constitutiva, além da declaratória.
Como ensinam Paulo Roberto Gaiger Ferreira e Felipe Leonardo Rodrigues: “A natureza jurídica da escritura pública é constitutiva obrigacional. Os atos e negócios jurídicos que formaliza constituem direitos e obrigações para a parte ou partes”[11].
Em suma, não vedar essas escrituras equivaleria a permitir que o Tabelião dissesse a alguém que é titular de um direito que não tem, gerando uma falsa expectativa e violando a fé pública, assim como permitiria que recebesse emolumentos por dar a indevida fé pública a um fato ao qual a lei veda a atribuição de efeitos jurídicos.
Isolados casos de poligamia não modificaram o pensamento social
São tão isolados os casos de relações de poligamia que no processo foram apresentadas somente três escrituras de chamadas uniões poliafetivas como uniões estáveis, mesmo após a expedição de ofícios às Corregedorias Estaduais, o que demonstra que não houve mudança do pensamento social.
O argumento de que os casamentos em famílias árabes celebrados fora do Brasil e que depois fixam residência em nosso território não poderiam deixar de ter seus direitos reconhecidos, não se sustenta em face do disposto no artigo 7º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (Lindb):
"A lei do país em que domiciliada a pessoa determina as regras sobre o começo e o fim da personalidade, o nome, a capacidade e os direitos de família".
Como esclarece Maristela Basso[12]:
“Com efeito, a fixação permanente de um estrangeiro em determinado país que não aquele de sua nacionalidade aproxima-o muito mais da realidade de um novo ordenamento jurídico, cujos valores e fundamentos se agregam às relações intersubjetivas que essa pessoa passa a estabelecer.”.
Os casamentos ocorridos no exterior em que um homem tem até quatro esposas, como permite o Alcorão, o que é adotado na Arábia Saudita, não são reconhecidos no Brasil. Assim, se um árabe estabelece sua residência no Brasil, não poderá ter reconhecidos seus dois, ou três, ou quatro casamentos.
Como dispõe o artigo 17 da Lindb:
As leis, atos e sentenças de outro país, bem como quaisquer declarações de vontade, não terão eficácia no Brasil, quando ofenderem a soberania nacional, a ordem pública e os bons costumes.
A ordem pública, no Brasil, impõe a monogamia.
Enfatiza Maristela Basso:
“Todos os Estados estão abertos à aplicação de lei estrangeira em seu território, desde que não seja contrária aos princípios norteadores da ordem pública, e, tendo o direito internacional privado a função precípua de apontar direito adequado à solução do caso misto, este direito poderá ser o estrangeiro e pode acontecer que seja ofensivo à ordem pública local. E, assim sendo, não deve ser aplicado.”[13].
Casamentos poligâmicos não têm validade no Brasil, por ofender a soberania nacional e as normas de ordem pública.
E não nos olvidemos de que o casamento em bigamia é nulo, conforme estabelecem os artigos 1521, VI e 1548, II do Código Civil.
Democracia não importa desrespeito à lei
A alegação de que, se for deferido o Pedido de Providências, o Brasil seria transformado em Estado teocrático, com a aplicação de dogmas religiosos como se fossem normas estatais, é insustentável.
O Brasil é efetivamente um Estado laico, o que não pode ser confundido com um país sem leis. Porque o nosso país não tem uma religião, isto não dá a um Tabelião a possibilidade de descumprir os ditames legais.
Argumentos apelativos como esse e como o de que o Brasil seria um Estado totalitário por estar aniquilando as liberdades individuais não podem ser acolhidos.
Se as leis brasileiras, baseadas nos costumes de nossa nação, pudessem ser desrespeitadas, outras leis, fundamentadas em costumes de países que adotam a poligamia, poderiam ser aplicadas no Brasil, desde as que exigem a permissão do homem (pai, ou tutor, ou marido) para uma mulher casar-se, solicitar a emissão de passaporte, viajar para o exterior, abrir uma conta bancária, começar um negócio ou passar por uma intervenção médica, até as que dão à mulher o direito de ter a guarda somente de filhos em tenra idade.
Grave ofensa aos direitos fundamentais, à dignidade da pessoa humana e ao princípio da igualdade de gêneros, seria admitida em nosso país, contra o que estabelece a Constituição Federal.
As liberdades individuais existem num estado democrático de direito somente até o ponto em que não ofendam a lei e a ordem pública.
Afinal em Estado Democrático de Direito não se pode atuar contra as normas existentes.
Em razão de todas as leis brasileiras terem como base a monogamia nas relações de união estável e de casamento, desde as que protegem a família, até as que regulam os mais variados benefícios por dependência conjugal, como as leis da previdência social, há inegável fundamento para ser dada procedência ao pedido de providências da ADFAS, como bem já votou o relator do processo, o corregedor nacional de Justiça, ministro João Otávio de Noronha.
[1] MARTINS, IVES GANDRA DA SILVA. Alguns aspectos constitucionais sobre a família, in Revista de Direito de Família e das Sucessões — RDFAS, coord. Nelson Nery Junior, Regina Beatriz Tavares da Silva e Theodureto de Almeida Camargo Neto, São Paulo, Revista dos Tribunais, out./dez. 2014, v. 2, p. 71/80.
[2] BERNARDES DE MELLO, Marcos. Teoria do Fato Jurídico: Plano da Eficácia. 8ª ed., São Paulo: Ed. Saraiva, 2013, p. 39.
[3] PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Tratado de Direito Privado: pessoas físicas e jurídicas, obra citada, p. 65 e 148.
[4] DIP, Ricardo, Prudência Notarial. São Paulo: Quinta Editorial, 2012, p. 39.
[5] BERNARDES DE MELLO, Marcos. Teoria do Fato Jurídico: Plano da Validade, 12ª ed. São Paulo: Ed. Saraiva, 2013, p. 145 e 236.
[6] STF, RE 397.762/BA, 1ª Turma Rel. Min. Marco Aurélio, DJ 3.6.2008. STJ, REsp 1348458/MG, 3ª Turma, Rel. Min. Nancy Andrighi, j. 08/05/2014; REsp 988.090/MS, 4ª Turma, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, j. 02/02/2010; REsp 931.155/RS, 3ª Turma, Rel. Min. Nancy Andrighi, j. 07/08/2007; REsp 1.047.538/RS, 3ª T., Rel. Min. Nancy Andrighi, j. 04/11/2008; REsp 1.096.539/RS, 4ª Turma, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, j. 27/3/2012; REsp 874.443/RS, 4ª Turma, Rel. Min. Aldir Passarinho Junior, j. 24/08/2010; REsp 1.142.584/SC, 6ª Turma, Rel. Min. Haroldo Rodrigues, j. 01/12/2009; AgRg no Ag 670.502/RJ, 3ª Turma, Rel. Min. Ari Pargendler, j. 19/06/2008; REsp 684.407/RS, 4ª Turma, Rel. Min. Jorge Scartezzini, DJ de 27/6/2005; AgRg no Ag 1130816, 3ª Turma, Rel. Min. Vasco Della Giustina, j. 27/08/2010; REsp 1.157.273/RN, 3ª Turma, Rel. Min. Nancy Andrighi, j. 18/05/2010.
[7] “4) Não é possível o reconhecimento de uniões estáveis simultâneas.”. “5) A existência de casamento válido não obsta o reconhecimento da união estável, desde que haja separação de fato ou judicial entre os casados.”. 14) É inviável a concessão de indenização à concubina, que mantivera relacionamento com homem casado, uma vez que tal providência daria ao concubinato maior proteção do que aquela conferida ao casamento e à união estável.”. “15) Compete à Justiça Federal analisar, incidentalmente e como prejudicial de mérito, o reconhecimento da união estável nas hipóteses em que se pleiteia a concessão de benefício previdenciário.”
[8] DIP, Ricardo, obra citada, p. 27/30.
[9] AMADEI, Vicente de Abreu. A Fé Pública nas Notas e nos Registros In: YOSHIDA, Consuelo Yatsuda Moromizato, FIGUEIREDO SANTOS, Marcelo de Oliveira Fausto e AMADEI, Vicente de Abreu. Direito Notarial e Registral Avançado. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014, p. 47.
[10]FERREIRA, Paulo Roberto Gaiger e RODRIGUES, Felipe Leonardo. Ata notarial - doutrina, prática e meio de prova. São Paulo: Quartier Latim, 2010, p 91.
[11] FERREIRA, Paulo Roberto Gaiger e RODRIGUES, Felipe Leonardo, obra citada, p. 35 e 113.
[12] BASSO, Maristela. Curso de direito internacional privado. 5. ed. São Paulo: Atlas, 2016, p. 241 e ss.

[13] BASSO, Maristela, obra citada, p. 379 e ss.
Regina Beatriz Tavares da Silva é doutora em Direito pela USP. Pós-doutora em Biodireito pela Universidade de Lisboa. Presidente Nacional da ADFAS. Titular e fundadora de Regina Beatriz Tavares da Silva Sociedade de Advogados.
Revista Consultor Jurídico, 21 de maio de 2018, 7h17
https://www.conjur.com.br/2018-mai-21/regina-silva-uniao-poliafetiva-efeitos-uniao-estavel-ilegal

STJ valida mudança em acordo de partilha com trânsito em julgado

A homologação de um acordo diverso daquele já homologado e transitado em julgado em ação de divórcio consensual é possível mesmo nos casos em que o novo ajuste envolve partilha de bens diferente da que havia sido estabelecida inicialmente entre as partes.
Dessa forma, a 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça deu provimento a um recurso especial para determinar que o juízo de primeiro grau examine o conteúdo do acordo celebrado entre as partes para homologá-lo caso estejam preenchidos os requisitos exigidos no artigo 104 do Código Civil.
Segundo o processo, o primeiro acordo, homologado judicialmente e com trânsito em julgado, definiu que após a separação os imóveis do casal seriam colocados à venda no prazo de seis meses e cada um ficaria com 50% dos valores apurados. Após 13 meses sem vender nenhum dos bens, o casal requereu a homologação de novo acordo, pelo qual caberia um imóvel para a mulher e os demais para o homem.
O pedido foi rejeitado nas instâncias ordinárias. O tribunal de segundo grau entendeu ser inviável a homologação do acordo, já que versava sobre coisa julgada, e por isso os interessados deveriam ajuizar ação anulatória.
Para a ministra relatora do recurso especial, Nancy Andrighi, a interpretação das instâncias de origem não privilegia a celeridade que deve reger as relações entre jurisdicionado e jurisdição.
“Simplesmente remeter as partes a uma ação anulatória para a modificação do acordo, negando-lhes o acordo modificativo sobre transação havida naqueles próprios autos pouco mais de um ano antes, traduz-se, em última análise, no privilégio da forma em detrimento do conteúdo, em clara afronta à economia, celeridade e razoável duração do processo”, justificou a relatora.
No entendimento da ministra, o acórdão recorrido está na contramão dos esforços de desjudicialização dos conflitos, materializando uma “injustificável” invasão do Poder Judiciário na esfera privada das pessoas.
Nancy Andrighi disse que a desjudicialização dos conflitos deve ser “francamente incentivada, estimulando-se a adoção da solução consensual, dos métodos autocompositivos e do uso dos mecanismos adequados de solução das controvérsias, tendo como base a capacidade que possuem as partes de livremente convencionar e dispor sobre os seus bens, direitos e destinos”.
Ela lembrou que desde 2007 as partes podem dissolver consensualmente o matrimônio por escritura pública e independentemente de homologação judicial (Lei 11.441/07), o que só não foi feito pelo casal à época em razão de suas filhas serem menores, circunstância que não mais se verifica.
“A coisa julgada material formada em virtude de acordo celebrado por partes maiores e capazes, versando sobre a partilha de bens imóveis privados e disponíveis e que fora homologado judicialmente por ocasião de divórcio consensual, não impede que haja um novo ajuste consensual sobre o destino dos referidos bens, assentado no princípio da autonomia da vontade e na possibilidade de dissolução do casamento até mesmo na esfera extrajudicial, especialmente diante da demonstrada dificuldade do cumprimento do acordo na forma inicialmente pactuada”, resumiu Nancy Andrighi. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.
Revista Consultor Jurídico, 21 de maio de 2018, 10h32
https://www.conjur.com.br/2018-mai-21/stj-valida-mudanca-acordo-partilha-transito-julgado
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TRF-5 determina divisão de pensão por morte entre mulher e amante

Por maioria, a 4ª Turma do Tribunal Regional Federal da 5ª Região determinou a divisão de pensão por morte de um servidor público federal que mantinha, concomitantemente, uma relação matrimonial e uma extraconjugal duradoura. A ação foi movida pela amante do servidor.
Para o desembargador federal Rubens Canuto, condutor do voto vencedor, caso provada a existência de relação extraconjugal duradoura, pública e com a intenção de constituir família, ainda que concomitante ao casamento, deve ser conferida a ela a mesma proteção dada à relação matrimonial e à união estável, mas desde que o cônjuge não faltoso com os deveres do casamento tenha efetiva ciência da existência dessa outra relação fora do casamento.
“As provas denotam que o falecido, quando vivo, dispensava cuidados também em relação à autora, notadamente quanto à sua saúde, moradia, assistência afetiva, inclusive por meio de conversas telefônicas que chamaram atenção da viúva, e financeira, por meio de transferência de valores mensais em conta corrente, ainda que por intermédio de familiares, sem olvidar das fotografias que revelam a participação do falecido em diversos momentos da vida em comum também com a parte autora”, afirmou.
De acordo com os autos, a amante teve dois filhos com o médico servidor público, fruto do relacionamento de 30 anos. As crianças nasceram em 1988 e 1991. Os documentos trazidos ao processo também dão conta de notas fiscais de compra de materiais de construção emitidas no período de 1999 a 2004, em nome do servidor, nas quais há o endereço da amante.
Segundo Canuto, a análise do contexto fático-probatório permite concluir que a viúva, apesar de em algumas passagens de seu depoimento não admitir expressamente, tinha de fato conhecimento de que seu marido, quando em vida, mantinha relacionamento simultâneo ao casamento.
“As declarações da demandada, seja ao afirmar que percebia as comunicações por meio de celular entre seu marido e a autora, seja ao confirmar que sabia da construção de uma ou duas casas para a demandante e sua família, revelam o conhecimento e aceitação da relação concomitante”, esclareceu. Com informações da Assessoria de Imprensa do TRF-5.
Revista Consultor Jurídico, 21 de maio de 2018, 13h34
https://www.conjur.com.br/2018-mai-21/trf-determina-divisao-pensao-morte-entre-mulher-amante
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